Justiça entre gerações

Fomentar uma economia fechada, amorfa, excessivamente dependente do Estado, é criar barreiras à entrada dos jovens, com novas ideias, novos conceitos e novas empresas. Isto prejudica todos, mas especialmente os jovens

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Sara Sampaio

Os jovens em Portugal não têm uma vida fácil. São tendencialmente “outsiders”. Estudam em escolas cuja qualidade não controlam, procuram o primeiro emprego num mercado de trabalho desfavorável, procuram a primeira casa em condições adversas. Pagam a segurança social sem saber que pensão virão a receber. Muitos começam a votar agora, em tempo de crise. A dívida pública acumulada durante décadas é-lhes alheia, mas o seu pagamento (ou não) condiciona, e muito, as suas vidas.

As decisões com efeitos relevantes a longo prazo têm um impacto importantíssimo na vida dos jovens, mas estes estão parcamente representados na tomada dessas decisões. Estando fora do sistema, sendo “outsiders”, vêem muitas vezes organizações de “insiders” agir como se defendessem os seus interesses. Mas as soluções que essas organizações apresentam, demasiadas vezes, defendem os interesses de quem já está, e não de quem quer entrar.

Onerar as contratações não ajuda a combater o desemprego — aumenta-o. Dificultar os despedimentos não reduz a precariedade — promove-a. Dificultar o desenvolvimento de um mercado de arrendamento pujante dificulta que os jovens encontrem casas, empurrando-os para o endividamento tendente à aquisição de “habitação própria”. As permanentes guerras entre sindicatos de professores e Ministério da Educação em nada ajudam os alunos a receber um ensino de qualidade. Discutir as pensões de quem já as recebe, sem discutir quem paga, e sem discutir a sustentabilidade do sistema, é, na prática, tomar partido contra os futuros pensionistas.

Fomentar uma economia fechada, amorfa, excessivamente dependente do Estado, é criar barreiras à entrada dos jovens, com novas ideias, novos conceitos e novas empresas. Isto prejudica todos, mas especialmente os jovens. E não é por acaso que, confrontados com todas as barreiras que existem em Portugal, muitos saiam, arriscando lá fora o que não puderam arriscar cá dentro. E eu desejo-lhes a maior das sortes. Se nós tivermos sorte, conseguirão no futuro voltar e, com novas formas de ver as coisas, contribuir para melhorar Portugal.

Todos os cidadãos têm um dever de intervenção cívica. Os jovens não são excepção. O descrédito do sistema político e dos políticos não pode servir de desculpa para ficar em casa. E a dificuldade do problema não pode servir de desculpa para nem sequer tentar. Cada jovem terá, naturalmente, ideias diferentes sobre o que fazer. Muitos discordarão até do teor deste artigo. Mas isso é o esperado numa democracia pluralista como a nossa pretende ser. O importante é procurar intervir, é procurar fazer ouvir a nossa voz. A renovação e a melhoria da classe política passam por os jovens assumirem as suas responsabilidades a este nível, não deixando que outros decidam e falem por nós.

A justiça entre gerações funda-se na distribuição equitativa dos gastos e dos ganhos entre diferentes gerações. Enquanto jovens, temos de defender os nossos interesses. Não podemos esperar que outros o façam por nós.

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