Porque não seguimos os bons exemplos?

Apesar das alterações legislativas observadas ao longo dos anos no âmbito das pensões de velhice, produzidas em contextos de evolução salarial favorável (em particular no período compreendido entre 2005 e 2011), o certo é que as reduções simultâneas da natalidade e do nível de emprego, conjugadas com o aumento acentuado da esperança média de vida, conduziram a desequilíbrios persistentes na componente de pensões do Sistema Previdencial (défice acumulado entre 2009 e 2012 de 1.400 milhões de euros).

Esta deterioração na situação financeira da componente de pensões de velhice do Sistema Previdencial gera preocupações acrescidas quando se analisa, em detalhe, cada um dos determinantes da sustentabilidade do sistema. 

Em primeiro lugar, constata-se que existe um universo de pensionistas relativamente “jovem”, na medida em que cerca de 74,7% de um total de quase 2 milhões de pensionistas de pensões de velhice têm idade inferior a 80 anos. 

Por outro lado, e no que respeita aos salários de referência para cálculo das contribuições e quotizações para a Segurança Social, verifica-se que, durante o período compreendido entre 2005 e 2013, os contribuintes com idade superior a 55 anos tiveram uma evolução mais favorável dos salários do que a observada para o conjunto de todos os contribuintes (crescimento de 3,02% ao ano), enquanto os contribuintes com idade inferior a 36 anos obtiveram ganhos ainda inferiores ao conjunto, situação esta que permite perspectivar uma progressiva deterioração na relação futura entre valores médios de pensões e contribuições.

Por seu turno, observou-se nos últimos anos uma acentuada redução no número de entidades empregadoras registadas e pessoas singulares contribuintes do sistema (-5,5% e -11,85%, respectivamente), sinal evidente da deterioração da dimensão e da dinâmica da estrutura produtiva portuguesa (ou do eventual aumento da “economia paralela”).

Por fim, observa-se um envelhecimento significativo da estrutura etária dos contribuintes da Segurança Social. Na realidade, se em 2005 cerca de 48,6% dos contribuintes tinham uma idade inferior a 36 anos (representando 42,3% das contribuições e quotizações), em 2013 esse número era de apenas 38,4% (representando 32,6% das contribuições e quotizações), fazendo elevar a idade média dos contribuintes durante esse período de 37,4 anos para 39,9 anos.

A conjugação dos dados anteriores com as estimativas do INE, de acordo com as quais em 2050 cerca de 31,95% da população terá 65 ou mais anos (face aos 17,85% observados em 2010), permite suportar a ideia de que se irá registar uma profunda e negativa alteração na relação entre contribuintes e pensionistas, bem como na distribuição etária dos mesmos.

Na realidade, se o número de contribuintes (pensionistas de pensões de velhice) se situava em Dezembro de 2012 em cerca de 3 milhões (1,9 milhões), a que corresponde um rácio de 1,6 contribuintes por pensionista, em 2050 o número de contribuintes (pensionistas de pensões de velhice) situar-se-á nos 2,4 milhões (3,5 milhões), traduzindo-se numa relação de 0,7 contribuintes por pensionista.

O impacto da alteração na relação entre número de contribuintes e pensionistas no valor das pensões de velhice poderá ser significativo. Com efeito, assumindo a manutenção no valor da Taxa Social Única (TSU) nos 34,75% e da sua repartição por risco (i.e. custo técnico das pensões de velhice de 19,73 pontos percentuais da TSU), constata-se que o valor médio da pensão de velhice de “equilíbrio” (i.e. pensão que permite em cada momento igualar as receitas e as despesas do Sistema Previdencial), tendo em consideração o actual valor médio do salário de referência para cálculo das contribuições para a Segurança Social, teria de cair dos actuais 323,5€ para os 141,5€ em 2050 (a preços constantes).

Os dados e estimativas que se apresentam permitem afirmar, inequivocamente, que o sistema de pensões de velhice existente em Portugal não é sustentável. É certo também que, dificilmente, para os mesmos dados e estimativas, outros sistemas alternativos possam ser sustentáveis, mantendo, simultaneamente, níveis mínimos de protecção.

Contudo, a experiência mostra-nos que a sustentabilidade de um sistema de pensões, preservando níveis adequados de proteção, pode ser obtida, de forma mais ou menos eficaz, em função do modelo que se adopte.   

Com efeito, o actual sistema de pensões (i.e. Sistema de Beneficio Definido), ao tratar desadequadamente a relação entre contribuições efectuadas e benefícios obtidos, desincentiva fortemente a participação formal no mercado de trabalho, retirando milhares de potenciais “contribuintes” do sistema. Em alternativa, um sistema de contribuição definida com “capitalização nocional”, tal como o vigente na Suécia, ao tornar clara e transparente a relação entre contribuições e pensão, incentivaria o trabalhador a manter uma relação formal e permanente com o mercado de trabalho.

É certo que nesta, como noutras matérias, nem sempre “one size fits all”. Contudo, e com as devidas adaptações, não se compreende porque é que a Suécia, exemplo em inúmeras áreas, não pode inspirar, nesta matéria, os políticos e legisladores portugueses.

Professor da Universidade Lusíada e antigo vice-presidente do Instituto de Segurança Social

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