Tribunal Europeu a favor da eutanásia para tetraplégico em estado vegetativo

A família de Lambert está dividida e os pais, católicos, garantem que vão continuar a combater a decisão.

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Vincent Lambert sofreu um acidente de viação em 2008 AFP
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Rachel Lambert diz que só quer "deixar partir" o marido PATRICK HERTZOG/AFP

A Justiça europeia validou esta sexta-feira uma decisão francesa que permite o fim da alimentação artificial e da hidratação do paraplégico em estado vegetativo Vincent Lambert. Depois de dois anos de polémica familiar, o caso parecia encerrado, mas pode não ser assim — os pais de Lambert anunciaram que vão usar “todos os meios” para evitar a sua morte.

Vincent Lambert sofreu um acidente de viação em 2008, tendo ficado tetraplégico e com lesões cerebrais graves; está hospitalizado em Reims. Em Junho do ano passado, e a pedido da mulher de Lambert, Rachel, de seis dos seus oito irmãos e de alguns sobrinhos, o Conselho de Estado da França, a última instância de recurso do país, considerou que é uma “obstinação irracional” manter a vida de Vincent. E que, por isso, os mecanismos de alimentação e de hidratação artificiais deveriam ser desligados - a chamada "eutanásia passiva", sendo a activa aquela em que é necessário administrar ao paciente um agente tóxico. Segundo a mulher de Vincent Lambert, o marido expressara o desejo de não viver artificialmente, se alguma vez ficasse na situação em que se encontra.

Mas os seus pais e dois dos irmãos, descritos pela imprensa francesa como profundamente católicos, apelaram ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Consideram que Lambert é um deficiente e que tem o direito de continuar a viver.

O advogado dos pais, Jérôme Triomphe, criticou a decisão do Tribunal de Estrasburgo, que não se pronunciou sobre eutanásia, concluiu sim (por votação, de 12 contra cinco) que, à luz dos relatórios médicos, desligá-lo do sistema artificial de vida não constitui uma violação do artigo 2 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos relativo ao direito à vida. O advogado disse que a decisão é o fruto de “uma sociedade bárbara” e anunciou: “Vamos continuar o nosso combate, vamos bater-nos para que um inocente não seja condenado à morte”.

“É escandaloso. Estão a condenar o meu filho. Vamos permanecer ao lado de Vincent e vamos continuar a lutar por ele”, disse a mãe, Viviane Lambert, depois de ouvir a decisão em Estrasburgo.

O advogado avançou que poderão ser pedidas novas avaliações médicas — os pais de Vincent Lambert sustentam que o filho fez progressos, por exemplo ao nível de um movimento, desde que teve o acidente.

Os especialistas franceses que, na imprensa, tentam prever os próximos passos que podem ser dados para contornar a decisão do Tribunal Europeu avançam que os pais de Vincent podem argumentar que o médico que concluiu que não há recuperação possível para este paciente, Eric Kariger, já não está no hospital de Reims e, por isso, não sabe que tipo de progressos foram feitos.

Contactado pela France Info, o médico disse que a decisão de Estrasburgo foi um “enorme passo para a nossa humanidade”. Isto porque a decisão abre um precedente legal para todos os 47 membros do Conselho da Europa. “Assim que os estados quiserem modificar as suas legislações sobre o tema, terão que ter em conta os princípios definidos por esta decisão”, disse o especialista em direitos humanos na Europa Nicolas Hervieu.

O caso Lambert — e o tema da eutanásia — dividiu a sociedade francesa e o Presidente socialista François Hollande prometera um debate intenso sobre o assunto para o início do ano, com a aprovação de uma nova e mais clara lei sobre suicídio assistido. Em Março, o Parlamento aprovou por larga maioria uma lei que autoriza os médicos a praticarem a “eutanásia passiva”, que implica que o doente que assim o deseje seja colocado num sono profundo antes de morrer. A lei também determina que os médicos têm que respeitar o testamento vital feito pelos pacientes. O caso de Vincent Lambert complicou-se porque este testamento não foi deixado por escrito e porque os tribunais aceitaram os processos de duas partes da família.

Após a decisão do Tribunal Europeu ser conhecida, Rachel Lambert disse que esta não é uma vitória para celebrar e que tudo o que quer é “deixar partir” o marido “com dignidade”. “Os meus pensamentos estão com o meu marido. Não há alívio ou satisfação. Tudo o que queremos é que seja respeitada a vontade dele”, comentou.


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