Maior parte das vítimas de assédio moral no trabalho tem vínculo precário

Mais de metade das vítimas de assédio moral têm contrato a prazo. A maior parte tem medo de denunciar porque teme represálias.

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As mulheres continuam a ser as principais vítimas deste tipo de crime, representando 83% de todas as situações Foto: Paulo Pimenta

Face ao aumento das taxas de desemprego e das relações laborais precárias em Portugal, os casos de assédio moral devem estar a aumentar, acredita a socióloga Anália Torres, que quarta-feira apresentou os resultados de uma pesquisa sobre esta matéria em Lisboa, um estudo que espera venha ajudar a que haja uma maior consciencialização deste fenómeno num país onde tem sido muito pouco falado, devido a uma "tradição mais autoritária, agravada agora com as condições da crise".

Passados 25 anos sobre o primeiro estudo sobre assédio sexual a mulheres no mercado de trabalho em Portugal, a pesquisa Assédio Sexual e Moral no Local de Trabalho em Portugal permitiu perceber que a maior parte das pessoas que são vítimas deste fenómeno tem um vínculo laboral precário - contratos a termo, recibos verdes, estágios.

Permitiu ainda concluir que serão muitas - cerca  de 16,5% dos inquiridos disseram já ter sofrido assédio moral no local de trabalho, enquanto mais de 12% afirmaram ter sido vítima de assédio sexual, pelo menos uma vez na vida. As mulheres são as principais vítimas tanto de assédio moral (16,7%) como de assédio sexual (14,4%) no local de trabalho, mas também há homens a queixar-se, revelam os resultados deste estudo desenvolvido pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas em colaboração com a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego e que inquiriu 1801 pessoas, numa amostra representativa da população activa.

Para Anália Torres, que coordenou o estudo, as vítimas têm muitas vezes medo de denunciar o que se passa porque temem sofrer represálias ou ser ainda mais humilhadas. "São práticas inaceitáveis e as pessoas devem fazer queixa e tentar defender-se", enfatiza, defendendo mesmo que deve criar-se no país um clima de intolerância perante estes casos. Aliás, a reacção de grande parte dos inquiridos (42,7% dos homens e 40,9% das mulheres) foi ficar à espera que a situação não se repetisse, havendo quem admitisse que não fez absolutamente nada.

"Com o aumento do desemprego as pessoas acabam por sentir que têm de se sujeitar a situações que são altamente atentatórias da sua dignidade. E o que o estudo mostra é que isto não é uma coisa de somenos importância", sublinha. As situações mais marcantes (as mais frequentemente mencionadas) são as de ser "alvo de situações de stress com o objectivo de levar ao descontrolo”, a “desvalorização sistemática do trabalho” e sentir que lhe “definiram objectivos e prazos impossíveis de atingir".

No assédio moral, os sectores em que foi encontrada uma maior incidência de casos foram o comércio por grosso e a retalho, tal como o sector da hotelaria e restauração. A maior parte dos homens e das mulheres que dizem ter sido vítimas deste tipo de perseguição foram fundamentalmente assediados "pelos patrões, superiores hierárquicos e chefes directos".

No que diz respeito ao assédio sexual, os sectores laborais onde os casos mais ocorrem são também o comércio por grosso e retalho, alojamento e restauração. Entre estes casos, a esmagadora maioria (82,4%) dos autores dos abusos são homens. A reacção da maior parte das mulheres e dos homens foi a a de esperar que a situação não se repetisse. "A reacção das mulheres e dos homens é condicionada por medo de sofrerem consequências profissionais",  concluem os autores do estudo.

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