Tribunal diz que não foi o livro de Gonçalo Amaral que “destruiu” pais de Maddie

Casal McCann moveu uma acção cível contra o ex-inspector por difamação e danos causados pela publicação do livro. Exigem uma indemnização de 1,2 milhões de euros.

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Os pais de Maddie chegaram a ser constituídos arguidos no inquérito ao desaparecimento da menina FRANCISCO LEONG/AFP

O Tribunal Cível de Lisboa considerou esta quarta-feira que não foi o livro de Gonçalo Amaral Maddie: A Verdade da Mentira que “destruiu” os pais da menina inglesa desaparecida a 3 de Maio de 2007, no Algarve.

“Não foi feita prova de que Kate e Gerry MacCann se encontrem destruídos dos pontos de vista moral, social e ético. Do ponto de vista familiar a prova revelou um esforço bem-sucedido de coesão e entreajuda”, refere a juíza que salienta até que “do ponto de vista sentimental/emocional não é credível que as sequelas dos factos destes autos vão ao ponto da destruição ou muito além da dor provocada pelo desaparecimento da filha”.

O estado “emocional negativo” dos pais é “pré-existente ao livro”, lê-se no despacho judicial ao qual o PÚBLICO teve acesso e que indica a reposta aos quesitos, os factos dados como provados e não provados, antes da sentença, no processo cível do casal contra o ex-inspector da PJ. O casal exige uma indemnização de 1,2 milhões de euros por difamação e danos causados pela publicação do livro.

A juíza dá como não provados os danos de natureza social que os McCann alegavam ter sofrido também com a divulgação e venda de um documentário em DVD e uma entrevista do ex-coordenador da PJ de Portimão. No livro, Amaral defende o suposto envolvimento de Kate e Gerry MCann no desaparecimento e na ocultação do cadáver da criança.

“Face a este despacho do tribunal no qual não é dado como provado qualquer nexo de causalidade entre o livro e supostos prejuízos para o casal não espero outra coisa que não a absolvição de Gonçalo Amaral”, disse ao PÚBLICO o advogado do ex-inspector, Miguel Cruz Rodrigues. O PÚBLICO tentou sem sucesso contactar a advogado do casal, Isabel Duarte. Gonçalo Amaral não quis comentar.

O tribunal não deixou, porém, de dar como provado que “em consequência das afirmações do réu Gonçalo Amaral no livro, no documentário e na entrevista”, os pais de Maddie “sentiram raiva, desespero, angústia e preocupação, tendo sofrido insónias e falta de apetite”. Isto ao mesmo tempo que foi dado como provado que os factos que o ex-inspector menciona no livro “são, na maioria, factos ocorridos e documentados” na investigação criminal.

O despacho judicial menciona ainda as várias testemunhas inquiridas pelo tribunal, algumas indicadas pelos pais de Maddie MacCann e que sublinham danos causados que acreditam o casal sofreu. “Muita gente se virou de costas para eles” depois da publicação do livro, disse Susan Lorrain Hubbard, casada com um pastor anglicano e amiga dos McCann. Também Alan Robert Pike, que prestou serviços na área da psicologia ao casal inglês, “declarou que a publicação do livro e as conclusões do mesmo deixaram o casal angustiado e que um dos efeitos mais devastadores foi, para eles, acreditarem que o livro ia influenciar a opinião pública, fazendo com que as pessoas deixassem de procurar Madeleine”.

Contudo, o tribunal dá como não provado que por causa do livro, da entrevista e do documentário a PJ deixou de recolher informação e de investigar o desaparecimento. O tribunal ouviu ainda inspectores da PJ. Ricardo Paiva, inspector que participou na inquérito ao desaparecimento da menina inglesa, sublinhou que a “morte da criança era uma hipótese na investigação”. Também o director da Unidade Nacional de Contra-Terrorismo, Luís Neves destacou que “a primeira vez que foi colocada a hipótese de morte foi pelos pais ao sugerirem a vinda de um especialista sul-africano equipado com uma máquina para procurar corpos enterrados”.   

O tribunal sublinha ainda que para a “maioria das pessoas” que leu o livro a tese lá plasmada não passa por atribuir “responsabilidades” aos McCann pela morte da filha, “mas antes que os mesmos tiveram “responsabilidades pela ocultação do seu cadáver”.

Os pais de Maddie chegaram a ser constituídos arguidos no inquérito ao desaparecimento da menina inglesa que foi arquivado em 2008 por falta de provas de que tenha ocorrido um crime. O inquérito foi reaberto em Outubro de 2013 na sequência de uma proposta da PJ e face a novos elementos indiciários que justificaram o prosseguimento da investigação.

Notícia actualizada às 22h08. Substituiu artigo da Agência Lusa com o título "Tribunal dá como provado danos causados por Gonçalo Amaral a Kate e Gerry McCan" por notícia do PÚBLICO

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