Ex-presidente do Coliseu do Porto avisa que sala "pode ter os dias contados"

Ex-responsável receia impacto da eventual concessão do pavilhão Rosa Mota à produtora Música no Coração, gestora do antigo Pavilhão Atlântico

Foto
O coliseu do porto é gerido, desde 1995, pela associação dos Amigos do Coliseu Nelson Garrido

O ex-presidente do Coliseu do Porto alertou nesta sexta-feira que o espaço "pode ter os dias contados" se a concessão do Pavilhão Rosa Mota for entregue aos operadores privados que gerem "a maior arena multiusos do país, em Lisboa".

Numa declaração escrita enviada à Lusa, José António Barros referiu-se desta forma às declarações feitas na quinta-feira pelo vereador do PSD na Câmara do Porto, Ricardo Almeida, que, na sua perspectiva, deram a entender que o "Rosa Mota" vai ser concessionado à produtora Música no Coração, de Luís Montez, gestora do antigo Pavilhão Atlântico (actual MEO Arena).

"A confirmar-se o cenário avançado pelo vereador da Câmara do Porto Ricardo Almeida, segundo o qual a concessão do Pavilhão Rosa Mota poderá ser entregue a operadores privados - que, ao que consta, exploram já a maior arena multiusos do país, em Lisboa -, o Coliseu do Porto estará seriamente ameaçado", afirma o ex-presidente da Associação Amigos do Coliseu (AACP), que ocupou o cargo durante 18 anos, até Setembro de 2014, sempre a título gratuito.

"Se for para ali [no Pavilhão Rosa Mota] instalar um centro de congressos, predominantemente, corresponde a uma necessidade. Se for, como antecipa o vereador Ricardo Almeida - que estará na posse, com certeza, de informações de que não disponho -, para uma arena, ainda que em versão revista e adaptada, parecida com a que existe em Lisboa, então o Coliseu poderá ter os dias contados. E não foi para isso, com toda a certeza, que há 20 anos os portuenses saíram à rua e a cidade gritou, em uníssono, "O Coliseu é nosso!", lamenta José António Barros.

Barros alertou ainda que as alterações estatutárias da instituição incluem, para além da remuneração da direcção, um aumento de 100% das quotas dos associados individuais sem actualização dos valores pagos pelos sócios colectivos e institucionais.

"Não se entende facilmente que os sócios colectivos de referência da Associação Amigos do Coliseu (AACP) - a Câmara do Porto, a Área Metropolitana do Porto e a Secretaria de Estado da Cultura - estejam a equacionar as alterações estatutárias" que abrangem, "nomeadamente, o aumento de 100% do valor das quotas pagas por mais de 90% dos cerca de 2.500 associados da AACP (os individuais)".

Barros nota que a mudança esteve para ser apreciada numa assembleia-geral de 30 de Janeiro e que a proposta que não previa "quaisquer actualizações as quotas dos associados institucionais ou colectivos, entre os quais aquelas três entidades, assim como o exercício remunerado de cargos de direcção, no âmbito de uma mudança estratégica que, alegadamente, privilegia a profissionalização da gestão".

"Se o desfecho for aquele que o vereador Ricardo Almeida projectou, não se entende facilmente que os sócios colectivos de referência da AACP - Câmara do Porto, Área Metropolitana do Porto e Secretaria de Estado da Cultura - estejam a equacionar as alterações estatutárias que estiveram para ser apreciadas na assembleia geral que esteve marcada para o passado dia 30 de Janeiro", escreve José António Barros.

"É o caso, nomeadamente, do aumento de 100% do valor das quotas pagas por mais de 90% dos cerca de 2500 associados da AACP (os individuais), ao passo que não sofrem quaisquer actualizações as quotas dos associados institucionais ou colectivos, entre os quais aquelas três entidades, assim como o exercício remunerado de cargos de direcção, no âmbito de uma mudança estratégica que alegadamente, privilegia a profissionalização da gestão", acrescenta.

Relativamente à concessão do "Rosa Mota", José António Barros nota que "a cidade e a região, infelizmente, não estão ainda em condições de assegurar a sustentabilidade de duas salas de espectáculos com dimensão e características idênticas ao Coliseu do Porto".

"Se, em consequência, o Coliseu reduzir a sua programação própria e viver predominantemente de formatos artísticos e espectáculos produzidos externamente, mais dificuldades terá em competir num mercado relativamente fechado e concorrencialmente débil, tendo como principal operador uma entidade que explora os maiores espaços para eventos e espectáculos em Lisboa e no Porto, simultaneamente", destaca o ex-responsável.

Para José António Barros, o que está em causa actualmente "é a estratégia cultural que se quer para a cidade e a importância que os poderes públicos atribuem ao turismo de negócios na afirmação global da marca territorial Porto".

"Nesse contexto, a existência de um verdadeiro centro de congressos na cidade, capaz de potenciar as dinâmicas urbanas que a têm ajudado a revivificar e de alargar os fluxos turísticos, esbatendo os efeitos de uma certa sazonalidade que continua a existir, parece ser estruturante e cada vez mais incontornável", defende.

O vereador do PSD na Câmara do Porto, Ricardo Almeida, disse na quinta-feira à Lusa querer saber qual o modelo de gestão do Coliseu da cidade, questionando que "quase metade do mecenato da Misericórdia" àquele espaço seja "para pagar o ordenado" do seu presidente.

"Não se percebe que, quando a Santa Casa da Misericórdia [de Lisboa] dá 100 mil euros de mecenato [ao Coliseu do Porto], cerca de metade [desse valor] seja consumido no ordenado de uma pessoa", observou.

A Associação Amigos do Coliseu (AAC) agendou para 06 de março uma assembleia-geral para debater a alteração dos estatutos, nomeadamente remuneratórios, estando em causa a possibilidade de o seu presidente, Eduardo Paz Barroso, passar a ser remunerado com 2.800 euros mensais tendo em vista o objectivo de profissionalizar a gestão do espaço cultural.

"Para ter um presidente executivo com remuneração, é porque há um plano e um novo modelo de gestão que o justifica. Mas esse modelo é desconhecido. O Coliseu está sem qualquer tipo de programação", alertou Ricardo Almeida.

O vereador destacou ainda a "concorrência directa" nas áreas do "entretenimento e da música" que o Coliseu do Porto vai ter com o Palácio de Cristal, cuja concessão está em curso.

"Se os municípios têm uma estratégia para o Coliseu, presumo que seja antagónica, porque o Palácio vai ser concessionado. Devemos concorrer com outras cidades do mundo, não com equipamentos na mesma cidade", vincou.

Para Ricardo Almeida, a remuneração do presidente do Coliseu "pode fazer sentido, se houver uma gestão diferente" da actual, ou seja, se aquele espaço "passar a ter programação própria" em vez de servir como sala de acolhimento de "espectáculos comerciais".

"Mas não sei se é isso que está em cima da mesa", destacou.

A Câmara do Porto esclareceu na quarta-feira que a alteração dos estatutos da AACP, nomeadamente da remuneração do presidente, pretende profissionalizar a gestão do espaço e é da autoria dos seus três principais associados, o Conselho Metropolitano do Porto (CmP), o secretário de Estado da Cultura e a autarquia.

Numa resposta escrita enviada no mesmo dia à Lusa, o CmP esclareceu que "de acordo com a ordem de trabalhos da última reunião [?] foi apresentada uma proposta para a alteração dos estatutos remuneratórios dos atuais órgãos sociais do Coliseu do Porto".

Por entender não ter "informação necessária sobre o assunto, o CmP decidiu solicitar mais esclarecimentos e reservar para data a definir uma decisão final", acrescentou fonte daquele organismo.

A entrada de Paz Barroso no Coliseu do Porto coincidiu com o anúncio de que a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, presidida por Pedro Santana Lopes, iria apoiar, ainda em 2014, aquele espaço com cem mil euros.

Santana Lopes mostrou disponibilidade para renovar o apoio de cem mil euros em 2015 se "os parceiros" também aumentassem a participação financeira.

Na sexta-feira, no fim de uma reunião do CmP, o presidente daquele órgão, Hermínio Loureiro, afirmou que a AMP estava disponível para o fazer, desde que "cumprindo a legislação".

Sugerir correcção
Comentar