Ex-presidente da Câmara de Valongo processa sucessor por campanha difamatória

Deputado municipal assumiu num blogue ter sido co-autor, com o actual presidente, de folheto anónimo distribuído durante a campanha autárquica de 2013.

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João Paulo Baltazar foi presidente de Câmara de Valongo em metade do mandato anterior, e perdeu para o PS Adriano Miranda
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João Paulo Baltazar foi presidente de Câmara de Valongo em metade do mandato anterior, e perdeu para o PS Adriano Miranda

Nas últimas eleições autárquicas, milhares de cidadãos de Valongo receberam na caixa de correio – em casa ou no computador – um panfleto anónimo dando conta da existência de um polvo no município, encabeçado pelo então presidente e candidato do PSD, João Paulo Baltazar, e com ramificações (as pernas do bicho), em oito funcionários. Ano e meio depois, um deputado municipal, eleito pelo PS, assume agora que “cozinhou” o desdobrável “Polvo à Vallis Longus”, a mando do então candidato do PS, e actual presidente, José Manuel Ribeiro, levando o principal visado a interpor um processo contra ambos.

O “polvo à moda de Valongo” terá sido servido em “doses massivas”, nas caixas de correio do concelho em vésperas das eleições, com intuito claro de atingir o candidato do PSD, João Paulo Baltazar, que, se candidatava pela primeira vez à liderança da mesma. Na altura, o homem que a meio do mandato sucedera a Fernando Melo na presidência desta câmara, sentiu-se “enxovalhado” com a acção, mas, explicou esta terça-feira, não interpôs uma queixa contra desconhecidos “por não acreditar” na eficácia da mesma e por “não querer ampliar a curiosidade” pelo flyer, que o atingia a si, à família, e a alguns amigos.

Nessas eleições, nas listas do PS à Assembleia Municipal seguia em sexto lugar o independente Celestino Neves, que pouco tempo depois já demonstrava no seu blogue A Terra é o limite grande arrependimento pela opção tomada, criticando abertamente o autarca que ajudara a eleger. O deputado tem denunciado vários casos na gestão municipal actual, e explicou ao PÚBLICO que rompeu com o PS quando lhe foi exigida disciplina de voto, para aprovação da nova versão do Plano Director Municipal, já este ano. Neves considera que o processo tem irregularidades e denunciou-as à Inspecção Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território. E assume que, de divergência em divergência, vinha há algum tempo a ponderar revelar o que diz saber sobre o caso do flyer.

O deputado afirma agora que “lhe desagradou” o teor do desdobrável, mas acrescenta que mesmo “a contragosto” assumiu levar a cabo o trabalho, para ajudar a eleger o socialista em cujo projecto de mudança “acreditou”. “Ele poderia ter assumido a autoria daquilo”, considera o independente que, a 22 de Março, num post com o título “malfeitorias da ’jovem promessa’ valonguense” publicou imagens de e-mails e mensagens alegadamente trocadas com José Manuel Ribeiro em que este lhe envia conteúdos para o panfleto anónimo. “Eu guardo os brutos desse trabalho e os e-mails”, garante, preparando-se, agora, para responder por isso em tribunal.

Neste ano e meio, o deputado tinha já sido processado pelo marido de uma funcionária municipal. Uma pessoa que, alegadamente a pedido do mesmo José Manuel Ribeiro, Neves acusara no Facebook de ter apagado informação sensível de computadores da autarquia, no período de transição entre mandatos. “Depois de me andar a tranquilizar durante meses sobre as provas que tinha e a incentivar-me a não aceitar qualquer acordo, José Manuel Ribeiro deixou-me só na altura em que ou fazia o dito acordo ou o assunto seguiria para Tribunal. Fiz obviamente o acordo com a pessoa visada e ainda hoje não consigo chegar à fala com José Manuel Ribeiro - ou com algum dos seus 'adjuntos' no sentido de acertar os custos...”, explicava no mesmo post de 22 de Março.

Por estes e outros motivos – bem visíveis nos textos que vem publicando no blogue pessoal”, Celestino Neves acabou por voltar ao caso do panfleto anónimo um ano e meio depois do caso e numa altura em que o principal visado, João Paulo Baltazar, sentia já “cicatrizar” o vexame por que passou naquelas semanas de Setembro de 2013. “A ferida já ganhara crosta”, garante, mas perante as declarações do deputado no blogue, há uma semana decidiu tomar a decisão pessoal de processá-lo, e ao presidente de câmara como co-autores “deste ataque cobarde e asqueroso”.

“A intenção de quem produziu este flyer e o distribuiu massivamente pelo concelho de Valongo foi a de atingir – e atingiram de forma flagrante – a minha honra, associando-me a factos que sabiam não corresponder à verdade, assim como atingir os meus familiares e amigos”, afirmou esta terça-feira em conferência de imprensa, lembrando que só a sua mãe, que há décadas trabalha ao balcão num estabelecimento no centro de Valongo, recebeu dois panfletos no correio e viu-se confrontada com as reacções dos clientes.

João Paulo Baltazar espera agora que as “evidências” levem a uma "condenação exemplar dos autores deste exercício gratuito de insulto e de difamação de forma agravada". "É de justiça que sejam apuradas as responsabilidades criminais dos autores deste acto repugnante, que implicaram a difamação e calúnia de nove pessoas inocentes". O vereador considera inédito a este tipo de acção na política local e diz-se até “surpreso pelo facto de o presidente da Câmara ter recorrido” a ela, a comprovar-se a denúncia do deputado municipal. “Isto está abaixo do grau zero da política”, insiste.

O autarca do PS escusou-se, nesta fase, a tecer qualquer comentário, dizendo-se “totalmente tranquilo” em relação ao caso. E não reagiu às críticas do seu antecessor. “José Manuel Ribeiro revelou que não tem coragem para vir à liça no momento próprio, com argumentos objectivos. Por isso refugia-se em ataques efectuados de forma canalha e cobarde”, acusa o seu adversário, que espera que, após decisão judicial, o PS local e a distrital do Porto – que não quer, para já, comentar o caso – tomem uma posição política. “Quero saber se aprovam este tipo de campanha”, afirmou, questionando quem terá pago o trabalho “sujo”.

No seu blogue, Celestino Neves diz que pagou, do seu bolso, 350 euros, para impressão dos flyers que assume ter montado, com os textos do autarca e o apoio, na execução gráfica, de um amigo. E garante que o dinheiro nunca lhe foi devolvido. “Esta publicação não foi assumida pela campanha. Só três ou quatro pessoas sabiam disto. Mas algumas pessoas próximas começaram a perguntar se eu era o responsável por aquilo e acabei por decidir revelar tudo. Fi-lo agora por motivos políticos, não pessoais. O presidente afastou-se do programa que levou a votação em Setembro de 2013 e tentou silenciar-me quando comecei a fazer perguntas sobre algumas decisões”, acusa.

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