"Pecámos contra a dignidade [da Grécia e de Portugal]", diz Juncker

Presidente da Comissão Europeia reconhece "falta de legitimidade democrática" da troika e deixa críticas a Durão Barroso.

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É uma assunção de culpas de Jean-Claude Juncker e um apontar de dedo a Durão Barroso. O actual presidente da Comissão Europeia e ex-presidente do Eurogrupo reconheceu na quarta-feira à noite que “falta legitimidade democrática" à troika e que a Europa atentou “contra a dignidade” dos países que pediram resgates.

“Pecámos contra a dignidade dos povos, especialmente na Grécia, em Portugal e também na Irlanda. Eu era presidente do Eurogrupo e pareço estúpido em dizer isto, mas há que retirar lições da história e não repetir os erros”, disse Jean-Claude Juncker, em declarações no Comité Económico e Social Europeu, em Bruxelas.

A "recuperação da dignidade da Grécia" foi um dos motes da campanha eleitoral do Syriza e continua a ser uma das bandeiras do primeiro-ministro, Alexis Tsipras, desde que assumiu a liderança da Grécia, no final do mês passado. "Não negociaremos o orgulho e a dignidade do nosso povo”, disse Tsipras na semana passada no Parlamento grego, quando apresentou o programa de governo para os próximos quatro anos de mandato.

Na anterior Comissão Europeia, presidida por José Manuel Durão Barroso,“nem se discutia” a Grécia, porque se “confiava cegamente na troika”, acusou Jean-Claude Juncker na quarta-feira à noite, em Bruxelas. Mas é hora de emendar o erro, diz o actual presidente da Comissão. “A troika é pouco democrática, falta-lhe legitimidade democrática e devemos rever essa questão quando chegar o momento”, afirmou.

Frisou, porém, que tanto o Fundo Monetário Internacional (FMI), como o Banco Central Europeu (BCE) e a Comissão Europeia devem continuar a fazer parte da sua estrutura, ainda que considere que os interlocutores com os Estados devam mudar.

Altos funcionários em vez de políticos
Segundo Juncker, nas suas conversas com responsáveis que tiveram de negociar com a troika, havia uma queixa recorrente: a de que lidavam com altos funcionários e não com políticos. “Não critico os altos funcionários, mas não se coloca um alto funcionário face a um primeiro-ministro ou a um ministro das Finanças”, disse. O interlocutor terá de ser um comissário ou um ministro “que tenha autoridade no Eurogrupo”, sublinhou Juncker.

Esta não é a primeira vez que o responsável defende a necessidade de rever o modelo da troika para uma estrutura “mais democrática”. Nem é, tão-pouco, o primeiro mea culpa de um dos responsáveis da troika quanto à forma como foram geridos os planos de resgate no mesmo Comité Económico e Social.

No final de 2013, numa intervenção nesse comité, a directora-geral do FMI, Christine Lagarde, assumiu que o Fundo errou e que a Grécia e Portugal deveriam ter tido "mais tempo" para cumprirem programas que exigiam “demasiada consolidação orçamental, demasiado depressa”.

Na quarta-feira, Juncker deixou, no entanto, o aviso: “[As críticas à troika] em nada reduzem a necessidade de consolidar a curto, médio e longo prazo as nossas finanças públicas.” Não se pode viver “à conta das gerações futuras, nem deixar de fazer as reformas estruturais que aumentem o potencial de crescimento da Europa”, disse.

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