PS aponta contradições entre depoimentos de Portas e Barroso e sentença alemã sobre os submarinos

Deputado José Magalhães considera que a sua denúncia, em pleno plenário, é suficiente para que a PGR investigue alegadas falsas declarações.

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Durante a discussão no plenário da Assembleia da República, em que foram apresentadas as conclusões da comissão de inquérito à compra de equipamentos militares, o deputado socialista José Magalhães considerou que os depoimentos prestados aos deputados por Paulo Portas e Durão Barroso são "indiciariamente inverdadeiros".

Magalhães aponta contradições entre o que o ex-primeiro-ministro e o actual vice-primeiro-ministro disseram na comissão e passagens do processo judicial que condenou, na Alemanha, por corrupção, o ex-cônsul honorário Jürgen Adolff. 

Por isso, o PS alerta a PGR, à qual chegarão as conclusões do inquérito por decisão da deputada do PSD Mónica Ferro – um gesto habitual quando os inquéritos parlamentares correm em paralelo com investigações judiciais –, quanto a indícios de “perjúrio”. Os depoentes nas comissões de inquérito têm a obrigação de responder como se de um tribunal se tratasse, sendo obrigados pela lei a responder de forma exacta às perguntas dos deputados.

Para o PS, que cita passagens da sentença do tribunal alemão que condenou Jürgen Adolff, Barroso e Portas contam uma versão diferente dos mesmos factos. A contradição é mais flagrante no caso de Durão Barroso do que no desencontro da versão de Portas com a de Adolff. Estas são as partes em causa:

O que não coincide com a versão de Paulo Portas
No dia 18 de Julho, respondendo a uma pergunta do deputado do PCP António Filipe, Portas negou ter mantido contactos regulares com Jürgen Adolff. Esta foi a sua resposta: “Senhor deputado, o que tenho a dizer-lhe sobre essa matéria é tão prosaico quanto isto: todos os anos há uma conferência de segurança em Munique — estamos de acordo, sabemos ambos que isto é verdade; todos os ministros da Defesa, e às vezes os ministros dos Negócios Estrangeiros, vão a essa conferência; esse senhor era cônsul honorário de Portugal em Munique (também é verdade); quando fui, pela primeira vez, à conferência de segurança em Munique, tinha, felizmente, um chefe de gabinete que me avisou de que o cônsul em causa era uma pessoa algo maçadora, que eu tinha de preparar o discurso para o dia seguinte e que, por isso, polidamente, não aceitasse ir jantar, e foi o que fiz. É só isto que tenho para lhe dizer.

Vi esse senhor no aeroporto e no carro a caminho do hotel, com o meu chefe de gabinete; não sei absolutamente mais nada. (…) O mundo está cheio de gente que pretende tirar rendimento comercial da pretensão de ter conhecimentos que não tem. É só isto o que posso dizer-lhe."

A sentença que condenou Adolff, citada pelo deputado socialista José Magalhães, dá como provada uma “conversa a quatro olhos, a sós”, um vieraugengespräch (em alemão), entre Portas e Adolff, precisamente nessa viagem, no dia 5 de Fevereiro de 2004, que o vice-primeiro-ministro assumiu ter feito com o cônsul. Na versão de Adolff, conversaram “sobre como continuar o processo e o problema da queixa francesa [os concorrentes franceses queixaram-se judicialmente de alterações ao concurso, visto que os alemães mudaram o modelo de submarino durante o processo de escolha, queixa que viria a ser considerada improcedente pelo Supremo Tribunal Administrativo].”

Duas semanas depois, continua a sentença alemã, um administrador da Ferrostaal “agradeceu ao cônsul ter conseguido uma reunião” com um militar que trabalhava com Paulo Portas, o coronel Serafino, cuja audição na comissão de inquérito foi rejeitada por PSD e CDS. 

As contradições entre a versão alemã e a de Durão Barroso
Nas suas respostas aos deputados, por escrito, o ex-primeiro-ministro Durão Barroso negou ter tido contactos com os responsáveis da Ferrostaal: “Nunca tive qualquer reunião com representantes dos consórcios concorrentes. E não tenho conhecimento de que qualquer membro do meu gabinete o possa ter feito. Mais concretamente, nunca dei quaisquer instruções a qualquer membro do meu gabinete para quaisquer contactos nesse âmbito.”

Todos os grupos parlamentares insistiram neste ponto, nos respectivos questionários. E as respostas de Barroso foram sempre categóricas: “Quando, a 5 de Julho de 2002, me desloquei à Baviera, onde tive encontros oficiais (…), o cônsul honorário promoveu um almoço com um grupo de empresários alemães. Ignoro o nome daqueles que, numerosos, me foram apresentados no início ou no final do dito almoço. O meu relacionamento com o senhor Jürgen Adolff foi, pois, meramente circunstancial e em momento algum ele me referiu o processo de aquisição dos submarinos.”

No entanto, o processo alemão apresenta factos que contradizem, expressamente, algumas das afirmações de Barroso. Refere, por exemplo, uma “conversa directa” entre o então chefe do Governo português e Hanfried Haun, administrador da Ferrostaal: “Como resultado dessa conversa, o primeiro-ministro Barroso solicitou expressamente ao dr. Mário David e ao dr. Adolff que acompanhassem a questão do German Submarine Consortium.”

A sentença identifica ainda outros contactos entre membros do gabinete de Barroso e os concorrentes alemães. No dia 3/10/2003 – reunião entre Mário David e os administradores da Ferrostaal Haun e Muehlenbeck – e mais tarde, em duas ocasiões, encontros entre aqueles gestores alemães e Carlos Tavares – ex-ministro da Economia – e, de novo, o assessor de Barroso, Mário David.

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