Tribunal inocenta Carmona Rodrigues do crime que o atirou para fora da Câmara de Lisboa

O Ministério Público, que pedia penas de prisão até cinco anos ou o pagamento de 4,25 milhões de euros no caso da permuta de terrenos do Parque Mayer e da Feira Popular com a Bragaparques, deverá recorrer da decisão

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Todos os arguidos do caso Bragaparques, incluindo Carmona Rodrigues, foram absolvidos Daniel Rocha

O Tribunal da Comarca de Lisboa inocentou esta manhã Carmona Rodrigues da prática do crime que o atirou para fora da presidência da Câmara de Lisboa em 2007, a meio do mandato para que tinha sido eleito, abrindo assim a porta à vitória do PS de António Costa. Ilibados foram também o então vice-presidente da autarquia, Fontão de Carvalho, e a vereadora do Urbanismo, Eduarda Napoleão, bem como os restantes arguidos. O Ministério Público deverá recorrer da decisão.

Na leitura de sentença, que decorreu esta segunda-feira, os juízes consideraram que não se provou que o município tenha sido prejudicado nos valores atingidos com a permuta e com a venda dos terrenos da antiga Feira Popular, em Entrecampos. O tribunal conclui também que ficou por provar a existência de um conluio entre os arguidos para beneficiar a Bragaparques. "Não se pode negar que fizeram algumas cedências" à empresa de Braga, admitem os juízes na sentença. Mas, afinal, os empresários "tinham o que o município queria [os terrenos do Parque Mayer] e podiam fazer-se valer disso".

Embora tenha admitido algumas falhas no processo da permuta dos terrenos - pode ler-se na sentença que a Câmara de Lisboa navegava na altura em águas "pouco competentes e pouco eficazes" -, para o colectivo de juízes só um acto de fé os poderia levar a condenar os arguidos, dado não haver provas de que tenham agido com o objectivo de beneficiar a Bragaparques. E mesmo quanto à violação das regras urbanísticas, que o Ministério Público dava como certa, o tribunal considerou discutível que tenha acontecido: "Existem inúmeros argumentos nos dois sentidos".

Todo o processo terá assim assentado num conjunto de "suspeições, impressões, convicções não sustentadas, boatos e rumores", que contribuíram para delinear "um frágil desenho da realidade".

À saída do tribunal, Carmona Rodrigues fez questão de dizer que não abandonou a câmara. Foi pressionado para sair dela em 2007 por Marques Mendes, então líder do PSD, depois de ter sido constituído arguido neste processo. "Houve um grupo de pessoas que fez cair a câmara", declarou o antigo presidente da câmara aos jornalistas à saída do tribunal, numa referência aos vereadores do PSD que se foram demitindo, uns a seguir aos outros, até deixar de haver condições legais de funcionamento. O PÚBLICO tentou obter também um comentário de Marques Mendes, mas este escusou-se a comentar a decisão dos juízes.

Feroz opositor da permuta Parque Mayer-Feira Popular, o vereador José Sá Fernandes diz nunca ter acreditado que na origem do negócio estivesse um conluio entre a equipa de vereadores liderada por Carmona Rodrigues e a Bragaparques. "O mais importante é que todo o negócio foi anulado pelos tribunais administrativos", realça, "e que neste momento tanto o Parque Mayer como os terrenos de Entrecampos são propriedade camarária". Como a empresa de Braga não ficou satisfeita com as quantias que lhe foram pagas pela autarquia, o problema será agora resolvido num tribunal arbitral.

Já o advogado de Eduarda Napoleão, Rui Patrício, realçou a importância de esta sentença reafirmar a separação de poderes: "À justiça o que é da justiça. À política e à gestão o que é da política e da gestão".

O caso Bragaparques remonta a 2005, quando a Assembleia Municipal de Lisboa aprovou por maioria a permuta dos terrenos do Parque Mayer — então detidos pela empresa Bragaparques — por parte dos terrenos municipais da antiga Feira Popular, em Entrecampos.

O negócio envolveu, ainda, a venda em hasta pública do lote restante da Feira Popular à Bragaparques, depois de a empresa ter exercido um direito de preferência, passando a deter a totalidade do espaço.

O caso tinha como principais arguidos o antigo presidente da Câmara de Lisboa, Carmona Rodrigues, e os ex-vereadores Fontão de Carvalho e Eduarda Napoleão. Todos respondiam por prevaricação de titular de cargo político pelo suposto favorecimento da Bragaparques em prejuízo do município.

Nas alegações finais do julgamento, o Ministério Público (MP) pediu a condenação de todos os envolvidos a penas até cinco anos de prisão, mas que podem ser suspensas na sua execução, por igual período, na condição de os arguidos pagarem à Câmara de Lisboa, ao todo, 4,25 milhões de euros.

Os advogados dos arguidos discordaram do MP, que pediu cinco anos de prisão para Carmona Rodrigues e Fontão de Carvalho e quatro anos de cadeia para Eduarda Napoleão e Remédio Pires, dos serviços jurídicos do município, por alegado favorecimento da Bragaparques no negócio. A defesa alegou, ainda, ter ficado provado em julgamento que os seus constituintes "não cometeram nenhum crime", antes defenderam o interesse público, acrescentando que este processo teve uma "génese política".

É a terceira vez que o caso Bragaparques está em julgamento. No primeiro, realizado em 2010, as antigas caras criminais consideraram "inútil" julgar Carmona Rodrigues e outros antigos responsáveis da autarquia, por entenderem que os factos da acusação não eram "matéria criminal", mas somente do foro administrativo, e que a decisão final "não coube aos arguidos", mas à Assembleia Municipal de Lisboa. Desta decisão recorreu o Ministério Público para o Tribunal da Relação da Lisboa que, em 2011, mandou repetir o julgamento.

Em Abril de 2013, teve de ser anulado um segundo julgamento que decorria há já vários meses, por não ter sido produzida prova durante mais de 30 dias, devido à baixa médica da juíza que presidia ao colectivo. com Lusa

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