Labour pode desagregar-se se Corbyn for eleito, alertam trabalhistas

Várias figuras do partido britânico juntaram-se a Blair nas críticas a Corbyn, que as sondagens dão como preferido dos militantes, e temem que o seu posicionamento, “demasiado à esquerda”, resulte numa cisão.

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David Miliband, irmão do ex-líder, disse que "são precisas novas ideias, não [ideias] antigas” Toby Melville/REUTERS

O Partido Trabalhista britânico vive tempos conturbados. Depois dos resultados desastrosos das eleições de Maio, o Labour vive uma autêntica batalha ideológica, a cerca de um mês do início da votação para a escolha do novo líder. Isto porque o candidato da velha esquerda, Jeremy Corbyn, surgiu como favorito à liderança no partido. Esta situação fez disparar várias inquietações, como de David Miliband, um dos "pesos-pesados" do Labour e, até agora, pouco activo a comentar o rumo do partido.

“Se Corbyn vencer, suspeito que (…) poderá haver uma espécie de divisão [dentro do Labour]”, disse John Mills, um dos maiores financiadores do Partido Trabalhista, citado pelo jornal britânico The Guardian, admitindo que esse cenário resultaria na perda de vários apoios financeiros que o partido dispõe.

Mills foi mais um dos que, embalados pelas críticas de Tony Blair e pelos resultados de uma sondagem, que atribuiu 43% dos votos dos Trabalhistas em Corbyn, veio a público mostrar que a faceta socialista e de esquerda à moda antiga  do candidato à sucessão de Ed Miliband, poderá ser fatal para o futuro do Labour.

“Temo que a História nos ensine uma lição demasiado brutal sobre o que acontece quando o Labour resvala para a esquerda. Seria um desastre”, vaticinou Liz Kendall, a candidata identificada pela opinião pública britânica como mais próxima da abordagem New Labour, mais moderada, cuja grande figura é Blair. A candidata revelou mesmo, num debate com os outros três candidatos – Jeremy Corbyn, Yvette Cooper e Andy Burnham – transmitido pela rádio LBC, que recusaria integrar um gabinete-sombra liderado por Corbyn.

Mas uma das vozes do partido que se insurgiu contra a possível liderança de Jeremy Corbyn, de 66 anos, e que está a criar mais impacto, é a de David Miliband, irmão do último líder Trabalhista, Ed Miliband. Isto porque o ex-secretário de Estado dos assuntos externos de Gordon Brown tem vindo a adoptar uma posição discreta, desde que, em 2010, foi derrotado pelo irmão, na corrida à liderança do partido, e foram raras as vezes em que falou sobre o Labour ou sobre a política interna britânica.

“Os membros do Partido Trabalhista viram que, em duas eleições, o eleitorado deixou uma mensagem muito clara (…), são precisas novas ideias, não [ideias] antigas”, disse Miliband à Sky News. Considerado, por muitos, como um dos nomes mais capazes para liderar o partido, David Miliband apelou ao “bom senso” dos militantes. "Vêem o que os Tories [Partido Conservador] estão a fazer e sabem da necessidade que o Labour tem de ser uma alternativa credível", acrescentou.

Há quem vá mais longe no “ataque” a Corbyn. Johan Mann, deputado pelo Labour, partilhou um extenso comunicado, no qual acusa as “políticas da esquerda moderna, do início dos anos 1980”, de terem contribuído para encobrir o caso de “abusos de menores” em Islington, circunscrição pela qual Corbyn foi eleito deputado.

As eleições para a liderança do Partido Trabalhista terão lugar entre 14 de Agosto e 10 de Setembro, e os resultados serão conhecidos os resultados a 12 de Setembro. Os militantes do partido, os apoiantes registados e os sindicatos filiados devem colocar os candidatos por ordem de preferência. Será declarado vencedor o candidato que tiver 50% de todos os votos, num complexo processo de eliminação sucessiva, que só termina quando essa proporção for atingida por algum deles.

O mais rebelde 

A candidatura de Jeremy Corbyn à liderança do Partido Trabalhista por pouco não aconteceu. Faltavam poucos minutos para o fim do prazo determinado para o fecho das candidaturas e Corbyn ainda não tinha o apoio de 35 deputados, o mínimo para se poder apresentar à corrida. Acabou por conseguir o “sim” de 36 trabalhistas que, no entanto, anunciaram que apoiariam outro candidato na votação final. Tal situação deu-lhe imediatamente o rótulo de outsider.

Corbyn não é um novato na política britânica. Actualmente com 66 anos, foi eleito pela primeira vez para Westminter em 1983, pelo círculo eleitoral de Islington North. Tinha, na altura, 33 anos. Nas eleições de Maio de 2015, obteve 60% dos votos desta circunscrição.

É um representante da velha esquerda britânica e um dos maiores opositores das políticas de austeridade. O Guardian descreve-o como “o mais rebelde deputado” do Labour, quer por ter votado contra o partido em 500 ocasiões, desde 1997, quer por ter sido um dos críticos mais ferozes da intervenção do Reino Unido no Afeganistão e no Iraque, pela mão de Tony Blair.

As principais medidas que Corbyn gostaria de ver cumpridas são, segundo a BBC e a Sky News, a protecção dos serviços públicos, o aumento da taxação às empresas e aos mais ricos e o aumento do controlo público dos bancos. A sua conhecida “costela pacifista” levou-o também a defender que o Reino Unido deve abdicar do seu armamento nuclear.

A recente popularidade de Jeremy Corbyn, confirmada pela sondagem do YouGov para o The Times, deve-se ao apoio que está a receber por parte dos principais sindicatos britânicos, filiados no Partido Trabalhista e, sobretudo, por ser um opositor convicto da austeridade, algo que nenhum dos outros candidatos à liderança do Labour defendeu, de forma tão clara como ele.

Texto editado por Clara Barata

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