Dinheiro russo vai financiar próximos meses de campanha de Marine Le Pen

Frente Nacional obteve empréstimo de banco de Moscovo para financiar campanhas eleitorais. Congresso do partido de extrema-direita francês é neste fim-de-semana.

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“O facto de contrairmos um empréstimo iria determinar a nossa posição internacional? Mas já há muito tempo que defendemos uma linha pró-russa”, diz a líder da FN KENZO TRIBOUILLARD/AFP

O partido de Marine Le Pen obteve um empréstimo de nove milhões de euros de um banco russo, alegadamente por não conseguir financiamento junto de nenhum outro banco francês nem europeu. É mais uma prova das ligações ao Kremlin da Frente Nacional (FN), partido francês de extrema-direita? “Ridículo”, responde Marine Le Pen, quando confrontada pelos media franceses com estas suspeitas.

“O facto de contrairmos um empréstimo iria determinar a nossa posição internacional? Mas já há muito tempo que defendemos uma linha pró-russa”, diz a líder da FN, quando interrogada pelo Le Monde. Mas, quando o caso é visto de Moscovo, não se imagina que um banco russo conceda um empréstimo a um partido da Europa Ocidental sem ter tido o aval do Kremlin, sublinha o diário francês.

“O que é escandaloso é que os bancos franceses não nos emprestem dinheiro”, afirma Marine Le Pen, obrigada a defender-se na semana antes do congresso anual da FN, que decorre neste fim-de-semana.

“Com as eleições para os departamentos dentro de quatro meses, e as regionais no fim de 2015, precisamos de 30 milhões de euros. Temos urgência! Só temos cinco milhões de euros de subvenções por ano e já não temos mais bens imóveis para vender. Somos obrigados a pedir empréstimos, a bancos franceses ou estrangeiros”, justificou. “Tentámos em todo o lado: Espanha, Itália, Estados Unidos, Ásia e Rússia. Assinámos com o primeiro que disse sim, e estamos muito satisfeitos”, afirmou a líder do partido de extrema-direita e anti-União Europeia.

Marine Le Pen assegura que o empréstimo contraído junto do First Czech-Russian Bank – que foi fundado na República Checa em 1966, mas agora tem sede na Rússia – é perfeitamente legal. O mesmo afirmou o tesoureiro e advogado do partido, Wallerand de Saint-Just. “Já andávamos à procura de um empréstimo há algum tempo, para financiar as campanhas eleitorais. Mas o nosso banco – a Société Générale –, tal como a maioria das instituições financeiras europeias, recusou-se categoricamente a dar um cêntimo que seja à FN ou aos candidatos da FN”, disse à televisão France 24.

“Pedir empréstimos a russos não há-de ser pior do que pedir dinheiro a Muammar Khadafi”, disse ao site Mediapart – que divulgou a notícia pela primeira vez – Christian Bouchet, da FN, numa cotovelada nada subtil ao ex-Presidente Nicolas Sarkozy, que está a ser investigado por suspeita de ter recebido dinheiro do falecido líder líbio para financiar a sua campanha eleitoral de 2007.

Influência do Kremlin?
Mas não é a primeira vez que o financiamento da Frente Nacional levanta suspeitas. Neste momento, está a ser investigado um grupo criado por Marine Le Pen, denominado Jeanne, em homenagem a Joana D’Arc, precisamente devido a empréstimos suspeitos concedidos a candidatos da FN.

O facto de o novo empréstimo ser proveniente de um banco russo suscita suspeitas de que o Kremlin esteja a influenciar de forma indevida a política francesa e europeia, dando mais fôlego a um partido de extrema-direita que está a obter óptimos resultados eleitorais – como em Março, quando conquistou a presidência de 14 municípios com mais de 9000 habitantes.

Os laços da Frente Nacional francesa com a Rússia são antigos – remontam aos anos 1960, ao tempo do pai de Marine, Jean-Marie Le Pen, recordou a revista L’Obs (a Nouvel Observateur, que agora tem um nome mais curto), quando ela era ainda bebé. Mas a actual líder da FN tem-se esforçado por os cultivar. Além de várias viagens a Moscovo, e encontros com políticos importantes da hierarquia russa, não perde uma oportunidade de expressar a sua admiração por Vladimir Putin.

Por outro lado, o Kremlin procura laços alternativos em Paris – uma vez que as relações diplomáticas com a França se degradaram com a chegada à presidência de François Hollande, que começou logo por criticar a posição russa sobre a Síria. A FN serviu esses interesses, aliando-se ao Governo russo para a abertura, no Verão de 2012, de uma televisão, chamada ProRussia.tv, que transmite propaganda do Kremlin em francês, e com presença assídua de figuras da Frente Nacional.

Esta televisão encerrou em Abril, mas uma das figuras que estavam na liderança do projecto, Aymeric Chauprade, o conselheiro internacional de Marine Le Pen, manteve os contactos assíduos com Moscovo, além de ter sido eleito para o Parlamento Europeu. Na verdade, em Agosto, divulgou no seu blogue um manifesto para a política internacional da FN, em que identifica o islamismo sunita como o principal inimigo e a aliança com a Rússia como uma prioridade para a França.

Chauprade garante não ter estado envolvido nas negociações deste empréstimo. O homem que abriu as portas do banco russo à Frente Nacional é um outro deputado europeu, Jean-Luc Schaffhauser, ex-consultor da Dassault Aviação, que tem uma agenda recheada de contactos russos. Segundo a France 24, outro intermediário foi o deputado russo Alexander Mikhailovich Babakov – um dos visados pelas sanções impostas por Bruxelas a políticos russos, por causa da guerra não declarada na Ucrânia.

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