ONGs em Portugal, milhares invisíveis?

São milhares em Portugal. De Organizações Não Governamentais (ONG), que são privadas e sem fins lucrativos, que não são nem empresas nem instituições do setor público, e que desenvolvem a sua atividade na área social, nas áreas da cultura, da educação e investigação, social, da proteção do ambiente, da saúde e da defesa dos direitos humanos, entre outras.

Lidam com a satisfação de necessidades que não são o foco das empresas, que daí não retirariam retorno suficiente, e que não são usualmente prioridade dos governantes, passados, presentes e futuros, na medida em que não são necessidades do eleitor mediano, muito embora não se ignore o contributo da sua satisfação para a coesão social.

São associações e fundações, e podem ser cooperativas; e esta tipologia é suficiente para abarcarmos, por exemplo, as misericórdias e as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS). As ONG, porque estão onde não está outro tipo de organizações, a satisfazer necessidades tantas vezes prementes, e porque estão, muitas, a fazer bem o bem, são indispensáveis. Tantas vezes invisíveis para a maioria, mas indispensáveis.

Há quem lhes chame organizações do terceiro setor, ou da economia social, entre várias outras denominações, nem todas coincidentes, mas todas respeitantes a uma realidade que é privada, não pública, e em que os eventuais excedentes têm que ser reinvestidos. A Fundação Calouste Gulbenkian chama-as de ONG no âmbito do seu Programa Cidadania Ativa, e desafiou uma equipa de investigadores a definir o conceito e a estudar estas organizações em Portugal. De acordo com o conceito de ONG trabalhado estaremos a falar de mais de 17.000 organizações em Portugal (se nos guiarmos pelo conceito de referência do Instituto Nacional de Estatística para a Conta Satélite da Economia Social estaremos a falar de mais de 55.000 organizações).

E são organizações que precisam de nós, de todos os cidadãos, como constatado no referido estudo. Precisam de voluntários a vários níveis: na liderança e no exercício de funções de gestão a título de voluntariado de competências. Precisam de gestores profissionais: de recém-licenciados e de profissionais com experiência que queiram e possam optar por um emprego diferente onde o esforço diário é servir diretamente o interesse público. Precisam do reforço de competências ao nível da gestão estratégica, do marketing e da angariação de fundos, da gestão da qualidade, entre várias outras. Iniciaram já caminho nestas áreas, algumas têm desempenhos notáveis, mas é preciso ir mais longe e mais depressa.

Não temos grande história em Portugal de campanhas nacionais de apelo ao voluntariado e às doações. Mas a necessidade está lá. A nossa história enquanto nação explica-nos em boa parte como sempre contamos com a Igreja e os monarcas, primeiro, para nos resolverem os problemas, e depois com o Estado, que durante quatro décadas foi ditatorial e inibidor da sociedade civil. Ficaram marcas profundas na sociedade civil. Há quem nos chame de brandos, Hofstede diria distantes do poder. Mas a saúde da sociedade civil e a capacidade de resposta às suas necessidades depende de todos nós e do nosso envolvimento. Porque há necessidades cuja satisfação não garante a sobrevivência das empresas e os governantes não irão além do eleitor mediano...

Docente da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa, no Porto. Coordenadora do estudo. A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico.

Sugerir correcção
Comentar