“Metade do país” não teve oportunidade de salvar professores de horários-zero

Associação denuncia que nem todos os directores foram chamados a retirar do concurso de colocação os professores sem componente lectiva a quem, entretanto, se tornou possível atribuir turmas.Fenprof diz que o ministério assegurou que, se forem transferidos para outras escolas, os professores lesados regressarão de imediato à de origem depois da colocação, marcada para o "início da próxima semana".

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Anos sucessivos sem colocação levam muitos professores a dar aulas no estrangeiro JOãO GUILHERME

O presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), Filinto Lima, acusou na tarde desta sexta-feira o Ministério da Educação Ciência de "não garantir a igualdade de oportunidade aos professores com horário-zero de serem retirados do concurso para a mobilidade interna","por não ter avisado todos directores da possibilidade de o fazer". Este dirigente reclama que a situação seja resolvida antes da colocação dos docentes, mas a Fenprof diz que o MEC se comprometeu a solucioná-la apenas depois disso, o que pode fazer com que algumas turmas comecem as aulas sem professores.

Em causa estão professores do quadro que foram obrigados a concorrer para outros estabelecimentos de ensino por não terem actividade lectiva nas respectivas escolas. Ainda em Agosto, com o aparecimento de mais alunos ou a aprovação de novas turmas, são sempre feitos ajustamentos. Normalmente, frisou Filinto Lima, nesse mês o MEC avisa que vai abrir por um determinado período a plataforma electrónica do concurso, para que os directores possam retirar os nomes daqueles para os quais conseguiram, entretanto, turmas.

 Com o atraso na publicação do resultado do concurso para a mobilidade interna (que se destina, precisamente, a docentes do quadro) os dirigentes escolares não estranharam que aquele processo "tardasse, também", explica o presidente da ANDAEP. Ele acabou por ser espoletado de surpresa, na noite de quinta-feiram através de sms e de e-mails (no Norte do país) e de telefonemas (na região Centro) com origem nas respectivas representações regionais da Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares (DGESTE).

Na noite de quinta-feira, Filinto Lima e outros directores insurgiram-se com a forma como o processo foi conduzido. Mas, esta sexta-feira, aperceberam-se de que “havia pior”, diz o dirigente da ANDAEP: “Nem todos os directores foram contactados e muitos terão nas suas escolas professores que podem ser retirados do concurso”, disse, frisando que colegas que contactou ou por quem foi contactado das regiões de Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve não foram notificados, nem pessoalmente nem através dos meios institucionais. O mesmo apurou a Fenprof, que nesta sexta-feira reuniu com os representantes da Direcção-Geral da Administração Escolar (DGAE), para apelar a que o prazo para tirar os professores do concurso fosse prolongado até "pelo menos" ao fim do dia.

"Estamos a falar da vida de pessoas que correm o risco de mudar de escola, de ficar sem actividades lectivas e de acabarem na mobilidade especial ou, mais propriamente, em processos de requalificação. Não é uma brincadeira  e  este não é um procedimento que se possa aplicar em apenas metade do país”, frisou Filinto Lima.

Também em declarações ao PÚBLICO, Vítor Godinho, da direcção da Federação Nacional de Professores (Fenprof), disse ter alegado precisamente o mesmo, na reunião com os representantes da DGAE. "Disseram-nos que era impossível parar o processo de colocações, que já está a decorrer. Garantiram, no entanto, que, se algum professor for afastado compulsivamente da sua escola apesar de nela ter horário, lhe será dada a possibilidade de imediatamente regressar ao estabelecimento de origem". Uma solução que, diz Vítor Godinho, "resolve o problema do professor, individualmente, mas contribui para aumentar o caos das colocações". "Vamos ter uma escola em que o professor colocado afinal não o foi; e várias turmas de alunos que não terão aulas a essa disciplina enquanto não houver segunda fase de colocações", referiu.

Não há exclusão por regiões, garante MEC

Em resposta a questões colocadas pelo PÚBLICO, o gabinete de imprensa do MEC manteve, ao fim da tarde, que não se confirma exclusão por regiões: "De acordo com a DGAE, as direções de serviço da DGESTE estão a finalizar a validação das alterações solicitadas pelos diretores das escolas dessas três zonas". Segundo Godinho, os responsáveis da DGAE explicaram aos representantes da Fenprof que "contactaram esssencialmente os directores que, por sua própria iniciativa, tinham referido ter horários para os professores que inicialmente haviam declarado estar sem componente lectiva". O PÚBLICO falou com a directora de uma escola da região do Centro do país que tinha alertado a DGESTE para essa situação e não foi contactada; e falou com inúmeros directores do Centro e do Norte do país que foram contactados na noite de quinta-feira e não tinham, nas respectivas escolas, professores naquelas circunstâncias.


Filinto Lima diz que "seria absurdo "esperar que este ano os directores se dirigissem à DGESTE a dizer que queriam "repescar" docentes. "Pode ter acontecido, mas nunca podiam tomar isso como regra, não poderiam mudar o sistema sem aviso", considerou. Segundo diz, "sempre foram institucionalmente contactados todos os directores de todas as escolas para num determinado dia irem à plataforma retirar os professores do concurso, se fosse caso disso".

Numa outra nota, em resposta a questões colocadas pelo PÚBLICO, o MEC não alude às horas a que os dirigentes escolares foram contactados (alguns depois das 23h00) ou ao prazo concedido para o procedimento (duas horas ou menos de uma hora, nalguns casos, mas sempre antes das 00h00 de sexta). E também não adianta nada do que viria a ser transmitido aos representantes da Fenprof. 

“Devido ao elevado número de pedidos efectuados pelas escolas junto da DGAE para procederem a uma actualização das ofertas de horários, considerou a DGAE oportuno abrir um período temporal para esse efeito” informa, nessa nota, o MEC, que acrescenta que, “simultaneamente, as escolas puderam indicar os professores dos quadros sem componente lectiva, mas que, pelos mais diversos motivos, têm agora um horário”. “Nesse sentido”, adianta, “foi solicitado à DGESTE que articulasse junto das escolas os procedimentos necessários para a sua concretização, nomeadamente a validação de horários e a indicação dos docentes que têm agora um horário. Este período temporal durou até às 11h de hoje”, conclui.

Na mesma mensagem escrita, o MEC explica que aquele “procedimento teve em vista possibilitar a atribuição de componente lectiva a mais docentes de carreira, mantendo-os nas escolas de colocação, garantindo-se uma melhor gestão dos recursos humanos existentes nas escolas”. “Uma intenção louvável, mas desde que abranja todos os professores na mesma situação”, comentou Filinto Lima.

Em 2013, após o concurso para a mobilidade interna, continuaram nas escolas, sem turmas atribuídas, 2185 docentes do quadro (mais 313 do que no ano anterior). Este ano não são ainda conhecidos os dados. No fim desta tarde de sexta-feira o MEC anunciou que as listas dos concursos serão divulgadas "no início da próxima semana", "o que permitirá" a colocação de professores "antes do período previsto para o arranque das actividades lectivas", entre 11 e 15 de Setembro. 
 


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