Dhlakama pronto a negociar com “os irmãos do Governo” de Moçambique

Líder da Renamo continua a achar que a eleição "não foi livre nem justa". Mas declarou-se disponível a dialogar para "criar uma democracia".

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"Devemos negociar uma solução”, disse o chefe da antiga guerrilha GIANLUIGI GUERCIA/AFP

O líder da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana, antiga guerrilha), Afonso Dhlakama, mantém que as eleições de quarta-feira não foram livres, mas voltou a prometer não recorrer à violência e manifestou-se pronto a negociar com “os irmãos do Governo”.

“Esta eleição não foi livre nem justa, estamos a ver qual possa ser a solução”, disse, este sábado, à imprensa, em Maputo, citado pela AFP. Mas “a violência não é necessária”, afirmou o dirigente oposicionista, que, na sexta-feira, tinha garantido à Reuters que “não haverá mais guerra” em Moçambique.

Dhlakama manifestou-se disponível para “entrar em diálogo com o Governo para criar uma democracia” e recusou pronunciar-se directamente sobre a declaração do porta-voz do partido, António Muchanga, que na quinta-feira anunciou que a Renamo não aceita o resultado das eleições e reivindica a vitória. “Isto não pode ser tratado tecnicamente. Devemos negociar uma solução”, afirmou agora, segundo o relato do boletim eleitoral do Centro de Integridade Pública, uma organização não-governamental.

Numa altura em que são apenas conhecidos resultados parciais e projecções –  que apontam para um triunfo do partido governamental Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique) e do seu candidato presidencial, Filipe Nyusi – Dhlakama disse que é cedo para aceitar ou rejeitar resultados.

Chefe do principal partido da oposição, Afonso Dhlakama é um protagonista-chave do processo político e da estabilização da sociedade moçambicana. A Renamo conserva um número de indeterminado de homens armados, que durante cerca de ano e meio mantiveram uma guerra intermitente com o Governo, que ameaçou fazer o país regressar ao conflito generalizado que se prolongou de 1976 e 1992.

O jornal Canal de Moçambique, crítico do Executivo, escreveu na sua página no Facebook que Dhlakama esteve na tarde de sexta-feira reunido com os embaixadores da União Europeia. Nesse encontro foi, segundo fonte do jornal, “muito cauteloso e não apresentou um posicionamento concreto”. Terá perguntado aos representantes europeus se consideram normal que uma eleição africana "sempre acabe em mortes, principalmente de membros da oposição".

Mensagem para três públicos

Para Elisabete Azevedo-Harman, analista da Chatham House, instituto de estudos políticos internacionais, a mensagem de Dhlakama de que as eleições não foram justas mas não haverá guerra tem três “públicos” – os seus apoiantes, a Frelimo e a comunidade internacional. Aos membros da Renamo está a dizer: “Não vamos fazer nada, vamos esperar, estamos a negociar”. À comunidade internacional declara: “Não queremos guerra, queremos negociar”. Para a Frelimo, as palavras de Dhlakama devem ser entendidas como: “Não queremos guerra, mas têm de negociar connosco, se não podemos criar problemas”.

Em declarações ao PÚBLICO, a investigadora de assuntos africanos lembra que a leitura das afirmações de Dhlakama deve ter em conta que o acordo de paz de há mês e meio entre o Governo e a Renamo foi apenas o princípio de um processo que inclui, entre outras fases, a desmilitarização que deve ficar concluída em 2015. A sua intenção será “elevar as condições” para as negociações que vão prosseguir, considera.

A analista espera agora sinais de uma Frelimo que, tudo o indica, vencerá com uma clara maioria absoluta mas que – a confirmarem-se os dados preliminares – sofre uma erosão face aos 75% de há cinco anos. Relativamente à Renamo, pensa que “a maioria dos dirigentes não quer voltar a uma situação de conflito”.

Os resultados parciais e as projecções das eleições moçambicanas – presidenciais, legislativas e provinciais – apontam para um triunfo de Filipe Nyusi e da Frelimo com votações da ordem dos 60% contra cerca de 30% de Dhlakama e da Renamo.

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