ZX Spectrum ou C64?

No fim, toda esta guerra sobre o melhor sistema ser X ou Y, era realmente parva. Tal como hoje. O que se estava à procura era na verdade de uma validação

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Estava há pouco tempo num grupo de uma rede social a ler mais um eterno debate entre marcas de consolas e apetecia-me dizer que este tipo de palermice “não era assim no meu tempo”. Mas isso seria a mais pura das mentiras, porque, na verdade, “no meu tempo” também se discutiam marcas. Não de consolas, mas de computadores. Ou, mais especificamente, de microcomputadores.

Deixem-me que vos leve até aos anos 80, uma época em que tudo era glamoroso e assustador; uma época em que a Europa pouco ligava às consolas e consumia (ou mesmo inventava) microcomputadores a uma velocidade espantosa. Esta foi a era dos sistemas da Sinclair Research e da Commodore. Por outras palavras, tudo começou com a grande guerra entre o ZX Spectrum e o Commodore C64.

As discussões entre os utilizadores ou fanáticos destes dois sistemas eram tão parvas como as que existem agora. É claro que não se discutia fps, ou gráficos mais reais que a realidade, mas sim outro tipo de pormenores. Os possuidores do C64 defendiam-se com os seus poderosos 64K de RAM, contrapondo com os “apenas” 48K do Spectrum. Mostravam que o sistema da Commodore tinha mais cores, que o "attribute clash" era menor (apesar de também acontecer), ou que o som era sem dúvida nenhuma de outro nível. O SID II era quase como uma orquestra sinfónica, enquanto o "speaker" do Spectrum mais parecia um músico de rua que, sim, de vez em quando, disparava umas composições espectaculares, mas outras vezes libertava uns agudos atrozes.

Evidentemente que o ZX Spectrum estava em desvantagem, mas, tal como hoje, o que mudava o tabuleiro a seu favor eram principalmente as duas coisas mais importantes: o preço e os jogos. Infelizmente, ou não, o C64, tecnicamente superior ao sistema da Sinclair, significava um peso na carteira. Custava quase o triplo do modesto ZX Spectrum e, por isso, o microcomputador britânico era mais apelativo.

Depois, claro, os jogos. Pelos padrões actuais é incrível notar como um sistema tão discreto alimentou conceitos tão diferentes. Quem se pode esquecer de Manic Miner? Ou Match Day? Ou Chuckie Egg? Ou coisas tão absurdas como a aventura de um ovo em Fantastic World of Dizzy? Ou quando as formigas mutantes atacaram no Ant Attack? Tudo boas razões para possuir um Spectrum.

No outro lado da barreira também havia argumentos de peso. O C64, orgulhosamente, mostrava Uridium, Turrican, Wizball, Microprose Soccer, Impossible Mission... As conversões dos títulos arcade eram das melhores no mercado; títulos como Bubble Bobble e Wizard of Wor demonstravam plenamente o poder do sistema. A bizarria também tinha lugar aqui, jogos como The Great Gianna Sisters, Mayhem in Monsterland e Manic Mansion não ficavam atrás da oferta Spectrum.

No fim, toda esta guerra sobre o melhor sistema ser X ou Y era realmente parva. Tal como hoje. O que se estava à procura era na verdade de uma validação. Simplesmente porque ao comprar sistema X, o Y tem de ser inevitavelmente pior. Afinal, ninguém era “parvo” e sabia comprar o que era bom. Ou então não. Isto foi tudo parvo, mas talvez agora quase seja uma parvoíce charmosa. Nos próximos anos espero ver ainda mais argumentos do mesmo calibre, com mais gente à procura da sua evangelização da marca perante os “infiéis”. Isso também faz parte em pertencer a este fenómeno que tem mudado o mundo nos últimos 40 anos. Quanto a guerra entre o C64 e Spectrum, sabem quem ganhou? Pois, eu também não sei. Até parece que foi tudo em vão...

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