Olha o robô

O sul-africano Neill Blomkamp continua a brincar ao filme de género com ideias, mas Chappie é o seu título menos conseguido.

Foto

Neill Blomkamp não pede desculpas por ser um sul-africano a trabalhar no interior da indústria americana, nem por querer dinamitar por dentro a lógica do blockbuster de acção injectando-lhe uma dimensão de sátira social contemporânea.

Depois da parábola do apartheid e da xenofobia de Distrito 9 (2009) e do manifesto luta de classes de Elysium (2013), ei-lo a amalgamar tudo o que fez antes com a ideia da inteligência artificial em Chappie, que se volta a passar num futuro próximo, numa Joanesburgo onde o crime baixou com a introdução de robôs-polícia. Um dos seus criadores modifica um desses robôs com um programa experimental de inteligência artificial, mas uma série de incidentes acabam por levar o “batedor 22” na sua nova iteração, ainda em modo de aprendizagem, a ser recolhido por um pequeno bando de criminosos que procura apenas sobreviver na rua.

Se a premissa é tão ou mais inteligente como o que a antecedeu na obra de Blomkamp, já a concretização é problemática: depois de uma primeira hora que cruza impecavelmente forma e função, numa mistura distópica de Frankenstein com Robocop, Chappie cai numa remake mal-disfarçada do Eu Robot de Alex Proyas, procurando, sem nunca o encontrar, o equilíbrio entre a acção visceral e o filme de ideias. Há, obviamente, a curiosidade de Blomkamp usar como heróis actores “fora do baralho” (o indiano Dev Patel e os rappers sul-africanos brancos Ninja e Yo-Landi Visser, dos Die Antwoord) e de manter Joanesburgo como base de trabalho (com a diferença de que, aqui, a cidade é mais “pano de fundo” do que personagem). Mas fica também a ideia de que Blomkamp é um sprinter que se inscreveu numa corrida de fundo sem ter arcaboiço para a distância, e que Chappie é um filme com mais ideias do que cabeça para as trabalhar. Ainda assim, as ideias são tantas – e tantas delas boas – que vale a pena dar uma olhadela.

Sugerir correcção
Comentar