Acordo entre EUA e China lança nova fase na diplomacia climática

Depois de anos sob a aura de andarem de costas voltadas, Estados Unidos e China trocaram nesta quarta-feira um aperto de mão histórico na luta contra as alterações climáticas.

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“Este é um grande marco nas relações Estados Unidos-China", disse Obama Greg Baker/Reuters

Os presidentes Barack Obama e Xi Jinping assinaram, em Pequim, uma declaração conjunta na qual anunciam metas para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa, que estão a aquecer o planeta. Mas a iniciativa vale mais pelo que simboliza do que pelo conteúdo em si.

Os Estados Unidos dizem que “pretendem” reduzir as suas emissões em 26% a 28% até 2025, em relação aos níveis de 1990, fazendo “todos os esforços” para atingir a meta mais elevada.

Já a China afirma que “pretende” atingir o seu valor máximo de emissões “em torno de 2030” e aumentar para 20%, até essa data, o peso da energia que não venha da queima de combustíveis fósseis – ou seja, renováveis e nuclear.

“Este é um grande marco nas relações Estados Unidos-China e mostra o que é possível quando trabalhamos juntos num desafio global urgente”, disse o Presidente Obama, numa conferência de imprensa à margem de um encontro bilateral com o seu homólogo chinês, após à cimeira do Fórum para a Cooperação Económica da Ásia-Pacifico, em Pequim.

Os dois países somam cerca de 44% das emissões globais de CO2 – o principal vilão do aquecimento global. “Temos uma responsabilidade especial em liderar os esforços globais contra as alterações climáticas. Estou orgulhoso que possamos anunciar um acordo histórico”, acrescentou Obama.

"O chão e não o tecto"
As promessas em si não são suficientes perante aquilo que é necessário para travar o termómetro global. Há pouco menos de duas semanas, o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) divulgou um relatório no qual diz que é preciso reduzir as emissões de CO2 em 40% a 70% até 2050 e a zero em 2100, de modo a evitar que a temperatura média global suba a níveis que seriam catastróficos para a humanidade – ou seja, 2oC acima dos valores pré-industriais.

O mundo está, no entanto, longe disso. Segundo a mais recente avaliação da Agência Internacional de Energia, divulgada nesta quarta-feira, se não houver novas políticas climáticas e energéticas, as emissões da queima de combustíveis fósseis poderão aumentar em cerca 20% até 2040. Com isso, a temperatura subirá 3,6 oC até ao final do século.

“O anúncio de hoje [dos EUA e da China] deve ser apenas o chão e não o tecto das acções a tomar”, defende a organização ambientalista Greenpeace, num comunicado.

O acordo foi, no entanto, saudado com entusiasmo, por aquilo que significa na arena internacional. Juntos, os Estados Unidos e a China podem ajudar a desbloquear as negociações para um novo tratado climático, que deverá ser adoptado pela ONU no final de 2015, numa conferência em Paris, para entrar em vigor em 2020.

Ban Ki-moon, o secretário-geral da ONU, disse que o acordo representa “uma importante contribuição” para ser alcançado um resultado positivo em Paris. “Apelo a todos os países, em especial às grandes economias, para que sigam a via da China e dos Estados Unidos”, afirmou nesta quarta-feira.

O presidente do IPCC, Rajendra Pachauri, falou de “um desenvolvimento encorajador” e a Agência Internacional da Energia classificou a iniciativa como “um passo de gigante para a humanidade”.

“Estes dois importantes países anunciaram hoje um caminho crucial para um futuro melhor e mais seguro para a humanidade”, afirmou também a secretária executiva da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas, Christiana Figueres.

Um novo caminho
Estados Unidos e China estão de facto a trilhar um novo caminho, mas não tanto no que anunciam. As metas norte-americanas coincidem genericamente com o que Obama espera do seu plano para conter as emissões das centrais térmicas para a produção de electricidade, anunciado em Junho. E a China já tem em marcha estratégias para aumentar a contribuição das energias renováveis e do nuclear, embora nunca até agora tenha admitido uma data para começar a reduzir as suas emissões de CO2.

O que é de facto novo é os dois países surgirem de mãos dadas no tema do clima, um sinal forte de que está a cair o muro que separava os países ditos desenvolvidos e as nações em desenvolvimento nas negociações climáticas. Historicamente, Estados Unidos e China colocavam-se em campos opostos. Washington não queria um novo acordo climático no qual as grandes economias emergentes não assumissem compromissos quanto às suas emissões de gases com efeito de estufa. E Pequim insistia em colocar-se na posição de país em desenvolvimento, apontando o dedo à responsabilidade histórica das nações ricas e torcendo o nariz à imposição de metas.

Agora surgem juntos a anunciar potenciais compromissos, com a deliberada intenção de “criar momento” para um bom resultado em Paris e de liderar o processo – um desejo já manifestado publicamente por Obama.

A União Europeia, que no mês passado se comprometeu unilateralmente a reduzir em 40% as suas emissões até 2040 e que também quer ser líder no processo, reagiu dizendo que o acordo “mostra que o apelo dos líderes da UE a 24 de Outubro para que os outros países avançassem rapidamente com as metas de redução das emissões de gases com efeito de estufa está a ser respondido”.

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