Críticas à subida de impostos voltam a adiar solução na crise grega

A troika não gostou que as propostas gregas fossem quase todas baseadas em subidas de impostos, voltando a alargar o fosso entre a Grécia e os seus credores. Negociações pela noite fora tentam encontrar uma solução de última hora.

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As negociações com os credores terminaram sem resultados Yves Herman/Reuters

Foi o dia mais intenso de discussões entre as partes dos últimos quatro meses de negociações, mas ao fim de uma reunião de sete horas durante a tarde, com muito nervosismo pelo meio, a troika e o governo grego não conseguiram entregar em tempo útil aos ministros das Finanças da zona euro um acordo final assinado.

As discussões entre Alexis Tsipras e os responsáveis máximos das instituições da troika tiveram de prosseguir durante a noite (já para lá da hora do fecho desta edição), numa tentativa de se poder concretizar um entendimento esta quinta-feira, dia em que acontecerá mais um Eurogrupo e se inicia um conselho europeu.

O dia começou logo com um balde de água fria para quem pensava que, após a entrega da última proposta grega na segunda-feira, um acordo estava finalmente próximo. Alexis Tsipras, antes de sair de Atenas para Bruxelas, anunciou que a troika não aprovava o plano grego, acusando os seus responsáveis de ou "não terem interesse num acordo" ou de "estarem a servir certos interesses" na Grécia. O primeiro-ministro grego defendeu ainda que a Grécia não estava a ser tratada da mesma forma que outros países da troika. "A repetida rejeição de medidas equivalentes nunca aconteceu antes. Nem na Irlanda nem em Portugal", escreveu na sua conta do Twitter. 

Tsipras ficou claramente irritado com o facto de a troika ter respondido a uma proposta que tantos custos políticos está a ter já em Atenas com a exigência de medidas ainda mais difíceis de vender pelo governo grego aos seus cidadãos. Em vez de fazer apenas pequenos acertos e de definir o que deveriam ser as medidas adoptadas antecipadamente, como era esperado pela Grécia, a troika revelou um desacordo muito significativo com a maioria das medidas propostas.

O principal problema dos credores com o plano grego é que o consideraram demasiado centrado em aumentos de impostos e de contribuições, especialmente sobre as empresas, algo que a troika considera ser mais negativo para o crescimento da economia do que, por exemplo, cortes na despesa. Para o FMI, isto é particularmente grave porque, de acordo com os seus cálculos, isto deteriora as expectativas de crescimento futuro da economia, alterando também negativamente as projecções de sustentabilidade da dívida pública (que dependem da evolução da dívida nominal e do PIB).

Na prática, o principal bloqueio nas negociações foi o seguinte: Alexis Tsipras não queria que o acordo se baseasse em cortes de despesa, até porque isso agravaria problemas políticos que já enfrenta no seu país, e os credores, especialmente o FMI, não queriam um acordo baseado em aumentos da carga fiscal sobre as empresas, porque isso os obriga a apontar para previsões de sustentabilidade da dívida que tornariam inevitável uma reestruturação imediata.

É isso que se vê na contraproposta da troika que foi divulgada por vários meios de comunicação social. Os credores rejeitam o imposto extraordinário de 12% que o Governo grego propõe aplicar aos lucros acima de 500 mil euros. Do mesmo modo, em relação à taxa normal de IRC, defendem que, em vez de um agravamento de 26% para 29%, se deve apenas fazer uma subida para 28%.

Depois, na Segurança Social, a troika recusa a intenção grega de obter receitas por via do aumento das contribuições, em vez de efectuar cortes nas pensões. O principal agravamento das contribuições sugerido por Atenas, de 800 milhões de euros em 2016, é feito nas empresas.

No IVA, a troika aceita as propostas gregas de agravamento fiscal, mas neste caso ainda vai mais longe. Em vez de uma receita adicional de 0,74% do PIB, quer 1%, pedindo que a restauração passe da taxa intermédia para a taxa máxima de 23%.

Feitas as contas, é pedido à Grécia que aceite mais cortes de despesa, não só na Segurança Social, mas por exemplo na Defesa, onde em vez dos 200 milhões sugeridos por Atenas se pede 400 milhões, algo que será muito mal aceite pelo partido que forma a coligação governamental com o Syriza.

Em Bruxelas, todas estas diferenças foram alvo de discussão entre o primeiro-ministro grego e os mais altos responsáveis das instituições que formam a troika: Jean-Claude Juncker, Christine Lagarde e Mario Draghi. Foi um esforço de sete horas, feito a pensar na entrega de uma solução aos ministros das Finanças da zona euro, que tinham uma reunião do Eurogrupo agendada para o fim da tarde.

O esforço não chegou, contudo. Tsipras e a troika não chegaram a um entendimento e a reunião do Eurogrupo, sem um acordo para discutir, acabou por ser suspensa ao fim de pouco mais de uma hora.

Em declarações no final do Eurogrupo, a ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, deu as suas explicações para o que aconteceu. Disse que a suspensão do Eurogrupo se deveu ao facto de ainda estarem a decorrer negociações entre a Grécia e as instituições da troika, não tendo chegado ao Eurogrupo informações suficientes para que os ministros das Finanças possam tomar uma decisão. Tal poderá acontecer, espera a ministra, na continuação da reunião já marcada para esta quinta-feira às 13h de Bruxelas (12h em Lisboa). "A avaliação tem de ser feita pelas instituições, elas é que terão de responder", disse, garantindo que antes de isso acontecer não serão retiradas conclusões pelos ministros das Finanças. A ministra não escondeu, ao fim de três reuniões do Eurogrupo no espaço de uma semana (com outro encontro já agendado para quinta-feira), alguma saturação com este processo. Pelo menos, disse, "tenho uma boa noite de sono pela frente".

O presidente do Eurogrupo, por seu lado, falou de uma noite difícil para que se possa chegar a um acordo. "Estamos determinados a continuar a trabalhar durante a noite se necessário", disse.

Os trabalhos nocturnos foram feitos, mais uma vez, ao mais alto nível. Alexis Tsipras e os líderes da Comissão, FMI e BCE, terão tentado chegar a um acordo que permita que a Grécia leve já este fim-de-semana o programa à aprovação do seu parlamento e volte, assim, a ter acesso a financiamento externo, ficando com a possibilidade de fazer face aos seus compromissos mais imediatos (a 30 de Junho tem de pagar 1600 milhões ao FMI) face aos credores.

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