Morreu Don Covay, figura da soul, um músico de músicos

Intérprete de Mercy, mercy e autor de Chain of fools, um clássico de Aretha Franklin, morreu a 30 de Janeiro aos 76 anos, revelou esta a família esta quarta-feira.

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Gravou canções de sucesso, como Mercy, mercy, mas seriam canções suas interpretadas por outros, como os Rolling Stones ou Aretha Franklin, que o tornaram uma figura histórica da soul DR

Era, de certa forma, aquilo que normalmente se designa como “um músico de músicos”. Ou seja, alguém que reúne o consenso e admiração entre os seus pares, mas que recolhe o reconhecimento público equivalente. Ainda assim Don Covay, que morreu a 30 de Janeiro aos 76 anos, revelou a família esta quarta-feira, foi um “um músico de músicos” especial.

Mercy, mercy, cantada por ele, foi um êxito em 1964, tal como See saw. Mas foram as canções que compôs e que outros interpretaram, como Chain of fools, por Aretha Franklin, que o tornaram um nome de destaque na história da soul e do rhythm’n’blues.

Nascido Donald Randolph em Orangeburg, na Carolina do Sul, começou por cantar no quarteto gospel da família, os Cherry Keys. Nessa altura estava já em Washington, cidade para onde se mudara após a morte do pai, um pastor baptista (Don tinha oito anos quando o pai morreu).

O início da sua carreira começaria verdadeiramente quando integra os Rainbows, grupo em cuja formação encontrávamos ocasionalmente Marvin Gaye. Seria o primeiro encontro com a aristocracia soul e rock’n’roll de que se veria rodeado nas décadas seguintes. Em 1957, integrava a digressão de Little Richard, actuando como cantor na abertura dos concertos e servindo, ao mesmo tempo, de motorista do cantor de Tutti frutti. O sucesso surgiria em 1961, quando, já na Columbia, grava Pony time. Com ela, atingiu o número 60 da tabela da Billboard. Quando Chubby Checker, o “rei do twist”, a regravou, o resultado foi substancialmente diferente: n.º 1. Um padrão que se manteria ao longo dos anos.

Decidido a melhorar os seus talentos, tornou-se um dos compositores com escritório no famoso Brill Building em Nova Iorque. Dali ofereceu êxitos a Solomon Burke, Gladys Knight & The Pips ou Wilson Pickett. Ainda ali, gravou Mercy mercy, que se tornaria a sua canção-assinatura (na gravação, participa um ainda desconhecido Jimi Hendrix). Ainda assim, muitos recordarão não a sua versão original, mas aquela que os Rolling Stones gravaram no álbum Out of Our Heads – ouvir Mick Jagger replicar com exactidão o tom e a cadência de Covay é prova da influência que o cantor de Orangeburg exerceu sobre o londrino.

Em 1965 chegou See-saw, co-composta com Steve Cropper, guitarrista dos Booker T & The MGs, que se tornaria o seu segundo grande momento, e Sookie sookie – esta, mais uma vez, tornar-se-ia mais célebre, por exemplo, na versão dos Steppenwolf. Três anos depois, em 1968, ofereceria a Aretha Franklin a canção que colocaríamos no topo dos seus talentos enquanto compositor, Chain of fools. Diz-se que a escreveu com Otis Redding em mente, mas hoje não conseguimos imaginá-la noutra voz que a de Franklin.

Duas superbandas falhadas depois (os Soul Clan, com Solomon Burke, Joe Tex, Ben E. King e Arthur Conley; e os Jefferson Lemon Blues Band, com Joe Richardson e John Hammond), Don Covay recolhia aos bastidores e transformava-se em A&R (Artistas e Repertório) da Mercury Records. Paralelamente gravou o álbum Superdude em 1972 e, em 1974, teve os seus últimos singles de algum impacto, It’s better to have (and don’t need), e Rumble in the jungle, inspirado no histórico combate no Zaire, hoje República Popular do Congo, entre Muhammad Ali e George Foreman.

Depois de vários anos afastado dos estúdios, encontrámo-lo em 1986 junto a cinco dos seus mais célebres fãs, os Rolling Stones, gravando segundas vozes no álbum Dirty Work. Seis anos depois, sofreu uma trombose cujas sequelas o deixaram fragilizado para o resto da vida. O seu último álbum, Adlib, foi editado em 2000. O músico dos músicos gravou-o rodeado deles: Wilson Pickett, Otis Clay, Syl Johnson, Huey Lewis ou Paul Rodgers foram alguns dos que se juntaram a ele em homenagem.

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