A situação da PT e os reflexos na Engenharia portuguesa

Um negócio que não produz nada além do dinheiro é um negócio pobre” (Henry Ford).

Esta citação vem a propósito da nossa preocupação face a desenvolvimentos recentes em empresas de referência, por constituírem um risco elevado para a perda de competências que o país, designadamente em termos de inovação e competitividade, foi adquirindo e valorizando.

Todos temos consciência que a competitividade e a produtividade da nossa economia pressupõem a adoção de iniciativas que apelem a e estimulem um clima favorável à valorização da tecnologia e da Engenharia. Este aspeto é tanto mais importante quanto o número de empresas que têm produzido inovação é bastante reduzido, face ao desejável para tornar o país competitivo.

É o caso da Portugal Telecom (PT), criada em 1994, em resultado da fusão da Telecom Portugal, dos Telefones de Lisboa e Porto e da Teledifusora de Portugal. A sua história está ligada a todo o percurso de desenvolvimento das telecomunicações de Portugal, história que não se esgota no seu próprio espólio, mas que os recentes acontecimentos podem pôr em risco.

Trata-se de uma das maiores empresas portuguesas e a primeira de dimensão internacional, sendo a que mais investiu em tecnologia e investigação no nosso país, na sequência de uma aposta concertada, concebida e desenvolvida por engenheiros portugueses.

Durante décadas afirmou-se como um espaço de desenvolvimento e progresso, incorporando o que de mais avançado e inovador se ia desenvolvendo por todo o mundo.

A grande impulsionadora deste sucesso foi, sem dúvida, a PT Inovação e Sistemas, empresa tecnológica do Grupo PT, que se focou no desenvolvimento de produtos e serviços inovadores para o mercado das telecomunicações.

A PT Inovação e Sistemas, fruto do seu investimento no centro tecnológico de Aveiro, assumiu papel de liderança em áreas de tecnologia de ponta no domínio das comunicações, tecnologia mobilizadora da investigação em parceria com universidades e centros tecnológicos e, em particular, com a Universidade de Aveiro, atividade que arrastou outras empresas.

Em resultado das confusões e inexplicáveis decisões de gestão, bem caracterizadas num artigo de um jornal diário português sob o título de “Os acionistas de referência da PT e os seus gestores têm seguido a regra do ‘vale tudo’", foi perdendo valor.

Muito previsivelmente, em resultado destas decisões relativamente recentes, há o risco de a sua alineação e compra, recentemente materializada, se cingir a negócio estritamente financeiro e, em consequência, o centro de competências poder deixar de estar onde sempre esteve, com riscos elevados em termos de rotura da sua capacidade altamente prestigiada e reconhecida em termos de inovação tecnológica.

O desaparecimento de empresas nacionais “âncora”, de dimensão internacional, com “massa crítica” e escala capazes de incorporar a inovação e de promover uma evolução tecnológica, funcionando como “escolas de inovação”, vai afetar a capacidade do país na implementação da “economia do conhecimento”, baseada na produção de bens de valor acrescentado, em contraponto a uma “economia virtual”, imposta e controlada por interesses puramente financeiros, à revelia dos interesses nacionais. Veja-se, a este propósito, o que aconteceu com a Cimpor. Situação que nos deveria ter deixado alguns ensinamentos.

O risco de que todo este processo não salvaguarde o historial e a capacidade técnica e de inovação da PT Inovação e Sistemas é altamente preocupante para a Engenharia portuguesa e, consequentemente, para atingir mais-valias competitivas essenciais ao crescimento económico do país.

Bastonário da Ordem dos Engenheiros

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