Bruxelas quer permitir proibições nacionais aos transgénicos

Actualmente, a autorização de qualquer OGM na Europa precisa de uma maioria qualificada de votos dos Estados-membros.

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Os países da União Europeia poderão vir a ter a possibilidade de proibir, individualmente, o uso de organismos geneticamente modificados (OGM) na alimentação humana e animal, segundo uma proposta da Comissão Europeia divulgada esta quarta-feira.

Se for aprovada uma modificação proposta por Bruxelas à actual legislação europeia, qualquer Estados-membro terá o direito de, na prática, fechar-se à importação de OGM, mesmo que tenham sido aprovados para toda a UE. É uma situação excepcional e de difícil colocação em prática, dadas as normas sobre a livre circulação de mercadorias na UE e os tratados internacionais de comércio.

Actualmente, a autorização de qualquer OGM na Europa precisa de uma maioria qualificada de votos dos Estados-membros. Quando esta maioria não é atingida – seja a favor ou contra –, a decisão fica nas mãos da Comissão Europeia. Havendo pareceres positivos da Agência Europeia de Segurança Alimentar, Bruxelas não tem na prática outra opção senão a de aprovar os pedidos. Esta tem sido a situação mais comum, uma vez que vários países opõem-se sistematicamente aos OGM e o resultado das votações tem sido inconclusivo.

O novo presidente da Comissão, Jean-Claude Juncker, tinha prometido rever este processo de autorização. Juncker queria aliviar a Comissão do ónus de tomar decisões eventualmente contrárias à vontade da maioria dos Estados-membros.

A proposta apresentada esta quarta-feira não revê, porém, o processo de autorização. Antes, sugere a possibilidade de os Estados-membros optarem por não aceitar uma decisão e proibirem um transgénico, depois da sua aprovação a nível europeu.

O mesmo já tinha sido feito em relação ao cultivo de plantas geneticamente modificadas, através de uma alteração à uma directiva, concluída em Março passado.

A proposta de Bruxelas não foi porém, bem recebida, seja por quem é a favor ou contra os OGM. “A Comissão Europeia está a sacrificar os princípios fundamentais do mercado interno ao propor uma manta de retalhos de proibições nacionais à importação de produtos seguros”, argumenta Jeff Rowe, dirigente da EuropaBio, a associação europeia das indústrias de biotecnologia, num comunicado.

Segundo a EuropaBio, todos os anos são importadas 33 milhões de toneladas de soja transgénica e o algodão geneticamente modificado é utilizado na fabricação de roupas e até de notas bancárias. De acordo com dados da Comissão Europeia, há 58 produtos geneticamente modificados aprovados para alimentação humana e animal na UE.

Organizações ambientalistas criticam igualmente a proposta, dizendo que ela não cumpre a promessa de tornar mais democrático o processo de decisão sobre os OGM, facilitando na prática a sua aprovação. “O presidente Juncker quebrou a sua promessa de que melhoraria a forma como os alimentos transgénicos são avaliados. A sua proposta é uma cortina de fumo que não lida com o défice democrático que está no centro do debate sobre os OGM”, afiram Mute Schimpf, da organização internacional Amigos da Terra, num comunicado.

Para a Greenpeace, dar mais poder aos Estados-membros não vai tornar o processo mais democrático. “A Comissão manterá o poder de autorizar os OGM contra a visão maioritária do Conselho, do Parlamento e dos europeus”, argumenta a organização, numa carta enviada a Juncker.

A Greenpeace chama também a atenção para um dos pontos mais problemáticos da proposta, o facto de chocar com as normas do mercado interno e do comércio internacional.

Os tratados da UE proíbem qualquer restrição à livre circulação de mercadorias, a não ser por razões excepcionais. Além disso, a UE está condicionada por acordos no âmbito da Organização Mundial de Comércio. A proposta de Bruxelas diz apenas que as medidas eventualmente adoptadas pelos Estados-membros têm de se enquadrar neste contexto.

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