Café Racer: vai uma corridinha?

Café Racer é um género de mota que, para além de ter marcado uma geração, definiu novos valores e comportamentos sociais. De encontros em cafés e corridas ilegais ao som de rock n´roll, o JPN foi saber por que motivo este estilo de mota voltou a ser…”estiloso”

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Ramsey Nasser/Flickr

Os anos 60 foram marcados por várias mudanças de valores, comportamentos e estilos de vida. Foi neste contexto que jovens rebeldes e irreverentes surgiram com as suas motas personalizadas. Café Racer, de seu nome, começou por ser apenas um estilo de mota e acabou por se tornar um estilo de vida que… volta a estar na moda.

Hoje, há quem recrie e transforme uma simples mota num estilo Café Racer e, para compreender um pouco melhor do “porquê” do retorno desta moda, o JPN foi ao encontro de alguns peritos na matéria. Não tinham barba comprida, "jukebox" ou bandanas na cabeça, mas o estilo estava lá; o rock n’ roll estava lá e a paixão também.

As modas nascem, crescem, desenvolvem-se, acabam e, muitas vezes, voltam a nascer. O estilo Café Racer não foi excepção e, depois de ter conquistado jovens nos anos 60, volta para conquistar novas gerações. E, como todas as modas, há sempre alguém com a iniciativa de as fazer reemergir. Alguns por gosto pessoal, outros por brincadeira. O JPN foi ao encontro dos Ton-up Garage, dos Triumph, dos Dream Wheels Heritage, dos it roCkS bikes e dos Willow Motorcycles tentar saber o porquê de trabalharem com um estilo tão particular como as motas Café Racer.

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A oficina dos Ton-up garage DR

Daniel Cabral e Pedro Oliveira abriram as portas da garagem Ton-up em 2010, mas o gosto pela transformação de motas vinha já de crianças. “A empatia era natural”, diz Pedro, que acrescenta que, quando começavam a trabalhar nas motas, sabiam que queriam ir "naquela direção”.

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Esboço da primeira mota transformada pela Willow Motorcycles DR

Antes de inaugurem a garagem, Daniel e Pedro tinham um projecto semelhante e o sonho de fazerem crescer o negócio. “Desde miúdo que via o meu pai a trabalhar com motas e desde pequeno que as comecei a alterar, a tirar peça”, lembra Pedro. Além disso, Pedro esclarece que a determinada altura da sua vida não se lembrou, simplesmente, “ah, afinal eu gosto é disto”, uma vez que a sua “relação com os motores é muito simples”. Também Daniel lembra o gosto particular por este género de clássico. “Para mim foi desde sempre e, a determinada altura, foi procurar fazer o trabalho de que gosto ou sempre gostei”, diz.

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Esta é uma das motas estilo Café Racer transformadas por Ricardo Lima DR

Também foi por gosto pessoal que João Soares e Helder Moura deram início à Dream Wheels Heritage. Apesar de trabalharem com outros estilos clássicos, Helder frisa a dedicação da equipa a “99,9% ao estilo Café Racer”. Helder, que acredita que o estilo e o conceito de Café Racer é uma maneira de estar na vida e agir em comunidade”, diz que todos os membros da Dream Wheels sempre gostaram “de algo que se assemelhasse ao antigo e que fosse feito à mão”, daí apostarem em trabalhos, sobretudo, manuais. “Trocamos materiais de outras motas, de bicicletas e criamos novos projetos a partir disso”, como uma forma de “fugir ao normal” e ”fazer as coisas com o coração”.

Se, para muitos, o gosto por motas e pela sua transformação nasceu no seio familiar, para João Salgueiro foi mais do que isso. O estudante do último ano de Mestrado em Arquitetura criou, juntamente com o seu pai, José Salgueiro, a Willow Motorcycles, para “pôr em prática a capacidade criativa [de ambos]”, refere João. “O facto de estar no último ano de Mestrado em Arquitetura e de o meu pai ser designer de jóias, foi também um mote para testarmos a nossa capacidade de criação noutra área de que ambos gostamos”, reforça o estudante.

João Salgueiro diz que, “apesar de não ter vivido [a ‘era’ do Café Racer], esta é uma grande inspiração” para a criação dos seus projectos “e não só”, pelo que, juntamente com o pai, acaba “por absorver um pouco de toda a cultura, não só o aspecto e o conceito presente nas motas dessa época, mas também a música, a roupa e outras características”, que transportam para os dias de hoje e que acabam por fazer parte das suas vidas. Quando se fala nas componentes das motas, João refere que o seu projeto cativa pelo facto de estarem a “criar uma peça única que se diferencia dos restantes modelos standard de motas, (…) quer pelo seu look retro, o seu esquema de cores incomuns e pelo barulho característico dos seus escapes”.

Já para Osvaldo Coutinho, da it roCkS bikes, a ideia “surgiu de uma brincadeira entre dois amigos”. Juntamente com Alexandre Santos, o sócio e amigo que lhe lançou o desafio, Osvaldo aceitou a proposta, “apenas e só, porque achava que, esteticamente, o panorama (…) das Café Racer estava algo monótono”. “Não foi um idealismo que tenha mudado a nossa vida ou a nossa forma de estar, simplesmente gostamos e respeitamos o estilo”, conclui.

Irreverência do passado, tecnologia do presente

Ricardo Lima, mecânico da Triumph, sempre teve o gosto pessoal pela transformação de motas e agradece o facto de, hoje em dia, o seu trabalho lhe permitir fazer o que gosta. Segundo Ricardo, as transformações começaram “porque o mercado pede mais isso” e, portanto, segue “um bocado as tendências”.

As motas estilo Café Racer têm uma aparência particular e, muitas vezes, “as pessoas procuram esse género de motas pelo estilo e pela estética”, refere Ricardo. No entanto, o mecânico lembra que “isso não põe em causa a mecânica e a potência da mota”. Ricardo fala ainda da conjugação do aspeto clássico das Café Racer com as potencialidades mecânicas que existem hoje. “É usar as características visuais e estéticas de uma Café Racer e conjugá-la com a tecnologia e as peças que hoje existem”, conclui, acreditando que “é uma moda que vem para ficar”.

Para Pedro Oliveira, dos Ton-up, “existe um conhecimento maior do público em Portugal”. Tal, segundo Daniel Cabral, se deve “às redes sociais e à quantidade de partilha de imagens”. “Simplesmente, as portas ficaram mais largas (…) e a cultura chega a mais gente, neste momento”, acrescenta.

No entanto, para além do aspecto visual, Pedro lembra que é uma questão de memória e de relação com o passado e com a época em que o conceito de Café Racer surgiu. “Qual foi a mota que o meu pai teve?”, questiona Pedro, exemplificando.

Já Osvaldo Coutinho simplifica as coisas com um simples “apenas por moda”. “É uma tendência, como moda, que se espera que dure várias estações” e, para muitos, “é uma questão de lifestyle, para outros é só gosto pelas motas, ou, [simplesmente], é só cool”.

João Salgueiro reforça esta opinião e salienta que “o revivalismo, no geral, está em voga, estendendo-se a várias áreas como a moda, design e, até, música”. “O Café Racer é apenas mais uma cultura que se junta a muitas outras que estão a emergir novamente, [e é uma forma] de as pessoas [recordarem] os tempos vividos e das que não viveram terem a oportunidade de experienciar outros tempos com que se identificam”.

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