Nova lei da criminalidade juvenil deve ser aplicada com os meios existentes

A magistrada Maria do Carmo Peralta, coordenadora da comissão fiscalizadora dos Centros Educativos para jovens que cometem actos qualificados de crime, diz que a falta de recursos ou de equipamentos não deve ser motivo para não cumprir o previsto na nova legislação.

Foto
Lei Tutelar Educativa foi criada para crianças e jovens entre os 12 e os 16 anos Nelson Garrido

Num balanço global da nova Lei Tutelar Educativa, que entrou neste domingo em vigor, a magistrada do Ministério Público Maria do Carmo Peralta, envolvida na primeira proposta de alteração, diz que estas foram "alterações cirúrgicas". Uma mudança mais ampla e necessária deveria incluir, na legislação, a Saúde Mental e o acompanhamento dos jovens que ficam detidos em centros educativos. "A questão da Saúde Mental nestes miúdos é a coisa mais importante e nós não tivemos capacidade para a propor", diz antes de defender que devia ser avaliada a razão por que "uma imensa percentagem destes jovens têm patologias de natureza psicológica ou psiquiátrica".

Mas esta não é uma área prioritária, sustenta. A delinquência juvenil “não é matéria que interesse às pessoas”, insiste Maria do Carmo Peralta. Tudo o que diga respeito “a crime e a criminosos” é posto à margem, considera a procuradora-geral adjunta do Tribunal da Relação de Lisboa. “Mas essas pessoas somos nós." Por isso, o trabalho da Comissão de Acompanhamento e Fiscalização dos Centros Educativos (na Assembleia da República), que a magistrada coordena desde 2009, passa também por dar a oportunidade aos jovens a cumprir medidas nos centros educativos de viverem “com dignidade”. 

Esses centros, para jovens entre os 12 e os 16 anos que cometem actos qualificados como crimes, foram criados pela Lei Tutelar Educativa (de 1999) que foi agora alterada. A nova lei, que entrou domingo em vigor, introduz como novidade a supervisão intensiva – uma forma próxima da liberdade condicional que permite aos jovens condenados cumprirem metade da medida cautelar numa casa de autonomia, sujeitos a supervisão e a um conjunto de regras. 

Nenhum espaço físico foi criado para esse efeito, mas Maria do Carmo Peralta recusa dizer que, por essa razão, a lei não pode ser cumprida. “As casas de autonomia são criadas na lei. Só têm de ser concretizadas”, diz, esclarecendo que terá de ser o Ministério da Justiça a financiar este apoio logístico.

A nova lei institui o acompanhamento obrigatório do processo do jovem por um familiar, um amigo, ou na ausência de qualquer um destes, uma pessoa da Segurança Social. “Tem de haver alguém responsável por estes miúdos. Se não há pais ou padrinhos, o Estado tem que ser responsável”, defende Maria do Carmo Peralta.

Esta alteração foi uma das principais propostas pela comissão fiscalizadora dos centros educativos, bem como a do cúmulo jurídico. “Deixa de haver uma acumulação e passa a haver uma ponderação da situação em termos integrais”,  à semelhança do que acontece com os adultos, explica. 

Entre outras novidades, resultantes de propostas dos partidos políticos, está agora a possibilidade de qualquer pessoa apresentar queixa de um jovem mesmo quando o crime não é público.  “Na minha perspectiva individual, quanto mais cedo for cessada uma actividade de um miúdo que começa a cometer crimes, melhor.” Por isso, vê aqui vantagens. Mesmo se reconhece como válido o argumento de que se deve evitar o contacto das crianças com o mundo judicial e uma “banalização dos processos”.

A magistrada acredita que mais do que poder vir a motivar uma sobrecarga de inquéritos no Ministério Público, esta é uma medida que obriga a uma responsabilização dos pais ou de quem tem supervisão do jovem logo aos primeiros sinais de que este possa estar a iniciar um percurso de actos que mais tarde lhe serão imputados como crimes. 

Sugerir correcção
Ler 1 comentários