A mais-valia de um espaço de opinião

Por mais que explicite esta minha conduta de não me imiscuir nos conteúdos dos artigos de opinião, há leitores que insistem e discordam abertamente desta minha posição.

Um certo travo irónico marca o arquivo de queixas ou simples críticas que guardo neste meu correio de provedor. O maior número de mensagens incide fundamentalmente num campo em que não me meto: o espaço de opinião.

Não se trata de um temor ou de uma negação das responsabilidades inerentes ao circunstancial cargo. Trata-se, segundo a minha perspectiva, de uma atitude de respeito pela livre opinião. E também não deixa de ser irónico que o volume de queixas em reacção aos artigos de opinião publicados no PÚBLICO seja o maior espólio municiador de temas/assunto destas crónicas semanais. Isto não quer dizer que não tome em consideração essas discordâncias, por vezes, de forte contestação e, por isso, solicite à direcção do jornal que as faça chegar aos respectivos autores desses textos. Por mais que explicite esta minha conduta de não me imiscuir nos conteúdos dos artigos de opinião, há leitores que insistem e discordam abertamente desta minha posição.

Evidentemente, neste espaço livre e plural de opinião, há limites contornados que, em resumo, podem ser identificados por esta citação do Livro de Estilo do PÚBLICO: “Não há quaisquer restrições ao teor das opiniões expressas desde que elas se enquadrem nos preceitos de isenção ética e rigor de escrita que identificam o estilo do PÚBLICO. A independência de espírito, a irreverência e o desassombro polémico são necessários à vitalidade do jornal, mas não é admissível a utilização de uma linguagem panfletária ou insultuosa."

Com efeito, perante a infracção destes princípios, teria de ser a própria direcção a tomar medidas e, se não o fizesse, teria então o provedor de actuar, pois, neste caso, cabe-lhe, por estatuto, a obrigação de “transmitir a sua reflexão sobre eventuais desrespeitos pelas normas deontológicas" ou de repudiar os possíveis desvios ou desrespeitos pelo Estatuto Editorial do PÚBLICO.

Ora, esta semana, o leitor Miguel Won, com toda a correcção e direito que lhe assiste, interpelou-me a propósito de um artigo publicado no caderno P3, na edição de 22/05/2015. Não vou citar o artigo, pois isso seria desde já infringir um dos princípios da minha actuação: não me imiscuir em artigos de opinião. Mas porque considerei pertinentes as questões levantadas quanto ao meu estatuto, reflecti sobre elas e coloquei ao coordenador responsável do P3, o jornalista Amílcar Correia, o caso.

Diz o leitor Miguel Won: «Considero que o artigo viola em vários sentidos o Livro de Estilo (LE) do jornal PÚBLICO.» Particularmente, "o ponto 6 b) da secção 'Os factos e a opinião' afirma: '...Essa opinião deverá ser sempre devidamente fundamentada, não se inspirando em razões exteriores ao objecto do comentário...'" (…) “Também no ponto 6 b) da secção 'Os factos e a opinião', diz-se: 'Não há quaisquer restrições ao teor das opiniões expressas desde que elas se enquadrem nos preceitos de isenção ética e rigor de escrita que identificam o estilo do PÚBLICO (…).'"  Finalmente, o ponto 6 c) da mesma secção (estabelece): "Os textos de opinião estão também sujeitos ao respeito pela linguagem não insultuosa e não panfletária a que se obriga o PÚBLICO (…)." E conclui o leitor Miguel Won: «Por estes motivos, (...) na sua qualidade de provedor do Leitor, e tendo em conta o Estatuto do provedor do PÚBLICO, apelo à sua intervenção.»

Confrontei o coordenador do P3, o jornalista Amílcar Correia, sobre a posição do leitor quanto ao teor das queixas apresentadas e, sobretudo, na perspectiva da atitude que, como provedor, teria de assumir. Entre outras passagens de reflexão, Amílcar Correia, esclarece: «O P3 é um site colaborativo no qual os utilizadores publicam os seus textos, fotografias e vídeos. Foi o caso do texto em questão. Friso: é um texto de opinião… (…) O P3 é um site pluralista no qual se publicam opiniões, por vezes, contraditórias. É isso o espaço público.» (…) 

E também foi esta a minha conclusão. Não obstante o artigo em causa exprimir uma opinião bastante discordante da minha e daquela mais comummente expressa sobre o tema em análise, não me parece que este artigo de opinião obrigue o provedor a interferir, invocando os princípios a que o leitor faz referência. Obviamente que respeito a opinião do leitor Miguel Won e julgo que se, dentro das regras, enviar um texto de contestação, o mesmo será tido em conta pela direcção do PÚBLICO ou pelo coordenador do P3.

Estimular a polémica é exactamente uma das finalidades do espaço de opinião. Hoje, como diz o comunicólogo Rémy Rieffel, quando tanto se fala da apatia dos cidadãos e do declínio da participação destes no debate das questões e na acção ante os problemas que afectam a vida democrática, é importante que os meios de comunicação social sejam “suportes da palavra pública", dando-lhes espaço de expressão. Obviamente que não tenho ilusões utópicas sobre os mecanismos que constroem e dão relevo àqueles que são constituídos principais e privilegiados protagonistas desses espaços de opinião, com o estatuto — ainda na expressão de Rieffel de “intervenientes autorizados no espaço público”. Mas, por isso mesmo, impõe-se que "a palavra dos profanos” aqueles que não têm lugar reservado nesse espaço público dos media tradicionais não seja recusada no esforço e na luta pela conquista desse púlpito. É verdade que, sobretudo, os media audiovisuais vieram dar mais lugar ao interveniente cidadão anónimo com os seus fóruns abertos, muitas vezes de discutível análise. E, muito especialmente, com a Internet e a ilimitada panóplia das redes sociais, este espaço concedido à “palavra dos profanos” está mais assegurado. Porém, é pertinente que não nos iludamos nessa imensa babilónia de opinião e não desocupemos a “praça”/o lugar público que a imprensa escrita ainda nos dá. Num tempo como este de tanta propaganda de política partidária, em que a iminência de eleições nos confronta como cidadãos para tomar grandes opções, é essencial não desvirtuarmos a força que a palavra escrita e publicada continua a ter.

CORREIO LEITORES/PROVEDOR

O futebol, fenómeno social e cultural?

O leitor Augusto Küttner em relação à classificação que atribuí ao futebol vem dizer: «Agradeço ter, desta vez, querido dar atenção o meu comentário. Quanto à resposta como provedor e vindo de quem vem, esperaria  outra, totalmente diversa, que a de assumir o futebol como especial fenómeno social e cultural, para justificar no PÚBLICO o espaço descomedido que teve e por de mais vezes tem. Mas o problema e o defeito serão da minha parte, e não entendo o que é ser generalista de qualidade, ou generalista sem qualidade, ou só da especialidade futebolística.»

Comentário do provedor: Se mais argumentos fossem necessários para aduzir essa classificação de que o futebol é um tremendo, e talvez perturbante, fenómeno social, cultural económico e político, basta centrarmo-nos no que está acontecer na FIFA.

A bela região da Toscana

Adverte o leitor João Chambers: «Depois de, há tempos, ter alertado o seu colega Rui Araújo para a forma como a região italiana da Toscana era, bastas vezes, referida num jornal de referência absoluta no nosso país (referida como pequena cidade na Toscânia) —, eis que tal incorrecção volta, uma vez mais, a acontecer (sugestão da fita A Vida É Bela, edição de 22/05/15). Será que um editor com um mínimo de conhecimentos de geografia (ou de história) não poderia ter detectado este frequente e inaceitável equívoco?»

Provedor do Leitor do PÚBLICO

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