Há três músicos que jogam em casa no Ano Alemanha

Florian Petzborn, Alexander Auer e Dawid Seidenberg são os três músicos alemães da Orquestra Sinfónica do Porto. Admitem que vão sentir-se “mais em casa”, este ano, na Casa da Música, que vai ter como compositor residente um clássico da música contemporânea alemã, Helmut Lachenmann.

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Os três músicos alemães da Orquestra Sinfónica do Porto. Da esquerda para a direita: Seidenberg, Petzborn e Auer Maria João Gala
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Helmut Lachenmann, é o compositor residente este ano na Casa da Música Maria João Gala
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Pedro Burmester Maria João Gala
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Ao longo do ano, Pedro Burmester vai interpretar na Casa da Música a integral dos concertos de Beethoven Maria João Gala
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Helmut Lachenmann Maria João Gala
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Florian Petzborn Maria João Gala
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Alexander Auer Maria João Gala
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Dawid Seidenberg Maria João Gala

Há uma voz alemã no Coro, mas que não integra o quadro da formação, e uma flautista no Remix Ensemble que também tem origem alemã, mas nasceu já em Lisboa. Cabe, pois, a estes três músicos a responsabilidade de “defender as cores” do seu país neste ano em que a Alemanha é o país-tema na Casa da Música.

Florian Petzborn (n. Hanôver, 1961), contrabaixista, Alexander Auer (n. Estugarda, 1972), flautista, e Dawid Seidenberg (n. Erfürt, 1977), trombonista, são os três músicos alemães da Orquestra Sinfónica do Porto. Imaginar-se-ia que do país tido como pátria da música erudita pudesse haver mais representantes  nos 150 intérpretes distribuídos pelas quatros formações da Casa. Mas a “delegação” está, este ano, reforçada pelas presenças de Helmut Lachenmann (n. Estugarda, 1935), o compositor em residência, e do cravista Andreas Staier (n. Göttingen, 1955), artista em associação.

Os três músicos da sinfónica coincidem em considerar que o seu país estar em 2015 em foco no Porto não lhes atribui nenhuma responsabilidade acrescida. Afinal, “a música é universal, não tem fronteiras”. Mas Florian admite que vai sentir-se “mais em casa” do que o costume. Mesmo se considera já o Porto a sua casa.

O contrabaixista é um dos mais antigos músicos da orquestra, onde chegou em 1989 para a Régie Sinfonia Cooperativa, que substituiu a Orquestra Sinfónica do Conservatório de Música do Porto fundada em 1947. “Sou da geração mais antiga” — os dois compatriotas chamam-lhe “o velhote” —, “e posso mesmo dizer que já tenho mais raízes aqui do que na Alemanha”, nota Florian, casado com uma portuguesa e com três filhos, todos nascidos no Porto. Diz-se “alemão, portuense e europeu”.

Alex Auer chegou à Orquestra do Porto noutro momento forte da sua história — 2001, ano da Capital Europeia da Cultura, que teve na Casa da Música e na formação que depois viria a residir nela a principal aposta. Com formação em várias universidades alemãs, veio fazer audições ao Porto, e ficou. “Fui muito bem recebido, menos pelo clima, pois lembro-me que choveu sem parar nesse Março”, graceja o flautista, que é casado com uma colega da orquestra, italiana. Está também já rendido ao Porto, à cidade e à gastronomia, e não perde uma oportunidade de ir almoçar ao Buraco, na Baixa.

Dawid Seidenberg é o mais novo dos três e o que chegou mais tarde. Entrou na orquestra em 2002, depois de ter sido músico convidado para dois concertos. “Eu queria viver num país com bom vinho tinto”, ri-se o trombonista, que nasceu e cresceu na Alemanha Oriental. Com origem numa família de músicos — os pais e mais sete irmãos —, Dawid dá uma explicação curiosa para ter escolhido esta profissão. “Além de ser uma coisa normal na família, e de quase ter sido forçado, pelo meu pai, a aprender um instrumento, nessa altura — era ainda o tempo do comunismo —, a música e o desporto surgiam como a única possibilidade de virmos a conhecer o mundo”, diz, lembrando que à restante população só era então permitido “ir até à Rússia”.

Sobre a importância do seu país na história da música, todos admitem que o Ano Alemanha vai trazer novos desafios, mas que não serão especialmente diferentes daqueles que enfrentam no seu trabalho normal. “Sinto sempre a responsabilidade de dar o meu melhor enquanto músico, independentemente da proveniência da música”, diz Florian, mesmo se admite que interpretar compositores alemães lhe traz algum “sentimento de proximidade”.

Um dos desafios que estes músicos — e os das outras formações, principalmente do Remix — vão enfrentar é tocar as obras de Helmut Lachenmann, quase a fazer 80 anos, uma das grandes referências da música contemporânea, associado ao movimento da música concreta. Os três vêem nele “um clássico da música contemporânea alemã”. Alex Auer, que o conhece desde os tempos de estudante em Estugarda, diz que Lachenmann “tem uma linguagem um bocadinho específica”, que não é fácil de apreciar ao primeiro contacto. “É preciso ouvi-la para se gostar”.

Na quarta-feira, enquanto a sinfónica ia ensaiando o concerto desta sexta-feira, que inaugura o Ano Alemanha, Helmut Lachenmann passeava-se no “labirinto” do edifício de Rem Koolhaas. As três formações da Casa vão tocar, ao longo do fim-de-semana, quatro peças suas: Schreiben, ...Zwei Gefühle..., Musik mit Leonardo, Mouvement (— vor der Erstarrung) e Consolations II. As duas do meio serão interpretadas pelo Remix, que Lachenmann já conhece de concertos anteriores com peças suas, em 2007, e que elogia dizendo que “os músicos assumem a ideia de aventura e ao mesmo tempo de grande responsabilidade”. “Os responsáveis pela Cultura em Portugal não podem deixar cair o Remix, se não a arte torna-se um museu, e um museu é o cemitério”, diz o compositor, que regressará à Casa da Música para novos concertos em Outubro e Dezembro.

O espectáculo de sexta-feira à noite marca também o início da integral dos Concertos para piano de Beethoven (começa com o nº 4), que Pedro Burmester vai interpretar ao longo do ano. A Casa da Música acaba, aliás, de editar o disco com a gravação do recital que o pianista deu na Sala Suggia em Dezembro de 2013, a sua primeira actuação na instituição de que foi o principal impulsionador.

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