Tsipras defende que “não” no referendo dará à Grécia melhor posição negocial

Primeiro-ministro grego lembra a Irlanda para mostrar como a pressão pode funcionar. Mas mesmo dentro do Syriza há quem diga que a Grécia vai ficar “ligeiramente pior do que o Zimbabwe”.

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Tsipras diz que não ficará no cargo “faça chuva ou faça sol” Marko Djurica/Reuters

No dia em que foi apresentado o boletim de voto, os políticos gregos dividiam-se sobre o que quer dizer um “não”. Enquanto o primeiro-ministro, Alexis Tsipras, foi à televisão pública explicar que em sua opinião o “não” dará mais força à posição grega nas negociações (contra tudo o que dizem outras vozes de responsáveis europeus), o líder da oposição, Antonis Samaras, disse que uma vitória do “não” significaria a saída do país do euro.

“Quanto mais forte for a posição do ‘não’, mais forte vai ser a nossa posição nas negociações,” declarou Tsipras, dizendo que a Grécia não interrompeu as negociações, mas que estas foram de facto interrompidas quando os credores recusaram uma extensão do memorando. “Pensei que teríamos uma extensão, já que o Governo anterior também teve”, disse. E invocou um exemplo anterior: “quando a Irlanda disse ‘não’ ao Tratado de Lisboa no seu referendo, também não acabaram as negociações. No dia a seguir, sentaram-se de novo à mesa. E foram feitas cedências”, argumentou.

Já Samaras expressou uma posição diferente: uma vitória do não “seria uma catástrofe insustentável". "Se querem ficar no euro, ter os bancos abertos, apoiar a Europa, votem ‘sim”. Caso contrário, votem ‘não’”.

Os partidos políticos gregos estão divididos entre os que apoiam o “não”, incluindo a coligação no Governo – Syriza, de esquerda, e Gregos Independentes, populistas nacionalistas – e o partido neonazi Aurora Dourada. Entre os que defendem o "sim", estão a Nova Democracia, To Potami (O Rio), e o Pasok. O Partido Comunista já disse que apelará ao voto nulo.

Tsipras passou parte da entrevista a tentar dizer que foi vítima de chantagem e que lhe foi dado um prazo de 48h para aceitar um acordo – algo que o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, tem negado com veemência. “Fizemos uma tentativa honesta para chegar a acordo”, declarou Tsipras, acusando ainda as instituições de “passarem cinco meses a tentar que apresentássemos como nossa as propostas deles”. E quando finalmente o seu Governo cedeu, disse, sendo criticado pelos que pediam cedências, notou, “apenas nos pediram mais”.

“Não podíamos aceitar. Até [o economista americano Paul] Krugman disse que a proposta era ridícula”, declarou. O motivo que vê: “Não acredito que queiram que a Grécia saia da União Europeia, as consequências seriam enormes. Mas querem que não haja uma alternativa na Europa.”

Quanto à questão do que dizia a proposta inicial das instituições e que terá sido alterada – se o IVA sobre os hotéis era 13% ou 23%, Tsipras comentou que “esse detalhe foi mudado, e outros detalhes podiam ser alterados hoje, e outros amanhã, mas isso não interessa porque o povo vai ser chamado a pronunciar-se sobre o acordo.”

E se vencer o “sim”, contra o que o Governo está a fazer campanha? Tsipras responde que foi eleito e que não ficará no cargo “faça chuva ou faça sol”.

Depois de ser conhecido o boletim de voto com a pergunta - “Deve o acordo, proposto pela Comissão Europeia, o Banco Central Europeu, e o Fundo Monetário Internacional do Eurogrupo de 25 de Junho e composto por duas partes, ser aceite?”, seguindo-se os nomes dos documentos - o executivo foi criticado por na coluna da direita do boletim de voto o “não” aparecer antes do “sim”.

E na véspera do agora esperado incumprimento do pagamento ao FMI, surgiu a primeira dissidência dentro do partido de Tsipras - Kostas Chryssogonos, eurodeputado do partido, pediu para que as negociações continuem e alertando para o perigo de a ruptura com os credores poder conduzir a um “programa de austeridade pior”.

Chryssogonos tinha feito o aviso em Maio, mas diz que agora se sente mesmo obrigado a tornar pública a sua posição.

Enquanto Tsipras argumentou, na entrevista, que aceitar a proposta significava quebrar as promessas feitas ao eleitorado, Chryssogonos disse que este mandato previa negociações duras, não um incumprimento, especialmente com um organismo que representa “todos os países do mundo”, o que levará o país “a sofrer medidas que transformarão a Grécia em qualquer coisa ligeiramente pior do que o Zimbabwe”. 

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