A Dinamarca virou à direita com subida de partido anti-imigração

Helle Thorning-Schmidt deixa de ser primeira-ministra. Provável chefe do Governo é o liberal Lars Lokke Rasmussen. Partido anti-imigração é agora a maior força do bloco de direita.

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Rasmussen vai tentar formar Governo Claus Bech/REUTERS

A Dinamarca virou à direita nas eleições legislativas de quinta-feira. O provável futuro primeiro-ministro, Lars Lokke Rasmussen, viu o seu partido ser ultrapassado pelo Partido Popular Dinamarquês, força populista hostil à imigração, que conseguiu o apoio de um quinto dos votantes e se tornou no segundo do país.

Os social-democratas da primeira-ministra cessante, Helle Thorning-Schmidt, foram os mais votados, com 26,3%. Mas isso não fez dela uma vencedora, devido às características do sistema político dinamarquês: a soma de deputados do “seu” bloco de centro-esquerda, o Bloco Vermelho, foi inferior à do bloco de direita de Rasmussen: 89 mandatos contra 90.

Thorning-Schmidt, que há quatro anos se tornou a primeira mulher a chefiar um Governo na Dinamarca, apresentou a demissão à rainha Margarida II e anunciou também a demissão da liderança partidária.

Embora tenha tido resultados decepcionantes, Rasmussen, líder do liberal Venstre, tradicional força preponderante do bloco de direita, o chamado Bloco Azul, assumiu a intenção de formar Governo e voltar ao cargo que ocupou entre 2009 e 2011. O seu partido ficou-se pelos 19,5%, atrás não só dos social-democratas como do Partido Popular Dinamarquês (DF), que teve um resultado histórico de 21,1%.

O DF liderado desde 2012 por Kristian Thulesen Dahl, que sucedeu a Pia Kjaersgaaed, mantém as posições anti-imigração mas deu maior expressão no seu discurso à defesa dos desfavorecidos, o que explicará o salto dos 12,3% de há quatro anos para o resultado das eleições antecipadas de quinta-feira, em que superou as sondagens que lhe eram mais favoráveis e se tornou no partido mais votado do Bloco Azul.

Rasmussen, que há quatro anos perdeu a chefia do Governo para Helle Thorning-Schmidt, não tem pela frente uma tarefa fácil depois de o seu partido ter perdido um quarto dos assentos parlamentares. “O Venstre perdeu apoios. Não tivemos um bom resultado”, reconheceu. “Os próximos dias vão permitir dizer se é possível encontrar uma maioria para um programa [de Governo] que ponha a Dinamarca na direcção certa”, disse, citado pela AFP.

O jornal de esquerda Information considera que os resultados de quinta-feira são “o pior ponto de partida imaginável” para Rasmussen, que parte para a tentativa de formar Governo numa posição de fraqueza.

Já quando liderou o executivo, o líder liberal precisou do apoio parlamentar do DF. Mas desta vez o cenário é mais complexo. O partido de extrema-direita ainda não decidiu como actuará. Kristian Dahl fez saber que não reclama a possibilidade de formar Governo mas disse à agência Ritzau que “não tem medo” de o integrar.

O partido reclama para si o papel de defensor da “herança cultural dinamarquesa” e apoiou governos conservadores na década passada, a troco de políticas restritivas em matéria de imigração. Mas tem-se mantido à margem da governação, procurando antes influenciá-la.

Um sinal dessa influência foi o anúncio pelo bloco de direita, durante a campanha, de medidas para tornar menos atractiva a Dinamarca para os requerentes de asilo - redução de subsídios para novos refugiados e autorização de residência apenas para quem tem emprego e fala dinamarquês.

Marie Serup, jornalista política, escreveu no seu jornal, o BT, que “os eleitores de extrema-direita disseram ao Partido Popular Dinamarquês que deve assumir responsabilidades”. Na sua opinião, reproduzida pela AFP, o DF “não pode continuar a esquivar-se” porque “isso significaria trair os seus eleitores”.

Mas o partido populista tem sérias discordâncias com outras forças do bloco de direita em matérias como questões europeias e protecção social. Para além dos partidos de Rasmussen e de Dahl, o bloco inclui a Aliança Liberal, o Partido Conservador do Povo e os democratas-cristãos.

Soren Espersen, vice-presidente do DF, identificou à Reuters as “linhas vermelhas” do partido — em matéria europeia são a defesa da realização de um referendo sobre a permanência na união, embora só depois do britânico; e uma reforma do “clube” a que quer continuar a pertencer.

As outras são de natureza puramente migratória: a reintrodução de controlos fronteiriços abolidos pelo acordo de Schengen; e a adopção de políticas de imigração mais restritivas, ainda que, neste campo, o partido se declare favorável a um aumento da despesa pública nesta área para valores superiores aos defendidos pelos social-democratas.

Fique ou não no Governo, partido anti-imigração está em posição de força para influenciar as políticas – elegeu 37 deputados, mais três do que o Venstre e mais 15 do que há quatro anos. O social-democratas elegeram 47. Rasmussen pode ter de fazer mais concessões do que aquilo que estaria à espera para liderar o Governo.

Numa coisa a Dinamarca pouco mudou: a participação eleitoral. Nas legislativas de 2011 votaram 87,7% dos eleitores, nas de quinta-feira 85,8%.

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