Novo sistema de alerta para empresas em risco vai arrancar a 1 de Janeiro

Plano com 11 medidas para travar falências e reduzir níveis de endividamento está em consulta pública até quarta-feira. Governo espera ter reforma no terreno no primeiro trimestre de 2015.

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Sistema de alerta pretende salvar empresas da falência em tempo útil Adriano Miranda
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Pedro Gonçalves, secretário de Estado da Inovação, Investimento e Competitividade Rui Gaudêncio

O Governo quer arrancar o próximo ano com um pacote de medidas que pretende travar a falência de empresas, reduzir a excessiva dependência da banca e mostrar novos caminhos para a recapitalização. A primeira a avançar, já a 1 de Janeiro, será o sistema de alerta de empresas em risco, que estimulará a reestruturação a tempo de evitar os efeitos negativos que um encerrar de portas tem na economia, desde a perda de postos de trabalho às dívidas que ficam por recuperar.

Este sistema, que funcionará com base na atribuição de ratings, vai ser gerido pela Sociedade Portuguesa de Garantia Mútua (SPGM), que presta garantias financeiras às pequenas e médias empresas (PME) para facilitar a obtenção de crédito. Com base em indicadores como o EBITDA (resultados antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) ou a estrutura da dívida, serão atribuídas notações, adiantou ao PÚBLICO o secretário de Estado da Inovação, Investimento e Competitividade. 

Quando o rating entrar em zona de risco, será disparado um alerta para as empresas, que não será tornado público. E, a partir desse momento, o objectivo é que partam voluntariamente para uma reestruturação. Apesar de não ter um cariz obrigatório, é expectável que as empresas em situação financeira difícil se sintam compelidas a encontrar uma solução, visto que a própria SPGM terá de agir em função da notação que atribuir. Além disso, este sistema vem juntar-se ao que já funciona no Banco de Portugal, forçando as instituições financeiras a tomar medidas quando se deparam com crédito em risco.

De acordo com o o secretário de Estado Pedro Gonçalves, esta medida será a primeira avançar de um pacote com onze pontos. Uma pequena parte já está no terreno, como a redução do limite para as deduções fiscais no financiamento bancário (prevista no Código do IRC) ou o aumento dos benefícios fiscais para os lucros reinvestidos na actividade das empresas (inscrito no novo Código Fiscal do Investimento). Mas há outras medidas que ainda estão em consulta pública, com o prazo de resposta a terminar na quarta-feira, 12 de Novembro. 

A intenção é que este último conjunto de reformas “entre em processo legislativo ainda este mês” e que chegue à fase de promulgação no início de 2015. O secretário de Estado acredita que verão a luz do dia “ao longo do primeiro trimestre” do próximo ano. Das 11, ficará apenas uma por implementar: a criação de sociedades de investimento imobiliário que permitirão às empresas retirar do balanço os encargos com esta componente. Mas o Governo espera que entre em vigor no primeiro semestre.

Diagnóstico precoce
Foi ainda em 2012 que os ministérios da Economia, das Finanças e da Segurança Social começaram, em conjunto com o Banco de Portugal, a desenhar este plano de acção, em linha com sucessivos alertas da troika para a situação limite em que se encontravam muitas empresas e para os reflexos negativos que o excessivo endividamento bancário e a inevitabilidade das falências tinha na economia. As 11 medidas ficaram fechadas em Junho, depois de o Governo ter submetido a estratégia a aprovação dos credores internacionais.

 No pacote de reformas em consulta pública até à próxima quarta-feira está a já há muito anunciada revisão dos dois mecanismos de reestruturação de negócios em dificuldades, criados pelo actual Governo em 2012: o Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (Sireve), em que a negociação com os credores é feita com a mediação do Iapmei, e o Processo Especial de Revitalização (PER), que corre nos tribunais. 

Pedro Gonçalves adiantou que o Sireve passará a ser “uma antecâmara para as empresas em dificuldades”, que serão sujeitas a um “diagnóstico financeiro mais aprofundado para se perceber se são operacionalmente viáveis”. Se for essa a conclusão da análise, tentarão o acordo dos credores para recuperarem ou seguirão a via judicial, através do PER. Mas, se não for esse o caso, “serão encaminhadas para a insolvência”, disse. 

Aliás, outra alteração importante impedirá que os negócios que tenham sido declarados insolventes no passado recorram ao Sireve. “Não se pretende tentar salvar zombies”, afirmou Pedro Gonçalves, admitindo que muitas das empresas que recorrem a estes mecanismos já estão num beco sem saída.

O diagnóstico financeiro, que passará a poder ser subcontratado a terceiros, é considerado “vital” para assegurar que as empresas não serão arrastadas para a falência e determinará o seu futuro, visto que terá sempre de ser completado com um plano de reestruturação e uma estratégia de viabilização. E todas as etapas de aprovação dos passos a dar vão ser agilizadas, já que a fasquia de credores hoje necessária será reduzida, adiantou o secretário de Estado, preferindo não especificar qual será o novo limite para o quórum.

Ainda no Sireve, a proposta do Governo prevê a possibilidade de as empresas recorrerem a uma bolsa de 600 mentores que darão apoio técnico na fase de recuperação. “São técnicos oficiais de contas ou reformados com experiência e habilitações disponíveis para ajudar, que fazem parte de uma rede do Iapmei a que se poderá aceder”, explicou.

Alternativas de financiamento
Outro ponto fulcral desta reforma é incentivar novas fontes de financiamento além da banca. O pacote de medidas contém alterações ao Código das Sociedades Comerciais e ao Código do IRC que vão estimular o recurso às obrigações convertíveis em capital e às acções preferenciais, estando prevista, neste último caso, uma clarificação do tratamento que será dado a nível fiscal quando forem transformadas em capital. Além disso, será facilitado o acesso das PME à emissão de obrigações (títulos de dívida), aliviando os requisitos que hoje a legislação impõe.

Haverá também uma nova linha de crédito, que não deverá ter um montante elevado, visto que se pretende que sirva para apoiar o fundo de maneio das empresas quando chegam à fase de recuperação. Mais uma vez, este instrumento destinar-se-á apenas a negócios financeiramente debilitados, mas viáveis, já que o Estado está impedido, por normas comunitárias, de auxiliar empresas falidas.

O papel do mediador do crédito, uma figura criada em 2009, será alargado, passando a acompanhar também o financiamento a empresas. E ficará fechado o novo regime do Fundo de Garantia Salarial, em discussão com os parceiros sociais e que passará a abranger, por exemplo, ex-trabalhadores de empresas insolventes que tenham passado por planos de recuperação. O objectivo, neste caso, é que diminuam os chumbos à viabilização de negócios, já que as regras em vigor incentivam os funcionários a recusar os planos para serem ressarcidos dos seus créditos.

De fora ficaram medidas lançadas pelo Ministério da Justiça, mas que ainda não foram concretizadas: a admissão de 60 novos administradores de insolvência e a criação de um sistema de nomeações destes profissionais que seja equitativo.

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