Muda mesmo

O Partido dos Trabalhadores reelege Dilma para a presidência porque o seu discurso é simples e ressoa verdadeiro: o Brasil mudou com o PT, e precisa de continuar a mudar no mesmo sentido. O lema da campanha dizia precisamente isso: “muda mais”.

Este cronista meteu-se numa boa alhada. Há quinze dias previ aqui que, com as eleições brasileiras, iria ficar tudo diferente na mesma. Que os comentadores se iriam entusiasmar com as possibilidades de reviravolta na segunda volta das eleições, “traçar perfis de Aécio Neves e fazer previsões de mudança e, no fim, Dilma Rousseff vai ganhar”.

E até à hora em que começo a escrever esta crónica não sei ainda se acertei ou se falhei redondamente a minha previsão.

A base do meu raciocínio estava nos resultados da primeira volta, por estados. À partida, Dilma e Aécio tinham ambos saído em primeiro lugar num número equivalente de estados brasileiros. Mas numa segunda volta não basta sair em primeiro lugar com uma maioria simples, como eram quase sempre as vitórias de Aécio. É preciso ter mais de cinquenta por cento, e isso Dilma conseguira em 11 estados, principalmente no Norte e no Nordeste. Aécio tivera apenas uma maioria absoluta, no estado de Santa Catarina, no Sul.

A decisão então estaria nas mãos dos estados do Sudeste — os mais populosos: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro — e do Centro-Oeste, como Goiás e o distrito federal de Brasília. Em teoria, uma vitória por grande diferença num estado como São Paulo — aliás esperada — Aécio poderia compensar as votações de Dilma na primeira volta. Mas com uma maioria absoluta em cerca de metade do país, e possibilidades de se sair bem em Minas Gerais e Rio de Janeiro, as possibilidade de Dilma eram melhores.

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E assim chegamos ao resultado: Dilma, segundo os primeiros números, ganha com 51% contra 49%. Era uma diferença destas que eu esperava. O cronista safou-se.

Aguentou firme a “maioria de minorias” que o Partido dos Trabalhadores laboriosamente construiu com Lula durante mais de vinte anos de oposição, e com já 12 anos de governo Lula e Dilma.

Em qualquer país, e mais ainda num país tão grande e complexo como o Brasil, uma maioria é sempre uma aliança de diferentes setores sociais, atitudes e opiniões políticas. Essa maioria tem de ser agregada pouco a pouco e mantida coesa com um discurso claro. O Partido dos Trabalhadores reelege Dilma para a presidência porque o seu discurso é simples e ressoa verdadeiro: o Brasil mudou com o PT, e precisa de continuar a mudar no mesmo sentido. O lema da campanha dizia precisamente isso: “muda mais”.

A aliança em torno de Aécio era menos clara. Era feita da oposição entre São Paulo e o Nordeste, da rivalidade entre PSDB e PT, da justaposição de algumas classes altas reacionárias (contra as mudanças de Lula) com algumas classes médias progressistas (pela melhoria dos serviços públicos e contra a corrupção), juntava os apelos à nova política de Marina Silva com o puro ódio do “antipetismo”. Conseguir um discurso unificador que congregasse toda esta gente só se conseguia pelo lado do contra. E o contra não foi suficiente.

Dito isto, o Brasil teve dois bons presidentes recentes. Fernando Henrique Cardoso estabilizou a economia, Lula tirou milhões da miséria. Eles mudaram o Brasil. Se Dilma quiser ser mais que uma boa administradora, precisa de fazer uma coisa: enfrentar, de uma vez por todas, a corrupção. Para isso não basta mudar o Brasil: é preciso mudar o PT. Quanto a Aécio, terá a sua nova oportunidade daqui a quatro anos, e outro grande problema brasileiro — a violência — precisando de ser enfrentado.

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