Actriz e cantora Magali Noël morre aos 83 anos

Intérprete de filmes de Fellini e de canções de Boris Vian foi um dos grandes símbolos sexuais franceses dos anos 60.

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A actriz fotografada em 1985, em Paris AFP

A actriz e cantora Magali Noël, que nos anos 50 escandalizou a França a cantar “Fais-moi mal, Johnny, Johnny, Johnny,/ Moi j'aime l'amour qui fait boum!”, refrão de uma arrojada canção escrita por Boris Vian, e que nos anos 60 e 70 foi uma das actrizes predilectas de Fellini, morreu esta terça-feira em Châteauneuf-Grasse, na Riviera francesa, a poucos dias de completar 84 anos.

A actriz, que participou em quase uma centena de filmes e telefilmes, morreu durante o sono na casa de repouso onde vivia, disse a sua filha Stéphanie Vial-Noël, também ela actriz e encenadora. Magali Noël estreou-se no cinema em 1951, deu nas vistas em 1955 no filme Rififi, de Jules Dassin, e trabalhou depois com René Clair e Jean Renoir, entre muitos outros, antes de Fellini a transformar num dos grandes sex symbol da época em filmes como A Doce Vida (1960), Satyricon de Fellini (1969) ou Amarcord (1973), no qual a actriz francesa interpreta a inesquecível Gradisca.

Nascida em 1931 em Esmirna, na Turquia, de pais franceses, Magali Noël – cujo nome civil era Magali Françoise Noëlle Camille Guiffray – regressou a França aos sete anos e começou cedo a ter aulas de dança e violino. Aos 17 anos já actuava em cabarets, enquanto frequentava o curso de arte dramática de Catherine Fontenay.

Ainda inicia uma carreira nos palcos, representando personagens de Molière ou Marivaux – é por esta altura que adopta o Noël como nome artístico –, mas aos 19 anos chega ao cinema, estreando-se em Demains Nous Divorçons (1951), de Louis Cuny, onde não tem de se esforçar muito para entrar na pele de uma jovem provocante e atrevida.

No mesmo ano faz de mulher de Bourvil em Seul dans Paris, mas o filme que lhe dará  a aura de vampe e mulher fatal que a irá depois acompanhar é Rififi (1955), de Louis Dassin. Noël interpreta a cantora de cabaret Viviane, e Dassin tencionava usar uma cantora para a dobrar na cena em que a personagem canta o tema do filme. Mas ouviu Magali Noël cantarolar no seu camarim e mudou de ideias.

Boris Vian assistiu a uma projecção do filme e convidou-a para cantar Johnny fais-moi mal, possivelmente o primeiro tema de música rock com letra em francês, uma letra aliás suficientemente ousada, com o seu enredo divertidamente sadomasoquista, para que tenha sido proibida, em 1956, a sua transmissão na rádio. É o início de uma longa colaboração com o escritor e músico Boris Vian, então director em Paris de uma filial da Philips.

Nos anos seguintes, Noël contracena com os grandes actores franceses do tempo, como Jean Gabin ou Jean Marais, faz novamente de cantora em As Grandes Manobras (1955), de René Clair, interpreta um papel menor em Helena e os Homens (1956), de Jean Renoir, volta a cantar no policial Assassins et Voleurs (1957), de Sacha Guitry, e em 1960 dá-se o seu encontro com Fellini, que a convence a interpretar a dançarina Fanny em A Doce Vida, primeiro momento de uma colaboração que se prolongará em Satyricon de Fellini (1969) e Amarcord (1973).

Em França, “havia na época quatro estrelas de cinema: [Annie] Girardot, [Brigitte] Bardot, [Jeanne] Moreau e a mamã”, diz a sua filha Stéphanie, acrescentando que a sua mãe era "um sex symbol" e que a "confundiam frequentemente com Sophia Loren".

Ao longo da sua carreira, a actriz voltou várias vezes aos palcos e trabalhou também para a televisão. Em 1962 casou-se com o actor Jean-Pierre Bernard, de quem teve uma filha, e voltou depois a casar-se, em 1975, com o suíço Jean-Claude Vital, dono de uma empresa discográfica. O casal teve três filhos e adoptou outros dois.

Se Magali Noël é hoje sobretudo recordada pelos filmes que fez com Fellini, nos anos 60 e 70 trabalhou também com realizadores como Costa-Gavras ou Chantal Akerman. E em 1982 interpreta uma exuberante mãe de Francis Huster em Que Faz Correr David?, de Élie Chouraki, filme em que contracena também com Charles Aznavour e Nicole Garcia.

Era já septuagenária quando encerrou a sua extensa carreira cinematográfica de mais de meio século com um papel em A Verdade sobre Charlie (2002), de Jonathan Demme.

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