Meninas formidáveis

A selecção nacional feminina conseguiu classificar-se no 10.º lugar europeu, garantindo assim a permanência na divisão principal

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Alexandra Couto

As meninas do râguebi sevens português são formidáveis!

 

As jogadoras da selecção nacional têm tido prestações competitivas francamente boas. Muito boas até para quem tem as fracas bases de partida que têm as atletas portuguesas que, em todas as modalidades, representam apenas um terço dos federados masculinos.

 

Se o sistema desportivo português deixa muito a desejar, imagine-se a distância a que a parte do desporto feminino se encontra das suas adversárias europeias: em formas de competição, em possibilidades de treino, em disponibilidades de tempo, em preparação. Em adesão!

 

É claro que existem algumas atletas portuguesas de enorme qualidade internacional mas, como lembrou recentemente o Comité Olímpico de Portugal, não passarão de "exemplares únicos" que não definem a qualidade da generalidade das actividades desportivas.

 

No mundo feminino, o desporto português das modalidades colectivas - esse conjunto que demonstra a qualidade de um sistema - é fraco. As nossas modalidades colectivas estão mal colocadas nos rankings. As meninas do râguebi sevens português conseguiram classificar-se, após duas etapas, no 10.º lugar europeu, deixando atrás de si a Escócia e a Alemanha e garantindo assim a permanência na divisão principal. Um feito!

 

Não é fácil jogar contra equipas como a França - actual campeã europeia e já qualificada para o Rio 2016 - com a Rússia, a Espanha, a Holanda, a Irlanda, a Ucrânia, a Itália, a Geórgia, a Alemanha, o País de Gales ou a Inglaterra que, com a entrada da variante para os Jogos Olímpicos, desenvolvem programas de preparação - algumas das equipas já são profissionais - de elevado nível. Ter que defrontar, nas duas etapas e directamente, a França, a Rússia, a Itália, País de Gales, Escócia, em três vezes, ou a Alemanha, por duas vezes, para garantir as três vitórias que permitiram a manutenção não foi tarefa fácil. Mas que as portuguesas ultrapassaram com enorme sentido colectivo, coragem e determinação. Atitude tão notada que motivou elogios dos comentadores franceses da transmissão televisiva. E desta vez a conquista da Taça Bowl, porque correspondeu a um objectivo, deve ser comemorada como um troféu.

 

Obrigadas a níveis de intensidade e exigência técnica para que não têm hábitos - a competição interna onde competem nada tem a ver com o nível internacional - as jogadoras portuguesas conseguiram adaptar-se tanto quanto os treinos, feitos na sua maioria no CAR do Jamor e sob o comando do treinador João Mirra, permitiram aproximar níveis.

 

É claro que houve dificuldades que as impediram de atingir resultados que pareciam - pareceram em momentos de alguns jogos - que iriam permitir ultrapassar as adversárias. Mas a pressão imposta ou a velocidade de execução ou decisão exigidas levaram a "erros não provocados" que fizeram perder a bola, falhar um passe ou atrasar o apoio ou a entrada num intervalo. E depois uma natural dificuldade na velocidade de corrida - para que perceba a diferença basta comparar o recorde português dos 100 metros femininos com o dos outros países concorrentes - criava maiores dificuldades: muitas vezes a diferença da velocidade de corrida e de velocidade da bola nos passes longos permitia que as adversárias se desdobrassem e, deslizando, conseguissem cobrir os espaços e tirar eficácia ao esforço feito pelas portuguesas. Um esforço que foi diversas vezes recompensado por recuperações de bola mas, infelizmente também, pela vontade colocada, provocador de penalidades prejudiciais. Mas o cômputo geral é muito positivo.

 

Não sei se existe verdadeira noção do feito das meninas do râguebi de sevens português. Recém-chegadas a uma modalidade considerada até há pouco tempo como jogo de homens, sem experiência internacional suficiente - muitas das suas adversárias jogaram etapas do World Series feminino - as jogadoras portuguesas foram capazes de se superar, de ir buscar forças a uma enorme vontade competitiva e de se juntar em torno de um constante espírito de equipa e do orgulho de vestir a camisola portuguesa.

Verdadeiramente impressionantes, as jogadores portuguesas mostraram, numa elevada e constante atitude e humildade competitivas, conhecimento táctico do jogo, capacidade de adaptação em movimento, assertividade defensiva e apoio tão constante quanto a sua desmultiplicação de tarefas o permitiu. Umas lutadoras! Tão mais de elogiar quanto partiram, como já anotado, de bases muito diferentes das suas adversárias: menor cultura desportiva generalizada, menores hábitos de Alto Rendimento, maiores dificuldades de disponibilidade entre trabalhos e estudos nem sempre - ou quase nunca - facilitadores.

 

Estes exemplos simbolizam bem o que foi a prestação das portuguesas: a notável e belíssima placagem de Catarina Ribeiro contra uma holandesa a impedir a marcação de ensaio adversário e a demonstrar a tenacidade e atitude portuguesa de antes quebrar que torcer; a excelente demonstração técnica de entendimento táctico do jogo da Christina Ramos que, depois de uma quebra da defesa adversária com corrida de uma vintena de metros, foi placada, já próximo da área de ensaio, por uma adversária que recuperou em velocidade superior mas que com enorme presença de espírito e tirando partido da sua posição adiantada no terreno, soube largar a bola e esperar que a placadora, de acordo com as leis do jogo, a largasse para então se levantar, pegar na bola e marcar ensaio; ou ainda a capacidade da Catarina Antunes, placada quase em cima da linha de ensaio, de rodar no chão para entregar a bola a uma companheira e garantir assim o ensaio. Situações, bem acompanhadas por eficazes combinações e ataques a intervalos, de levantar bancadas de adeptos - e havia algumas bandeiras portuguesas.

 

Dentro de dias as portuguesas jogarão em Lisboa o Torneio de Repescagem Europeia que apurará três equipas para disputarem o Torneio Mundial de Repescagem que apurará a última equipa para os Jogos do Rio. Afastadas que estarão as equipas britânicas - já apuradas com a Grã-Bretanha - e ainda, por apuramento, a França e a Rússia, Portugal entra nesse torneio na sexta posição. O que obrigará, para que seja possível o apuramento, a conseguir um lugar nas oito primeiras equipas da fase de grupos para poder disputar as meias-finais da Cup e da Plate - significando que o primeiro jogo do segundo dia será decisivo - obrigando ainda, no mínimo, a vencer a "pequena final" - 3º e 4º lugares. Muito difícil, mas não impossível com o aproveitamento deste intervalo de tempo para tratar de acertar os pormenores técnicos necessários.

 

Pelo que já fizeram, pelas capacidades que já demonstraram, as meninas do râguebi de sevens português merecem um enorme apoio no fim-de-semana de 18 e 19 de Julho no Jamor. Para o que e naturalmente contarão com a comunidade portuguesa de râguebi.

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