Casas de penhores proibidas de vender bens através de cartas fechadas

Novas regras defendem melhor os clientes das casas de penhores, diz o diploma publicado esta terça-feira.

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O novo regime clarifica as regras aplicáveis aos leilões de penhores Miguel Madeira

A partir de Outubro as casas de penhores vão deixar de poder vender bens dados em penhor através de propostas em carta fechada. Esta é uma das alterações ao regime jurídico da actividade prestamista com que o Governo quer garantir “maior equidade e justiça na relação entre o mutuante e o mutuário”. As novas regras “melhor defendem” quem decide entregar bens a troco de um empréstimo rápido, mas também trazem maior transparência à actividade, refere o diploma.

Assim, com a nova lei, em caso de mora por período superior a três meses, o bem dado em penhor pode ser vendido, mas acaba-se com a “modalidade pouco transparente” das propostas de compra em carta fechada. O modelo passa a ser o do leilão aberto ao público, na presença da ASAE, no qual podem “licitar todos os interessados, incluindo o prestamista”.

No entanto, poderá ainda ocorrer “a venda directa a entidades que, por determinação legal, tenham direito a adquirir determinados bens”.

Em caso de leilão, estes terão sempre de ser comunicados com um mínimo de dez dias de antecedência aos proprietários do bem (mutuários), além de publicitados num anúncio de jornal. Já a ASAE terá ser informada com um mínimo de 20 dias de antecedência e deverá manter no seu site uma lista actualizada de todos os leilões.

O exame público dos artigos a leiloar terá de ser garantido pelo menos durante as duas horas anteriores à venda. Sobre o preço da adjudicação, acrescerá uma taxa de 11% a favor do prestamista (uma comissão de venda).

O proprietário do bem poderá sempre resgatá-lo na fase de venda (os cinco dias que antecedem o leilão), mas para isso terá de pagar o capital e os juros em atraso, assim como a taxa de adjudicação.

Na avaliação das coisas dadas em penhor (avaliação pela qual o prestamista poderá cobrar, em caso de celebração de contrato, uma taxa não superior a 1% do montante que venha a ser mutuado) “devem ser tidas em consideração a antiguidade, o valor artístico, a raridade, o estado de conservação, bem como o tipo de peça, atendendo ao seu valor de revenda”.

No caso de artigos de metal precioso, têm de ser seguidos critérios como as cotações diárias, peso e toque das peças. Adicionalmente, a pesagem dos artigos terá de ser feita na presença dos clientes e a sua avaliação terá obrigatoriamente de passar por um dos cerca de 120 avaliadores oficiais, formados e registados na Imprensa Nacional-Casa da Moeda (que foi uma das instituições ouvidas na elaboração da lei).

Quanto à taxa de juro remuneratória, diz o diploma que esta não poderá exceder, em cada ano civil, 85% do valor máximo da taxa anual de encargos efectiva global (TAEG) aplicada aos cartões de crédito e publicada pelo Banco de Portugal.

Segundo a nova lei, nos estabelecimentos prestamistas há informações que terão de estar sempre afixadas, como a cópia de autorização para a actividade, a indicação das taxas relativas à avaliação dos bens e ao juro remuneratório dos empréstimos, a prova de validade do seguro obrigatório, a cotação diária do ouro e de outros metais preciosos e o quadro das marcas legais das contrastarias portuguesas.

E no contrato de mútuo garantido por penhor, também são muitas as informações que lá terão de constar, além da identificação dos intervenientes. Do valor da avaliação à taxa de avaliação, do montante mutuado à taxa de juro de remuneração do empréstimo, das datas de início e termo às compensações em caso de extravio ou roubo… O documento terá ainda de referir outras informações como as condições de resgate dos bens dados em penhor e as regras para atribuição do remanescente da venda dos artigos.

Alterações positivas mas tardias
O reforço das obrigações de informação nos contratos e nas lojas, o fim das cartas fechadas e as regras mais apertadas na avaliação, são os elementos da nova legislação destacados por Natália Nunes, coordenadora do gabinete de apoio ao sobreendividados da Deco, que no entanto lamenta o atraso do novo regime jurídico.

“São alterações que trazem maior segurança e transparência, mas aquilo que constatamos é que foi em 2011, 2012 que as pessoas mais recorreram a estes estabelecimentos”, disse ao PÚBLICO.

Recordou ainda que a Deco fez análises sobre estes temas na revista Dinheiro e Direitos entre 2011 e 2014 e que, nessas ocasiões, muitas foram as falhas detectadas na lei, que foram comunicadas à tutela. Num desses trabalhos, em que desaconselhava o recurso às lojas de penhores, a Deco destacava ainda o problema das vendas por carta fechada, dos leilões também à porta fechada e dos casos em que os artigos eram vendidos em lotes, o que elevava o preço e tornava mais difícil ao proprietário resgatar os seus bens.

A nova lei exclui a venda por carta fechada e sublinha o carácter público dos leilões, mas nada diz quanto à venda por lotes.

Os prestamistas vão passar a poder pedir licença de actividade e licença para novas aberturas através da Internet no chamado "Balcão do Empreendedor" e terão que contar, durante o primeiro ano de actividade, com um valor mínimo de seguro obrigatório de 100 mil euros por anuidade. Nos anos seguintes, o valor do seguro "será o que resultar da média das avaliações efectuadas no ano civil anterior, quando essa média for superior a 100 mil euros".

No universo das “coisas móveis livremente transaccionáveis” que podem ser dadas em penhor quase cabe tudo, mas a lei exclui explicitamente artigos militares ou de fardamento das forças armadas ou de segurança, armas e munições, matérias inflamáveis, explosivas ou tóxicas, objectos especialmente destinados ao exercício do culto público e coisas móveis sujeitas a registo, como os automóveis e as motas.

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