Falta de juízes obriga Relação de Guimarães a criar "lista de espera de processos"

Novo mapa judiciário atribui mais três comarcas ao tribunal, mas faltam mais de 20 juízes e procuradores. Presidente da Relação fala em situação "dramática" e já recorreu à ministra. Conselho Superior da Magistratura promete mais magistrados.

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Última palavra sobre o caso vai caber à Relação de Guimarães MANUEL ROBERTO

O Tribunal da Relação de Guimarães (TRG) está oficialmente em estado de contingência. A situação foi declarada pelo presidente do TRG numa carta enviada ao Conselho Superior da Magistratura (CSM). Os processos chegam dos tribunais de primeira instância e não são automaticamente distribuídos como é regra. Actualmente existem 300 processos amontoados. "Tivemos de fazer uma lista de espera de processos semelhante às que se fazem nos hospitais”, explicou ao PÚBLICO o presidente da Relação de Guimarães, António Ribeiro.

Com a nova reforma judiciária, em Setembro do ano passado, a Relação de Guimarães, que já tinha jurisdição sobre Braga e Viana do Castelo recebeu ainda as comarcas de Bragança, Vila Real e Famalicão. Deste então o tribunal, que tinha cerca de 3500 processos por ano recebeu mais 1500, mas o número de juízes não aumentou, tendo até diminuído com a saída de alguns para altos cargos na administração pública. O quadro de juízes fixado por lei estabelece que o TRG teria no máximo 66 juízes, mas actualmente trabalham ali apenas 38.  

O TRG regista também falta de procuradores. O quadro prevê a existência de 13, mas actualmente existem oito, segundo o procurador Vitor Guimarães ali colocado e também membro do Conselho Superior do Ministério Público. “A situação é preocupante”, acrescentou. A procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, fez esta quinta-feira uma visita de trabalho ao TRG, onde se reuniu com magistrados, e terá sido informada da situação. A Procuradoria-Geral da República não adiantou, porém, pormenores sobre a reunião.

“O volume processual disparou para níveis inaceitáveis. Mais nenhum tribunal da Relação está confrontado com tal escassez de juízes”, alerta o presidente do TRG na carta, datada de final do ano passado e à qual o PÚBLICO teve acesso. Nela avisa que sem “reforço no quadro de juízes” a situação é “dramática”. Aliás, o magistrado não tem dúvidas de que, sem um “reforço com mais 20 juízes, pelo menos,” a “boa qualidade qualidade das decisões” dos juízes poderá estar em causa.

Na carta, António Ribeiro recorda ainda que o CSM deliberou que por ano cada juiz relataria um limite máximo de 80 acórdãos. “Com este volume de trabalho, cada juiz ficará o dobro”, aponta.

O presidente do tribunal salientou ainda ao PÚBLICO que a situação está a preocupar todos os juízes no tribunal. A situação inédita registada há duas semanas com o desabafado de um juiz deixado num acórdão já foi disso sinal, sublinham alguns magistrados. Numa nota publicada inadvertidamente no site do Ministério da Justiça onde são normalmente divulgadas as decisões dos tribunais superiores, um juiz reconhece ter “atamancado” o texto de um acórdão. E queixa-se de falta de tempo e de dinheiro para comprar livros que o habilitem em matérias que não domina.

Apesar dos esforços, António Ribeiro diz que não recebeu qualquer resposta do CSM. “Já telefonei várias vezes e o que me dizem do CSM é sempre que vão tentar. Parece que estamos a ser sacrificados por estarmos longe do poder em Lisboa. Isso é inadmissível”, crítica. Face às dificuldades, António Ribeiro decidiu recorrer à ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, com quem esteve reunido na semana passada. “Disse-me que iria tentar sensibilizar o CSM”, contou. O ministério adiantou, porém, pormenores sobre a reunião.

O CSM explicou que em 2014 “não foi possível preencher os quadros” do TRG com “juízes de primeira instância, por tal ser vedado pela nova lei de organização dos tribunais” e garantiu que “no próximo movimento judicial [entre Junho e Julho] serão colocados juízes no TRG”, mas não conseguiu para já adiantar quantos.

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