Do internamento para a vida em liberdade: primeiros passos para a inserção social dos jovens

Até ao dia 15/02/2015, a Lei Tutelar Educativa (aplicável a adolescentes que cometam crimes entre os 12 e os 16 anos, evidenciando a necessidade de serem educados para o Direito) não previa nenhuma fase de acompanhamento ou transição entre a vida num centro educativo e a vida em liberdade. Já há algum tempo se tinha identificado o problema e se vinha reclamando a mudança. Por exemplo, um jovem de 15 anos podia ser internado num centro educativo, em regime fechado (o mais grave de todos), e nele permanecer até aos 18 anos (três anos é o tempo máximo de cada internamento), sendo depois libertado.

Se considerarmos que, as mais das vezes, o seu meio de origem é carenciado e desestruturado, quantas vezes ele próprio responsável (ou, no mínimo, co-responsável) pela sua delinquência (“bad kids are often the sad kids”), o cenário torna-se muito pouco animador. Ainda que a vida no centro educativo tivesse proporcionado alguma “educação para o Direito” (tal é o objetivo da aplicação das medidas tutelares educativas), ainda que o jovem se tivesse consciencializado do mal praticado e da importância do respeito pelos valores fundamentais da sociedade e ainda que tivesse adquirido algumas ferramentas ao nível da sua educação e/ou formação profissional, mesmo perante este cenário otimista, como se desenvolveria a sua vida quando voltasse para a sua família conflituosa e os seus colegas (quantas vezes delinquentes ou pré delinquentes)? Como preparar o jovem para se inserir de forma digna e responsável na sociedade, afastando-o dessa mesma sociedade e sem lhe oferecer uma fase de acompanhamento ou transição? E como prepará-lo para essa inserção se voltava a encontrar os mesmos fatores que o “empurraram” para o crime? A hipótese de revisão das medidas, podendo um internamento em regime fechado progredir para um regime mais aberto, não resolvia tudo, até porque esta revisão não é obrigatória, nada obstando àquela passagem abrupta.

O período de supervisão intensiva e o acompanhamento pós-internamento, inseridos agora na lei, têm por objetivo dar resposta a estes problemas. Com o primeiro, a fase final da medida é cumprida em “meio natural de vida” ou em “casas de autonomia” e supervisionada pelos serviços de reinserção social. Durante este período o menor pode estar sujeito ao cumprimento de deveres e/ou de regras de conduta, tais como, a obrigação de frequentar o sistema educativo ou de assiduidade no posto de trabalho e/ou de se submeter a programas formativos, de educação sexual, rodoviária, ou outros que se mostrem adequados. Caso o período de supervisão intensiva não tenha sido determinado, haverá um acompanhamento pós-internamento, estabelecendo-se as tão necessárias “pontes” entre a Lei Tutelar Educativa e a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (sempre que possível havendo articulação com a família do jovem) e podendo ser criadas “unidades residenciais de transição”. É evidente que estas medidas são de saudar, perguntando-se, no entanto, porque não se previu a sua conjugação, caso tal se mostrasse necessário. Deseja-se ainda que estas mudanças passem da letra da lei para a realidade, sendo urgente a boa formação de técnicos que acompanhem a inserção dos jovens e a criação das “casas de autonomia” e das “unidades residenciais de transição”. Infelizmente, muitas são as situações em que é inviável ou prejudicial que o jovem volte para o seu meio de origem, sendo então imprescindível criar condições para que comece uma nova vida.

Docente da Escola de Direito da Universidade Católica Portuguesa, no Porto

A autora escreve segundo as regras do novo Acordo Ortográfico

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