Que “lóbis” impedem a transparência do lóbi em Portugal?

A prática de lobbying, marcada pela ética e transparência, obriga à credenciação junto das instâncias legisladoras.

Oficialmente, em Portugal, o lóbi não existe. E embora seja uma actividade respeitada e por isso legalizada nas sociedades mais democráticas, ainda é vista por cá com muita desconfiança e, efectivamente, praticada com total falta de transparência. Haverá algum “lóbi” para que se mantenha esta situação de obscurantismo?

O exercício é simples: comecemos por identificar países ou conjunto de países em que a democracia seja um pilar do desenvolvimento. Se escolheu EUA ou União Europeia, continuemos o raciocínio. Agora recorde que qualquer um deles tem regulamentada a prática do lobbying (disciplina também designada por Assuntos Públicos), através da qual empresas, instituições, sectores de actividade, regiões e até países exercem saudável pressão sobre os poderes públicos na defesa dos seus interesses e pontos de vista, melhorando a qualidade da informação disponível, permitindo novas perspectivas e fornecendo aos legisladores melhores condições para a tomada de decisão.

Em sociedades desenvolvidas, o lóbi é visto como uma parte legítima do sistema democrático, não sendo por isso de estranhar que Bruxelas seja o maior polo europeu de lóbi e Washington o maior do mundo. A prática de lobbying, marcada pela ética e transparência, obriga à credenciação junto das instâncias legisladoras, o que torna todo o processo muito mais claro, sabendo-se a cada instante que grupo de pressão está registado, em defesa de que matéria, visando que projecto.

Poder-se-á perguntar: em Portugal não é feito lóbi? Não há qualquer tipo de pressão sobre o legislador? Então, quando ouvimos falar dos lóbis da agricultura, dos lóbis ambientais, ou de tantos outros, falamos de quê? Obviamente que o lóbi existe, embora poucos o admitam. E é precisamente aqui que a transparência é colocada em causa. Não havendo regulamentação, não há registo, não há controlo, não há transparência. Há menos democracia.

Nos últimos meses, as “démarches” do Governo em torno desta temática intensificaram-se. O secretário de Estado-adjunto do ministro-adjunto, Pedro Lomba, ouviu várias partes interessadas, incluindo as agências de comunicação, com o objectivo de criar as bases de um quadro legal semelhante ao que existe noutros países europeus, do que resultou uma proposta de diploma. Por ser iniciativa do Governo, apenas pode cobrir o Governo e o chamado Sector Empresarial do Estado. Mas seguramente que, na próxima legislatura, a Assembleia da República, única entidade com competência para tal, deverá “estender” a iniciativa aos deputados, maximizando a efectividade da mudança.

A verdade é que com vários modelos adoptados em várias democracias mundiais, inclusivamente em muitos países da Europa, começa a não haver razão para que o tema não seja debatido e legislado, depois das muitas tentativas feitas ao longo dos últimos anos de quem, legitimamente, fez desta actividade a sua profissão.

A não ser que seja uma qualquer actividade de “lobbying” que esteja a atrasar e impedir o processo. E a pergunta fica no ar: afinal que forças beneficiam com esta gritante falta de transparência?

Presidente da Associação Portuguesa das Empresas de Conselho em Comunicação e Relações Públicas

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