Todos ao ataque contra Marina Silva na campanha eleitoral do Brasil

A repentina mudança de opinião da candidata da coligação Unidos pelo Brasil, que de um dia para o outro deixou cair o apoio à legalização do casamento gay, pode ser explorada pelos seus adversários.

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Marina Silva em campanha YASUYOSHI CHIBA/AFP

A cavalgada de Marina Silva nas sondagens relativas à votação presidencial no Brasil inaugurou uma nova etapa de “todos contra Marina” na campanha eleitoral, mas iriam os seus adversários políticos explorar as suas fragilidades e cerrar fogo sobre a sua candidatura no segundo debate televisivo, esta segunda-feira à noite?

A concorrente da coligação Unidos pelo Brasil – que provocou um pequeno terramoto político ao assumir a vaga que pertencia ao líder do Partido Socialista Brasileiro, Eduardo Campos, morto num desastre aéreo em campanha –, abriu o flanco às críticas, depois de ter renegado o seu apoio às iniciativas legislativas com vista à legalização do casamento gay, uma promessa que estava inscrita no seu programa de governo.

A reviravolta de Marina, que ocorreu menos de 24 horas depois da apresentação oficial da plataforma eleitoral da coligação, tornou-se o caso político mais relevante da campanha, por aparentemente confirmar a percepção do “fundamentalismo” religioso da candidata, que é missionária da Igreja Assembleia de Deus e se opõe à união de homossexuais.

Apesar de vincar o seu respeito pela laicidade do Estado, e garantir que as suas convicções pessoais não se reflectem na sua acção política, Marina Silva não conseguiu descartar a impressão de que a “correcção” do seu programa aconteceu por pressão da chamada bancada evangélica no Congresso – um poderoso lobby político em Brasília. “Bastaram quatro tweets do pastor Silas Malafaia para ela dar o dito pelo não dito” no seu apoio à luta pelo reconhecimento da igualdade de direitos, lamentou o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais, Carlos Fonseca.

Numa breve explicação sobre o ocorrido, a candidata notou que outras propostas do programa tinham sido também corrigidas, como por exemplo o apoio ao investimento na energia nuclear, e repetiu o seu “compromisso com o respeito às liberdades individuais e religiosas” e a defesa “dos interesses de todos, daquele que crê e daquele que não crê, independente de cor, orientação sexual ou religião”, frisou.

Mas o episódio abriu brechas mesmo dentro da campanha da coligação: o conhecido escritor Milton Hatoum, por exemplo, retirou o seu nome da lista de apoiantes de Marina, por classificar a marcha atrás como uma “falha moral” e de princípios éticos. “Não quero eleger um Presidente que seja refém de bancadas religiosas, tenho pavor disso”, explicou ao Estadão.

Os candidatos dos chamados partidos “nanicos” foram implacáveis ao pronunciar-se sobre a Marina Silva. “Durou pouco. Bastou um pastor ameaçar uma guerra santa e a campanha recuou”, lamentou Eduardo Jorge, dos Verdes. Luciana Genro, do PSOL, acusou Marina de “ceder à bancada da intolerância, como cedeu ao mercado, como acena aos usineiros e ao agronegócio”.

Porém, nem a Presidente Dilma Rousseff, que corre pela reeleição, nem o candidato do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Aécio Neves, exploraram a celeuma causada pela mudança de opinião de Marina Silva. A campanha do PT descreveu a sua adversária como uma “evangélica fervorosa” sem outras considerações, e um porta-voz do PSDB descreveu a sua errata como “uma agressão á nossa inteligência”. É possível que os dois se estivessem a guardar o ataque para o debate desta noite – mas também é provável que prefiram manter-se longe do tema, para não provocar a mesma reacção irada dos evangélicos.

Organizado pelo site Uol, o jornal Folha de São Paulo, a rádio Jovem Pan e o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), será o primeiro confronto directo entre Dilma Rousseff e Marina Silva, empatadas com 34% das intenções de voto de acordo com a última sondagem eleitoral realizada pelo instituto Datafolha. Com 15%, Aécio Neves está já a uma distância considerável e precisa de inverter a tendência para projectar o seu partido até à segunda volta.

No fim-de-semana, o candidato tucano mudou o tom das suas críticas (até então relativamente inócuas) a Marina, apontando por um lado as contradições, e por outro as generalidades, do seu programa político. “Entre o original e o genérico, essa nova versão adaptada das convicções da candidata Marina, acho que os brasileiros ficarão com o original”, atacou Aécio, acusando Marina de ter levantado as suas propostas económicas do manual tradicional do PSDB.

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