Noite de euforia em Teerão

Foto

Que festejam os iranianos? O fim das sanções. Houve euforia nas ruas de Teerão durante quase toda a noite de terça para quarta-feira. Muitos diziam querer “viver normalmente como no resto do mundo”. Os iranianos sabem que o país não sairá da crise económica sem se livrar das sanções, o que, por sua vez, implica a normalização das relações com o resto do mundo, designadamente com os países ocidentais. E, à frente de todos, os jovens e a classe média urbana, educada e culta.

Mais do que isso? Sim. Mas a prudência domina desde a repressão do movimento de 2009 contra a reeleição da Ahmadinejad, tida como fraudulenta. Resume Thierry Coville, especialista do Irão e do petróleo: “O cenário optimista consiste em esperar que o sucesso do Presidente Hassan Rohani em matéria de política externa e de economia façam inclinar a relação de forças a seu favor e lhe permita finalmente pesar de forma a melhorar a situação em termos de liberdades.”

O embargo ocidental não impediu a emergência de uma classe média próspera. Mas a crescente desigualdade entre as cidades e o interior, tal como o empobrecimento das massas rurais são uma ameaça à estabilidade do país. As sanções complicam este quadro: afectam a exportação do petróleo, levam os bancos a restringir o crédito aos importadores e, sobretudo, forçam o Estado a cortar o investimento e a despesa social. Com o acordo, abre-se a porta às exportações e afluirá o investimento estrangeiro. O Irão é um dos mais apetecidos mercados do mundo.

Foto
Noite de festa em Teerão de terça para quarta-feira ATTA KENARE /AFP

É um país de paradoxos. Um país onde os ayatollah e os Guardas de Revolução legitimaram o poder e a repressão em nome do nacionalismo, usando palavras de ordem como “Morte à América” ou ao “Grande Satã”. É ao mesmo tempo um país culto, com um sistema de ensino eficaz e uma notável elite de investigadores. É o país do Médio Oriente onde a Internet cresce mais rapidamente.

Os jovens vivem sob a propaganda paranóica de um regime teocrático e a vigilância da polícia religiosa. Parecem ter renunciado à revolta política. Mas manifestam-se de outras formas, desafiando crescentemente os interditos do regime — como as jovens que se fazem filmar ou fotografar de cabeça descoberta. “É como se o Estado não existisse”, anota um repórter. “O Irão mexe”, como sempre.

E depois da festa? Alguns colaboradores de Rohani temem uma vaga de repressão para mostrar que, após o acordo, o regime não mudará. Outros confiam no papel moderador do Presidente. Um ponto parece consensual: o Irão quer retomar a sua grandeza e o seu estatuto internacional, tornando-se uma economia moderna e uma potência do Médio Oriente. Jorge Almeida Fernandes

Sugerir correcção
Comentar