Afinal, Portugal não foi o país da zona euro que mais ajudou a Grécia

Os números disponíveis contrariam a ideia defendida por Passos Coelho. Dados da Bloomberg podem ter ajudado à confusão.

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Passos apresentou ontem candidato do PSD/CDS na Amadora
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Passos Coelho DANIEL ROCHA

Portugal está entre os países da zona euro que concederam até agora um menor volume de empréstimos à Grécia, quer em percentagem do PIB, quer levando em conta a dimensão da sua população. Isso acontece pelo facto de Portugal, a partir do momento em que lhe foi aplicado também um programa da troika, ter ficado dispensado dos custos associados à ajuda financeira à Grécia.

Os números disponíveis parecem, assim, contrariar a ideia defendida por Pedro Passos Coelho esta quinta-feira de que Portugal é “de longe o país dentro da União Europeia que, em percentagem do seu produto, maior esforço fez de apoio e solidariedade em relação à Grécia”.

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A confusão pode ter acontecido na sequência de dados publicados por um economista da Bloomberg sobre o grau de exposição de cada país da zona euro à dívida grega. Maxime Sbaihi calculou, em contas reproduzidas por alguns meios de comunicação social nacionais, que o Estado português tinha uma exposição à dívida pública grega de 5,5 mil milhões de euros. Este valor representa cerca de 3,2% do PIB e superaria assim os 2,8% registados por Chipre e os 2,5% de Eslovénia, Malta e Espanha.

O problema com estes números de Portugal é que apenas parecem ser possíveis de atingir se, para além dos empréstimos bilaterais que foram concedidos pelos países do euro à Grécia logo no início da crise, da quota parte da exposição do BCE à Grécia e da quota parte da exposição do FMI, tiverem sido também considerados encargos de Portugal com os empréstimos concedidos pelo Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF).

Mas, tal como confirmou ao PÚBLICO o porta-voz desta instituição, Portugal não teve de contribuir com qualquer transferência ou garantia para o FEEF. Por uma razão simples: por essa altura, Portugal também iria passar a receber os seus próprios empréstimos, na sequência da chegada da troika ao país. Isso aconteceu igualmente com a Irlanda e Chipre, para além, é claro, da Grécia.

Portugal contribuiu sim, num montante próximo de 1100 milhões de euros com empréstimos bilaterais à Grécia, logo na fase inicial da crise, quando a falta de instituições próprias para os apoios financeiros de emergências, a zona euro optou por financiar a Grécia através de créditos concedidos por cada um dos países. Portugal está ainda, de acordo com as quotas que tem nas respectivas instituições, exposto ao risco que é assumido pelo BCE (ao emprestar dinheiro ao Banco da Grécia e ao próprio Estado grego) e pelo FMI.

Um cálculo da exposição de cada país da zona euro, publicado em Janeiro pelo director da IESEG School of Management, Eric Dor, chega a números bastante diferentes dos de Maxime Sbaihi. Neste caso, que não inclui os empréstimos do FMI, Portugal tem uma exposição total de 2676 milhões de euros (1106 milhões dos empréstimos bilaterais e 1574 milhões relacionados com o BCE), o que representa 1,5% do PIB. 

Este valor supera apenas o de quatro outros países na zona euro: Luxemburgo, Chipre, Letónia e Irlanda. E fica consideravelmente abaixo dos 3,4% da Eslovénia, 3% da Espanha e Itália, 2,5% da França e 2,4% da Alemanha.

Quando se leva em conta as paridades do poderes de compra (assumindo que custa mais a Portugal emprestar um euro do que aos países mais ricos), as diferenças esbatem-se em relação às maiores potências europeias. Ainda assim, o peso é de 1,7% do PIB em Portugal, contra 3,2% em Espanha, 2,9% em Itália e 2,2% na França e na Alemanha.

A exposição por pessoa à Grécia é de 257,5 euros em Portugal, contra, por exemplo, 715 euros em Espanha ou 882,4 euros na Alemanha.

Se se levasse em conta os empréstimos do FMI, os números seriam mais altos, mas não apenas para Portugal, já que todos os países da zona euro fazem também parte da estrutura accionista do Fundo.

As declarações do primeiro-ministro surgiram como resposta à carta subscrita por 32 personalidades que defendem ser “contraproducente” a forma como o governo português tem gerido o debate europeu em relação à Grécia. “Tive a ocasião de ler a carta. Ela parte de um equívoco. Portugal é de longe o país dentro da União Europeia que, em percentagem do seu produto, maior esforço fez de apoio e solidariedade em relação à Grécia”, afirmou Passos Coelho.

Não foi possível obter junto do gabinete do primeiro ministro qualquer resposta sobre quais os dados usados para sustentar esta afirmação.

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