Hillary Clinton oficializa candidatura à presidência dos Estados Unidos

Favorita à nomeação do Partido Democrata, Clinton não vai ter tarefa fácil para chegar à Casa Branca.

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Reuters

O tweet por que todos esperavam ao meio-dia surgiu afinal às 15h27 e dizia “Sou candidata a Presidente”. A ex-secretária de Estado, antiga senadora e Primeira Dama dos Estados Unidos, Hillary Clinton, deu início à sua segunda campanha pela nomeação do Partido Democrata às eleições presidenciais norte-americanas de 2016 sem pompa e circunstância, com menos de 140 caracteres nas redes sociais. “Os americanos precisam de um champion [um protector, um guardião] e eu quero ser esse campeão.”

A mensagem acabou com o tabu que verdadeiramente não o era. Pôs também fim à subtil intervenção política de Hillary Clinton nos últimos meses, numa discreta antecipação para a campanha eleitoral. Ao oficializar a candidatura, as declarações políticas de Clinton deixam de ser antecedidas pelo símbolo tipográfico do cardinal (o hashtag #), por tópicos enquadrados ou resumidos em palavras-chave e etiquetas (ou tags). Deixa, também, de obedecer exclusivamente à sua agenda: a partir de agora, Hillary vai ter de se pronunciar sobre tudo, e não apenas o que lhe interessa.

Essa transição da atmosfera mais recatada do mundo digital para a imprevisível vida real é algo que a candidatura pretende explorar já no arranque da campanha, com uma série de eventos cuidadosamente orquestrados para aproximar Hillary Clinton dos eleitores dos estados do Iowa e do New Hampshire, os primeiros a votar nas primárias. Ambos simbolizam o que correu mal e bem na sua anterior candidatura: a aura de inevitabilidade com que se posicionou em 2008, soçobrou logo na primeira etapa da corrida, quando perdeu com estrondo para um ainda pouco conhecido Barack Obama nos caucus do Iowa. A vitória que surpreendentemente arrecadou dias mais tarde no New Hampshire, contrariando todas as sondagens, foi reveladora da sua resiliência: afinal as emoções aparentemente descontroladas não mostravam a sua fragilidade mas antes a sua fibra.

Estes primeiros contactos são só o “aquecimento”, que deve durar entre seis e oito semanas explicava depois a campanha (ao mesmo tempo que Clinton publicou o anúncio no Twitter, ficou activa na página da candidatura na Internet, Hillary for America. Só em meados de Maio é que a candidatura deverá marcar um grande evento.

A expectativa relativa ao anúncio de domingo e às suas primeiras acções de campanha esta semana tem a ver com o posicionamento da candidatura de Hillary Clinton, aquilo que no jargão político se designa como o “arco da narrativa” da sua campanha, basicamente uma espécie de sumário do seu programa político e explicação do motivo por que se candidata. Segundo a imprensa norte-americana, o “tema” geral será económico, com a campanha assente na defesa de políticas para a classe média, o combate às desigualdades e a garantia de oportunidades para todos. “O propósito [da candidatura] é que cada família, cada pequena empresa, cada americano, possa encontrar o seu caminho para a prosperidade”, diz um documento da campanha obtido pela Bloomberg.

Desta vez, o trajecto até à nomeação parece ser mais fácil para Clinton, que parte em vantagem em termos de notoriedade política e recursos financeiros face aos seus concorrentes. Ao contrário de 2008, quando o campo democrata estava repleto de figuras capazes de entusiasmar as bases do partido pelo carácter inédito e simbólico das suas candidaturas (além de Barack Obama, o primeiro negro, havia também Bill Richardson, o primeiro hispânico), os seus próximos rivais devem ser políticos mais “convencionais”. Seis anos depois, Hillary continua a representar a possibilidade de ter pela primeira vez uma mulher à frente do Governo dos EUA – mas em termos eleitorais, esse ás de trunfo já foi desperdiçado na campanha anterior.

Desengane-se, porém, quem acredita que as próximas primárias serão um “passeio” até à inevitável nomeação de Hillary (ou uma coroação, como gosta de dizer a imprensa dos EUA). Mesmo sem adversários capazes de inspirar uma nova geração de eleitores, a ex-secretária de Estado está longe da unanimidade entre as fileiras do partido, e terá de voltar a ultrapassar as desconfianças relativas à sua personalidade e carreira política. Para isso, conta com ajudas preciosas: no sábado, no Panamá, o Presidente Barack Obama, garantiu que Hillary daria “uma excelente presidente”. Um dia depois, John Kerry, que lhe sucedeu no Departamento de Estado, destacou a “incrível” capacidade de Clinton para “reconstruir alianças”.

O principal desafio para a sua candidatura resulta da actual conjuntura política nos EUA: Hillary vai lutar para manter a Casa Branca nas mãos dos democratas, num contexto de desgaste e enorme descontentamento público com as políticas da Casa Branca. Os Estados Unidos têm uma arreigada tradição de alternância democrática, e desta vez, a campanha da mudança será a republicana – mesmo que o candidato conservador acabe por ser Jeb Bush, o último representante da dinastia política que já por duas vezes ocupou a Casa Branca. Mas num eventual confronto presidencial com o antigo governador da Florida, Hillary Clinton não poderá explorar o tema do nepotismo sem dar um tiro no pé.

A parada não podia ser mais alta. Uma derrota presidencial de Clinton terá consequências devastadoras para o Partido Democrata e as políticas liberais: com o Congresso dominado pelos republicanos, estes ficariam com o campo aberto para inverter a linha seguida por Obama. Em caso de vitória, o domínio conservador do legislativo coloca-a perante o dilema de governar em confronto aberto com a oposição, ou então ceder a iniciativa política aos seus adversários – algo que Hillary manifestamente não gosta de fazer.

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