Veterano do antigo regime é o novo Presidente da Tunísia
Líder do partido mais votado nas legislativas vai ser chefe de Estado. Islamistas temem regresso da repressão.
Béji Caïd Essebsi, líder de um partido que junta caciques do antigo regime e membros da extrema-esquerda, venceu as eleições presidenciais de domingo, derrotando o Presidente cessante, Moncef Marzouki, ex-activista dos direitos humanos e opositor histórico da ditadura que se apresentou como garante da revolução e contou com o apoio de muitos militantes do Ennahda, o partido de islamistas moderados, que não apresentou candidato.
Essebsi, que obteve 55,68% e 1,7 milhões de votos contra 44,32% (1,3 milhões) de Marzouki, já tinha reivindicado a vitórias antes do anúncio dos resultados, num gesto repudiado pelo seu rival. O Nidaa Tounès, de Essebsi, foi a formação mais votada nas legislativas de Outubro, elegendo 86 deputados numa Assembleia de Representantes do Povo com 217 lugares.
Mal os media tunisinos começaram a avançar com resultados das presidenciais, ainda no domingo à noite, houve confrontos entre habitantes e a polícia na localidade de Hamma, no Sul, onde nasceu o líder do Ennahda, Rached Ghannouchi. Muitas correntes do Nidaa Tounès defendem uma repressão sem tréguas aos islamistas e estes temem o regresso das perseguições que enfrentaram durante a ditadura.
“Entre 300 e 400 manifestantes incendiaram pneus e tentaram atacar uma esquadra com pedras. As forças da ordem ripostaram com gás lacrimogéneo”, afirmou o porta-voz do Ministério do Interior, Mohamed Ali Aroui. “Marzouki já disse que se vai conformar com os resultados anunciados pela instância [eleitoral]. Querem ser mais papistas do que o Papa?”, reagiu Ghannouchi, pedindo aos habitantes que “regressem às suas casas” e apelando aos candidatos para aceitarem os resultados oficiais.
Marzouki tinha sido escolhido pela assembleia eleita no fim de 2011, e dominada pelo Ennahda. Essebsi torna-se assim no primeiro chefe de Estado eleito pelos cidadãos numa votação livre e democrática.
Apesar da tensão, e dos enormes desafios económicos e de segurança que a Tunísia enfrenta, imprensa e políticos congratularam-se pela forma como decorreram as eleições que, formalmente, põem fim ao período de transição para a democracia – primeira das revoluções da chamada Primavera árabe, a tunisina foi a única que seguiu o caminho traçado em 2011. Laurent Fabius, ministro dos Negócios Estrangeiros francês, saudou o “bom desenrolar da eleição”, afirmando que “ao ultrapassar esta grande etapa, a Tunísia confirma um papel histórico que lhe pertence”.
Ao abrigo da Constituição adoptada em Fevereiro, o Presidente goza agora de prerrogativas limitadas, tendo o essencial do poder executivo sido transferido para o Governo. A principal prioridade prende-se, por isso, com a formação do novo executivo que, segundo o primeiro-ministro cessante, Mehdi Jomaa, deverá entrar em funções ainda durante o mês de Fevereiro.
O Nidaa Tounès precisa de encontrar aliados para garantir maioria no Parlamento, não sendo certo se chegará a um entendimento com o Ennahda, visto como essencial para a estabilidade do país, mas difícil de selar dadas as rivalidades entre os dois partidos.