Novo maestro da Filarmónica de Berlim? Só para o ano

A votação de segunda-feira foi inconclusiva. Sucessão de Simon Rattle numa das mais importantes orquestras do mundo, a única em que os músicos elegem o seu maestro, continua em aberto.

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Os jornalistas esperaram grande parte do dia de segunda-feira pelo novo nome, que acabaria por não chegar MAURIZIO GAMBARINI/AFP
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A saída de Simon Rattle originou o escrutínio Arnd Wiegmann/REUTERS
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Martin Hoffmann, Stanley Dodds, Peter Riegelbauer, Ulrich Knörzer e Olaf Maninger, músicos, falaram segunda à noite aos jornalistas MAURIZIO GAMBARINI/AFP
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O edifício que alberga a Filarmónica de Berlim BARBARA SAX/AFP
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Claudio Abbado a dirigir a filarmónica em 1997 Tony Gentile/REUTERS

Os músicos já tinham avisado os jornalistas: a espera ia ser longa no processo único do mundo que em que os membros da Filarmónica de Berlim elegem o seu próximo maestro. Segunda-feira, o dia em que escolheriam democraticamente o sucessor de Simon Rattle, terminou sem uma decisão. E a espera adivinha-se muito mais longa, porque até chegarem ao nome do futuro líder de uma das mais importantes formações musicais do mundo poderá passar um ano.

Comparada por muitos à eleição de um novo Papa pelo secretismo e ritual que envolve a escolha do novo maestro para a orquestra, a Filarmónica de Berlim é a única que procede à selecção do seu director desta forma: por eleição dos próprios músicos. Mas se ontem as palavras em torno do escrutínio eram "suspense" e "democracia", esta terça-feira os relatos da tentativa falhada de eleição do novo mestre da orquestra são "mistério" e "não". Não se escolheu um novo maestro porque, como enceta o seu relato o New York Times, "a democracia orquestral pode ser difícil". 

"Houve discussões positivas e animadas e várias rondas de votação, mas infelizmente não conseguimos concordar num maestro", informou ao início da noite de segunda-feira um dos músicos da Filarmónica, Peter Riegelbauer, em comunicado. Uma nova votação terá lugar "dentro de um ano", acrescentou sobre o corolário de 11 horas de discussão infrutífera.

Simon Rattle, que já em 2013 tinha aludido à sua vontade de sair de Berlim antes do final do seu contrato, em 2018, anunciou no início de Março que iria deixar a Filarmónica, que dirige desde 2002, para rumar a Londres. O maestro britânico vai ser o director musical da Orquestra Sinfónica de Londres a partir de Setembro de 2017, deixando para trás aquele que considerou recentemente “o mais difícil e ao mesmo tempo o melhor emprego de maestro do mundo”. Esta saída activou de imediato o processo de sucessão na Filarmónica de Berlim: agendou-se uma reunião para dia 11 de Maio, em local não divulgado à imprensa, dos 124 membros da orquestra para votar em quem querem a dirigi-los.

O local escolhido para se encontrarem foi a Igreja Jesus Christus, na zona de Dahlem, em Berlim, e o processo de votação é singular: cada votante (há 25 nacionalidades representadas) entregou antes um envelope com cinco nomes e a discussão foi feita a partir dos cinco mais votados. Depois, chega-se ao nome final através de uma “maioria clara”, como esclareceu à AFP a porta-voz da filarmónica, Elisabeth Hilsdorf. Os telemóveis dos músicos foram confiscados e um jurista é a única pessoa exterior à orquestra autorizada a estar presente, com a finalidade de validar que o escrutínio se realizou sem irregularidades.

O New York Times relata que os músicos estavam divididos quanto ao rumo que a importante formação musical clássica deve tomar. Nos últimos meses, muito se falou na questão geracional ou artística que se coloca à Filarmónica de Berlim: escolher um jovem ou um veterano, uma perspectiva inovadora e com mais risco ou uma visão mais consolidada e conservadora?

Qualquer nome pode estar a concurso, mas sabe-se que um critério não-oficial é que haja já no passado dos nomeados alguma relação com a orquestra. O processo é assim desde que, em 1882, os membros da então orquestra de Benjamin Bilse se revoltaram contra a sua direcção, acusando-o de exploração laboral, e fundaram a sua própria filarmónica. Nascia assim uma estrutura independente e uma cooperativa que, passados poucos meses, se tornava na Filarmónica de Berlim. O escolhido é contactado por telefone e terá de decidir se aceita ou não o cargo. Como rematava segunda-feira o diário espanhol El País, “esta noite um maestro irá deitar-se fazendo parte do Olimpo dos melhores de todos os tempos”. Tal não aconteceu, mas dentro de um ano esse telefonema poderá soar.

Desde Março, a imprensa mundial foi arriscando quem poderiam ser os candidatos ao púlpito de Berlim. O venezuelano Gustavo Dudamel (34 anos), cujo contrato com a Filarmónica de Los Angeles finda em 2018 (e que é amigo de Rattle e seu colaborador), Christian Thielemann (de 56 anos, que dirige a Ópera de Dresden), o letão Andris Nelsons (37 anos, que dirige as sinfónicas de Birmingham e de Boston) ou o israelo-argentino Daniel Barenboim (72 anos) – que já em 2002, quando foi escolhido o nome de Rattle, ficou em segundo lugar na selecção dos membros da orquestra – são alguns dos mencionados. Barenboim fizera entretanto saber que não era candidato.

A Filarmónica de Berlim foi dirigida por Hans von Bülow (1887-1892), Arthur Nikisch (1895-1922), Wilhem Furtwängler (1922-1934 e 1952-1954), Leo Borchard, Sergiu Celibidache e, nos últimos anos, por Herbert von Karajan (1956-1989), o seu grande divulgador, seguiu-se Claudio Abbado (1990-2002) e Simon Rattle.
 

Notícia corrigida às 14h35

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