A pressão migratória e os seus perigos

Sem uma verdadeira política europeia para a imigração, os perigos da insegurança cercam o futuro da Europa.

Pensar Lampedusa (Itália), Mellila (Espanha) ou Samos (Grécia) é pensar o futuro coletivo da Europa como a conhecemos e como a concebemos do ponto de vista sociológico: bastião de valores fundamentais como a liberdade, a igualdade e a tolerância.

Este Mar Mediterrâneo é, atualmente, uma ponte em contínuo sobressalto que drena sucessivos milhares de emigrantes. Segundo dados da Frontex 2014, nas três operações que foram levadas a cabo no Mediterrâneo central (“Hermes 2014”, “Triton 2014” e “Aeneas 2014”) foram resgatados mais de 140.000 emigrantes. A estes há que somar os que não foram detetados e os que morreram, dos quais o número real nunca se saberá.

Se há uns anos muitos imigrantes chegavam em pequenos barcos com 20 ou 30 pessoas, oriundos principalmente do Magrebe, hoje vêm em navios, alguns com mais de 600 (!!) pessoas. Neles, traficados e traficantes confundem-se num mesmo destino, a Europa. Na sua esmagadora maioria imigrantes económicos, trata-se de pessoas que procuram um futuro melhor para si e para os seus e que fogem da guerra, da miséria, de perseguições religiosas, étnicas ou sexuais.

São navios negreiros renascidos, navios dos novos escravos, de seres humanos que nasceram no lugar errado, joguetes nas mãos de pessoas sem escrúpulos, nem consideração pela vida humana nem pela dignidade que lhe é devida. É esta a realidade cruel que é preciso assumir.

A Europa, no entanto, não lhe tem dado a devida importância. Olha para este tráfico apenas na perspetiva demográfica e humanitária. Numa lógica de hipocrisia pura, virada para o momento, difere no tempo, de forma conveniente, a questão da segurança enquanto estruturante de uma sociedade livre, democrática e plural.

Matematicamente falando, as pessoas que vão chegando são a parcela em falta para o equilíbrio populacional de estados envelhecidos e ávidos de gente. A oferta de uma mão-de-obra simultaneamente necessária e barata é igualmente conveniente para uma Europa quase estéril.

O problema é que, perante um tão grande número de cidadãos entrados, é impossível identificar conveniente e corretamente a todos. Por isso, a Europa tem estado em grande parte a aceitar como boa a identificação que é declarada... E muitos estão indocumentados. Acresce que nenhuma triagem impeditiva é feita, entra quem quer e não quem a Europa quer. E, consciencializemo-nos, há alguns, para não dizer muitos, que têm motivos menos nobres para querer entrar na Europa.

Esta pressão migratória no sul, em grande parte impulsionada pelo ressurgimento do extremismo religioso em alguns países, é complementada no leste da Europa com novos fenómenos de terrorismo e criminalidade transnacional que têm provocado uma quase ruptura nos serviços de imigração dos países cujas fronteiras externas lidam diariamente com estes fenómenos. As realidades ultrapassam a capacidade de reação destes países e tem sido a Agência Europeia para as Fronteiras Externas (Frontex) que tem procurado, com os meios de que dispõe, gerir as dificuldades.

Sem uma verdadeira política europeia para a imigração, com cada estado a lidar com o problema à sua maneira, sem um corpo europeu de polícia de fronteira, sem a difusão de competências técnicas e operacionais em todo o território, os perigos da insegurança cercam o futuro da Europa. Continuar a deixar a situação tal como ela está, transmitindo a falsa ideia de que está tudo bem, não é de todo sustentável.

É preciso ter consciência do problema real e procurar a solução. Mas, sobretudo, é preciso falar verdade aos cidadãos.

Presidente do Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras – SCIF-SEF

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