Banco Central Europeu: independência e responsabilidade

Na maioria das democracias modernas os Bancos Centrais são independentes dos governos.

Mais concretamente, a definição da política monetária é levada a cabo pelo Banco Central sem interferência dos governos e independente da política fiscal. É assim nos EUA, em Inglaterra ou no Japão. Mas em qualquer um destes países Banco Central e governo trabalham para um bem comum. Se um destes países tem um problema de liquidez espoletado, por exemplo, por um pânico de mercado, o Banco Central garantirá o acesso à necessária liquidez. O governador da Reserva Federal Norte Americana sabe a quem deve responder, e como, se tal situação se materializar. É aliás o que tem acontecido nos últimos anos.

É assim que deve ser. O governo é um órgão de soberania eleito, é responsável e responsabilizável perante os cidadãos. O governador do Banco Central não é eleito. Nos casos referidos, é nomeado pelo governo, seguindo um processo que garanta a sua independência, mas respondendo em última análise ao Estado, ainda que este possa ser representado por um governo diferente daquele que o nomeou.

No Banco Central Europeu, a regra da independência manteve-se seguindo muito de perto o que se passava com o Bundesbank alemão. O governador é nomeado pelos euro-membros e define política monetária independente das políticas fiscais e das vontades dos governos destes estados.

Mas perante quem responde o Banco Central Europeu (BCE)? A Espanha passou por um momento de constrangimento de liquidez, provocado por o que vulgarmente se chama de sudden stop (uma paragem repentina de cedência de liquidez pelos mercados) sem ter um problema real de solvência. Se a Espanha tivesse um Banco Central próprio, teria recorrido a este para acalmar os mercados e assegurar a liquidez necessária para fazer face ao dito constrangimento. Sem Banco Central a Espanha, tal como os outros estados-membros ficam dependentes das decisões do BCE.

E a qual dos 18 estados responde este BCE num caso de aperto? Havendo interesses e vontades contrárias entre os euro-membros não há uma voz, um governo perante quem o BCE seja responsável ou responsabilizável. Não há, como no caso dos EUA, Reino Unido ou Japão, um interesse necessariamente comum.

No caso do BCE, a definição da política monetária está nas mãos de um burocrata não eleito, como em todos os outros bancos centrais, mas que não responde directamente perante nenhum órgão legitimamente eleito pelos cidadãos. (E note-se que isto não é uma crítica ao actual Governador. Mário Draghi tem tomado decisões sensatas e em certas situações servido de contrapeso a posições menos razoáveis da Alemanha.)

A zona euro tem um conjunto significativo de problemas, a maioria dos quais intimamente relacionado com o seu desenho institucional. O caso do BCE e da sua ligação com os Governos dos euro-membros é exemplo gritante desta precária arquitectura.

A autora é docente da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa, no Porto

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