Vitória por KO após ida ao tapete

Round 1. Nos debates há questões técnicas que influenciam muito a performance dos candidatos – por exemplo, só o facto de Seguro ter falado no primeiro frente a frente a uma velocidade muito superior à de António Costa desequilibrou o debate a seu favor. Seguro disse mais coisas, com mais convicção e de forma mais fluída do que um sonolento Costa. É natural: a postura Calimero, na sua indignação empertigada, é sempre fotogénica. 

António Costa – ao contrário de Seguro, que tem o empenho típico dos marrões que sabem não ser muito inteligentes – surgiu mal preparado no debate da TVI. Ainda assim, o seu grande problema não foi de conteúdo, mas de estilo. Dir-se-ia que Costa confundiu Judite de Sousa com Carlos Andrade e o frente a frente com as suas demoradas intervenções na Quadratura do Círculo. Pareceu sempre enfadado, com a desvantagem de não poder tratar o moderador com rispidez e dirigir a conversa para onde lhe apetecia, como está habituado a fazer na SIC Notícias (Andrade, diga-se, é o jornalista mais maltratado da televisão portuguesa).

O problema da postura Calimero de Seguro, contudo, é ela ser bastante inútil em termos eleitorais. Seguro ganhou o debate porque chorou melhor e com mais convicção. O secretário-geral do PS gritou “António Costa foi mau!” durante meia hora, e é possível que boa parte da audiência tenha ficado convencida que Costa foi mesmo mau – só que não há um único português que no dia das eleições vá confiar o seu voto ao coitadinho. É isso que permite a Costa dar-se ao luxo de informar o país que não se sente obrigado a ser mais detalhado no seu programa político. Mesmo indo ao tapete, todos sabem que ele é o mais forte.

Round 2. O debate da SIC foi completamente diferente – António Costa não se esqueceu de tomar café e trouxe papéis para a mesa. Falou muito mais depressa e com muito maior convicção – e trucidou Seguro. Este não podia reeditar a choraminguice da noite anterior, como é óbvio, e por isso apareceu destrunfado. Costa provou que aprendeu com os erros do debate da TVI, encostando várias vezes Seguro às cordas com o achado que foram as “seis propostas e meia" novas das 80 medidas do Contrato de Confiança, e atirando-se à sua jugular após a enorme argolada da “janela do município”. Bastou ver o ar destroçado de Seguro no final do debate, sem sequer conseguir valorizar as propostas de uma nova lei de incompatibilidades (importantíssima) ou de uma nova lei eleitoral.

Fazendo a vontade aos comentadores, os candidatos à liderança do PS lá resolveram falar “do país”. Só que quando eles falam do país têm muito pouco para dizer. Pior: quanto mais disserem hoje mais probabilidades terão de mentir amanhã. Costa falou duas vezes na necessidade de um “programa de fisioterapia” para Portugal, algo que só deve significar alguma coisa junto às sedes do Holmes Place. Seguro, após declarar que “vivemos um momento muito histórico” (sic), anunciou um plano de reindustrialização (uma ideia “completamente nova”, disse ele, sem se rir) e prometeu ao país uma nova paixão: a era do digital. Tudo isto significa coisa nenhuma – e, nesse sentido, a postura de António Costa, embora pareça um pouco bizarra no seu minimalismo programático, é mais prudente. Já que os políticos tardam em arranjar coragem para nos dizer a verdade, ao menos que tenham algum pudor em nos mentir descaradamente. Depois da noite de ontem, Costa tem a vitória das primárias no bolso. E ainda bem: no actual estado do PS, não há melhor.

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