As Forças Armadas são uma instituição estruturante do Estado

Não respeitar a condição militar é por em causa uma das funções essenciais do Estado criando insegurança e incerteza na Instituição e nos cidadãos.

“A necessidade de preparação da defesa não significa a iminência da guerra. Pelo contrário, se a guerra estivesse iminente, a preparação da defesa já vinha tarde” (Winston Churchill)

1. Vive-se um ambiente internacional de grande incerteza, essencialmente ao nível geopolítico de complexidade sem precedentes, que exige das Forças Armadas (FA): prontidão.

Além do mais, a aceleração da globalização - com a instabilidade das hierarquias do sistema mundial - e disfunções nos equilíbrios entre poderes e centros de decisão aumentaram os desafios na segurança dos Estados, que podem comprometer a Segurança Nacional.

As FA têm contribuído de forma indelével para a afirmação e credibilidade externa de Portugal. Isto devia ser explicitado aos cidadãos – pela classe política sem ambiguidades - para que se combata o “discurso da inutilidade”. Saber fazer pedagogia sem demagogia.

Por isso, a sustentabilidade das FA não deve ser analisada numa perspectiva meramente contabilística, porque é redutora da Segurança Nacional. A segurança é um activo estratégico essencial.

A crise económica, social e da política acabam por se transformar numa crise de segurança que não pode comprometer o exercício de soberania e autoridade do Estado condicionada por critérios contabilísticos.

Sendo as FA uma Instituição de carácter nacional, estruturante da nossa identidade à qual compete garantir a independência nacional e a integridade do território, deve ser preservada e respeitada.

2. O Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN) é um documento estruturante da Política de Defesa Nacional. A sua revisão devia permitir clarificar, sem sofismas, o que se pretende das FA que se encontram num longo processo de reestruturação e transformação.

As FA são a Instituição que mais se reformou passando da guerra de África com 240 mil homens (45% do orçamento) para um modelo de segurança cooperativa e operações de apoio à paz e humanitárias com cerca de 30 mil efectivos e um custo de 1,1 % do PIB.

O MDN tem confundindo o contribuinte sobre os efectivos. Todavia, as FA têm que estar organizadas e preparadas, em tempo, para cumprir as missões atribuídas pelo poder político.

Para isso, são necessárias capacidades militares -que assegurem o sistema de forças (SF) com coerência operacional -, com meios e efectivos necessários, de acordo com o nível de ambição estabelecido, sem demagogia e assumindo os riscos de ameaças que não respeitam fronteiras.

A última reforma tinha ocorrido em 2009 e este Governo quis fazer outra “reforma” apenas para justificar os brutais “cortes cegos” (além da troika) que as descaracterizaram.

O ciclo de planeamento estratégico foi “subvertido”com o corte de efectivos - antes da aprovação do CEDN e Conceito Estratégico Militar – e não reflectem os riscos e as melhores opções. Este método criativo só serviu para iludir e acelerar o processo de decisão. Mas a realidade é ficção.

Ao nível político, importa ter a noção de que a redução dos efectivos, sem racional credível, e a falta de meios – não respeitando os requisitos e prioridades de defesa - tem impacto negativo nas capacidades do SF e afecta a prontidão das FA.

A reforma foi inspirada no modelo Dinamarquês e ficou evidente o irrealismo do padrão comparativo já demonstrado. É imperativo nacional controlar e defender o nosso espaço geográfico. A situação geoestratégica, resultante da posição geográfica, dimensão – espaços marítimos com 20 vezes o território terrestre – e configuração arquipelágica, bem como a diáspora única e interesses estratégicos específicos, deviam ter reflexos no redimensionamento das FA.

A actuação das FA depende da capacidade de defesa territorial, fiscalização dos espaços de soberania e jurisdição nacional, protecção e evacuação de cidadãos nacionais e segurança cooperativa, potenciando a capacidade de operações especiais conjuntas.

3. A configuração do SF é determinada pela exigência do quadro estratégico internacional. Portugal faz parte de uma região com instabilidade latente em que a UE terá que assumir maior esforço na defesa, face à alteração estratégica dos EUA e da NATO.

A redução da capacidade operacional – o Governo será responsabilizado - aumenta os riscos em caso de necessidade de resposta a ameaças e riscos complexos com elevada probabilidade como o combate mais duro ao Estado Islâmico – também têm como objectivo a Península Ibérica -, e não na modalidade ligeira como pretende o MDN.

Os “cortes cegos” efectuados afectam a gestão operacional, as condições de segurança, a saúde militar – caos e discriminação com dupla tributação – degradou as condições de vida e, consequentemente, a prontidão das FA. Inusitado comportamento, que conduz ao incremento generalizado da desmotivação e afecta, seriamente, a condição militar essência da organização.

Não respeitar a condição militar é por em causa uma das funções essenciais do Estado criando insegurança e incerteza na Instituição e nos cidadãos. E o novo Estatuto com o secretismo da revisão caminha para a governamentalização das FA. Inadmissível!

Aos militares é exigida disponibilidade permanente, incluindo sujeição dos riscos inerentes às missões com renúncia aos interesses pessoais e mobilização automática que vai até ao sacrifício da própria vida – assumido no juramento perante a Bandeira Nacional. Não se pede nada disto a um funcionário público.

Tem sido indubitável a incompetência, sobranceria, despudor e, até, ilegalidade com que sucessivos governos têm vindo a tratar as FA! E não são os militares que estão no sítio errado.

Não basta afirmar a Paz esquecendo que a resolução de conflitos pode obrigar à utilização da força militar. As catástrofes, conflitos e crises não avisam. E a Defesa Nacional não pode ser um milagre!

A “lógica de reinvestimento” resultará das orientações da NATO (2 a 3 % do PIB) e outras realidades que exigem maior nível de participação do que 1% do Orçamento da Defesa impostos por quem “ofendeu a dignidade dos povos” (Presidente Juncker). Inaceitável intromissão e submissão que o PM considera normal.

Os compromissos vão passar a ser muito mais exigentes numa UE fragmentada em que a solidariedade deixou de estar em exercício também ao nível da segurança pela inacção da liderança “esquizofrénica”.

Por isso, a imprevisibilidade e tipo de ameaças transnacionais, as missões e os requisitos de defesa exigem reponderar a estratégia e proceder a alterações que podem levar os decisores a concluir que têm de orientar mais e melhores meios para as FA, com um SF mais eficaz e exigente.

As FA são um importante instrumento do Estado de salvaguarda da coesão e soberania nacionais, constituindo, a afirmação da credibilidade de Portugal. Mas ao nível interno não podem ser afectadas.

Contudo, a reforma dos “cortes cegos” atinge a degradação e dignidade das nossas FA. “O reforço da coesão e do prestígio das FA, devia constituir um objectivo, merecedor de atenção prioritária ao nível político” (Presidente da República).

Espera-se, por isso, um CEDN – integrado numa Estratégia Nacional –, que garanta a articulação com os meios e os recursos necessários existindo a assumpção plena dos custos de soberania.

 

Factores de potencial estratégico e objectivos nacionais permanentes

O actual CEDN assume-se com presunção como Estratégia Nacional, quando há sectores do Estado que não foram consultados. E não foi feito o exercício de ponderação entre as exigências e as possibilidades - os objectivos, os meios necessários e os recursos para os assegurar e manter.

A Estratégia Nacional (ou grande Estratégia global do Estado) – PÚBLICO 30DEZ2012 – devidamente consensualizada é que permitirá enquadrar, de forma coerente, a visão do futuro, as reformas estruturantes que o País necessita com a integração apropriada dos factores de potencial estratégico, através dos principais objectivos nacionais permanentes assegurando a continuidade das opções estratégicas assumidas para além dos ciclos da governação e interesses partidários.

1 - Custos da função soberania
Não pode mais haver Governos que não saibam para que querem as FA com especulação sobre a sua sustentabilidade. A partir de 1999, Portugal pôde assegurar uma presença simultânea significativa nos Balcãs e em Timor-Leste. As FA têm participado desde 1991, de em operações de resposta a crises tendo Portugal projectado nos últimos 17 anos, mais de 26.000 militares: da Marinha (13 464); Exército (11 920); FAP (709) em 18 Teatros de Operações em 04 Continentes.

2 - Explicar a Necessidade de Equipamentos
Os políticos sabem sempre o preço de tudo, mas raramente sabem o valor dos equipamentos e a relação custo-eficácia. Haja coragem para saber fazer pedagogia. Exemplo: Se não tivéssemos F-16. Teríamos um “buraco” no nosso espaço aéreo para a NATO correspondente a 54 vezes o território nacional. Os dois submarinos, insipensáveis pelo grande raio de acção, podem intervir na defesa no triângulo estratégico português e têm poder de elevada dissuasão, que asseguram a vigilância, controlo e defesa do vasto espaço marítimo; (recolha de informações estratégicas) e responsabilidades no âmbito da NATO. Não temos sabido tirar as contrapartidas pela inépcia e corrupção ao nível político.

3 - Missões de Interesse Público
É necessário fomentar iniciativas que mostrem o empenhamento das FA à comunidade quer ao nível nacional – em especial as missões de interesse público – quer nas missões de apoio à paz e assistência humanitária. O Exército apoia com pessoal e meios a Protecção Civil e Câmaras Municipais ou outras entidades (como a EDP) até com equipamento de engenharia; a Marinha, em média, executa, por ano, cerca de 18 mil vistorias a embarcações, 30 acções de combate à poluição e em conjunto com a Força Aérea mais de 1 500 salvamentos de vidas humanas.

Capitão-de-Fragata SEF (Reserva)

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