Jovens detidos no meet do Vasco da Gama condenados a prisão com pena suspensa

Ambos os rapazes obrigados a fazer trabalho a favor da comunidade numa instituição de solidariedade social. Advogada vai recorrer.

Os dois jovens acusados pelo Ministério Público (MP) na sequência de desacatos junto ao Centro Comercial Vasco da Gama, em Lisboa, foram nesta terça-feira condenados a penas de prisão efectiva, mas suspensas pelo período em que duram. O jovem de 20 anos foi condenado a um ano e um mês, e o outro, de 23 anos, a dois anos e quatro meses. Os dois ficam ainda obrigados a fazer trabalho a favor da comunidade em instituições de solidariedade social. A advogada considerou a decisão do tribunal "pesada".

Na sessão anterior deste julgamento sumário, o MP, apesar de reconhecer que os jovens estão inseridos socialmente e trabalham, pediu pena de prisão efectiva para um e suspensa para outro. Um estava acusado de injúria agravada e os dois de coacção e resistência a funcionário (no caso, à autoridade).

No caso do jovem de 20 anos, que também estava acusado de injúria agravada, a juíza decidiu alterar a qualificação jurídica dos factos provados, absolvendo-o do crime de coacção e resistência a funcionário e condenando-o antes pelo crime de ofensa à integridade física qualificada na forma tentada. O tribunal considerou que o facto de o jovem ter esbracejado ou esperneado no momento da detenção não é um comportamento que possa ser considerado como resistência e coacção a funcionário, mas que o arremesso de pedras a agentes, embora não atingindo nenhum, é uma ofensa à integridade física qualificada na forma tentada. Por este crime e ainda pela injúria agravada – insultos aos agentes –, o jovem foi condenado a uma pena única de prisão, suspensa, de um ano e um mês.

A juíza considerou que o jovem, “inconformado” por ter sido impedido de entrar no centro comercial devido à formação de uma barreira de segurança, chamou aos polícias “filhos da puta” e “cabrões”, entre outros insultos. A juíza sublinhou que o rapaz, com 19 anos à data dos factos, sabia que aquelas expressões eram susceptíveis de atingir “a honra e consideração” dos agentes e que são “generalizadamente reconhecidas como pejorativas”. Além disso, agarrou várias pedras e arremessou-as. Mesmo não tendo acertado, agiu com o propósito de atingir a integridade física dos agentes, disse a juíza. O tribunal considerou que o jovem actuou “de forma livre e consciente”, sabendo que aquelas condutas eram “proibidas e punidas”. O rapaz frequenta um curso vocacional de tratamento de metais, em Setúbal, e tem um part time nas férias, numa estufa.

Na primeira sessão, o jovem negou as injúrias e só admitiu ter atirado uma pedra, acto pelo qual está “arrependido”. Contou que também foi agredido pela polícia, com bastões e pontapés, e que chegou a perder a consciência.

O outro jovem, lavador de carros de 23 anos, foi condenado pelo crime de coacção e resistência à autoridade a dois anos e quatro meses de prisão, com pena suspensa. Segundo disse a juíza, a namorada do rapaz, grávida de cinco meses naquela altura, furou o cordão de segurança, junto das varandas, no piso térreo da Gare do Oriente, e trocou gestos e palavras com agentes. As circunstâncias em que caíram os óculos do polícia e os gestos e palavras trocados não ficaram totalmente apurados. No caso desta jovem estará, aliás, a decorrer um outro processo-crime autónomo.  

Segundo o tribunal, o jovem, ao ver ao longe a namorada naquela situação, também furou o cordão e dirigiu-se ao agente pelas costas, agarrando-o pelos braços e ombros. As pancadas que desferiu, quando outros agentes foram ajudar o colega, resultaram na fractura do dedo de um polícia, considerou ainda o tribunal. Também neste caso a juíza sublinhou que o jovem sabia que aquela conduta é “proibida por lei”.

Na primeira sessão, este jovem contou que um agente deitou a namorada dele ao chão e disse estar-se a “borrifar” para a filha dele, que “era preta”. O rapaz negou os socos e pontapés aos agentes e disse ainda que estes o agrediram na esquadra.

Exemplo
A juíza entendeu, de uma forma geral, que os depoimentos dos agentes foram “objectivos”, “isentos”, com “encadeamento lógico”, seguros e marcados pelo “rigor e minúcia”. Pelo contrário, algumas testemunhas de defesa dos jovens, até pela relação de parentesco, foram consideradas “menos seguras”, menos credíveis e reveladoras de “incongruências”.

O tribunal fez questão de sublinhar, por um lado, que é devido “respeito” aos agentes policiais, mas, por outro, garantiu ter tido em consideração que os jovens não têm antecedentes criminais, estão inseridos a nível social e escolar e que um deles vai ser pai em Dezembro. No caso do jovem mais novo, foi considerada a idade e aplicado um regime especial para jovens na definição da pena.

Os rapazes estão também sujeitos ao regime de prova, que poderá passar por apresentações periódicas em moldes a definir. O mais novo terá de cumprir 90 horas de trabalho a favor da comunidade e o mais velho 120, em instituições de solidariedade social. Neste sentido, a juíza frisou que os jovens devem cumprir “escrupulosamente” o plano que for estipulado pela Direcção-Geral de Reinserção Social. De acordo com a advogada que representou os jovens nesta sessão, Ana Cristina Chéu, os moldes exactos em que decorrerá o trabalho a favor da comunidade e o regime de prova ainda serão estipulados.

A advogada, que vai recorrer, considerou a decisão do tribunal “pesada”. Lembrou que o caso teve um grande eco na comunicação social, com “alarme acentuado”, e defendeu que, pelas características dos jovens, as penas poderiam ter sido menos severas. Para Ana Cristina Chéu, a pena de dois anos e quatro meses é “bastante gravosa”. “No meio de 600 jovens, alguém tinha de ser chamado à justiça”, disse, acreditando que estes rapazes podem ter sido, “talvez”, usados como “exemplo”.

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