DCIAP sugere punição para dirigentes partidários responsáveis por fraudes eleitorais

Partidos ainda não ponderaram a recomendação

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Luís de Sousa Pedro Cunha/Arquivo

No parecer sobre o projecto de lei do PS enviado à Assembleia da República, uma das procuradoras do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) sugere que os dirigentes partidários sejam incluídos no conceito de agentes que podem ser punidos pela lei penal para permitir sancionar fraudes nas eleições internas dos partidos. A proposta chegou já em vésperas das férias parlamentares e ainda não foi ponderada seriamente pelos partidos. Há dúvidas, mas também não é rejeitada liminarmente.

A procuradora Inês Bonina sugeriu uma alteração no conceito de funcionário previsto no Código Penal (artigo 386º) que abrange os funcionários públicos, administrativos, os jurados, os peritos, sejam remunerados ou não. São também equiparados a funcionários os gestores, titulares dos órgãos de fiscalização e trabalhadores de empresas públicas e ainda as empresas concessionadas. O conceito estende-se aos funcionários e agentes da União Europeia. Nos projectos de lei do PSD e do PS de combate à corrupção é proposta uma alteração para passar a incluir o “funcionário estrangeiro”.

A procuradora do DCIAP, numa declaração cujas considerações também são subscritas pelos procuradores Jorge Rosário e Isabel Nascimento, sustentou que a alteração da lei também podia passar por incluir os dirigentes partidários. “Os partidos políticos são entidades que beneficiam de fundos públicos e que têm uma influência decisiva na concretização da democracia”, lê-se no parecer. “Tal permitiria, por exemplo, a punição penal de práticas internas dos partidos que deturpam o resultado de eleições internas e, em consequência, elegem para cargos políticos pessoa diversa daquela que resultaria do cumprimento das regras”, acrescenta o documento, que é datado de 12 de Julho. Os procuradores mostram assim preocupação com as eleições internas dos partidos. No caso das primárias do PS, os problemas com a regularização de quotas de militantes só começaram a ser noticiadas em meados deste mês. Apesar de o parecer ser posterior vem exemplificar as preocupações que os investigadores têm sobre o funcionamento interno dos partidos.

Como o parecer só chegou em vésperas das férias parlamentares e os trabalhos em torno destes diplomas só agora se estão a reiniciar, os partidos ainda não ponderaram a sugestão. Esta é a posição assumida pelo PS. O CDS também remete comentários para mais tarde. Já António Filipe, vice-presidente da bancada do PCP, numa primeira reacção, considera que a inclusão dos dirigentes partidários no conceito de funcionário “é forçado” porque os fundos públicos nem sempre estão garantidos. “Um partido que seja criado agora e que tenha um resultado irrisório não recebe apoio público. Com que fundamento os seus dirigentes são considerados ‘funcionários’ [à luz do Código Penal]?”, questiona o deputado, lembrando que os dirigentes partidários são abrangidos pela lei de titulares de cargos políticos para efeitos de entrega de declaração de rendimentos. Hugo Soares, do PSD, garante que a recomendação será analisada, mas não fecha a porta a uma solução. “Vamos ver com cuidado, é o apontar de um caminho interessante mas importa estudar do ponto de vista jurídico”, afirma o coordenador do grupo de trabalho de acompanhamento das políticas de combate à corrupção.  

Para Luís de Sousa, da Transparência, Integridade, Associação Cívica, a sugestão do DCIAP tem “alguns riscos que merecem ser discutidos”. Um deles é ser demasiado intrusiva. “Pode estar a esvaziar esses mecanismos da sociedade [de resolução dos seus problemas] e a retirar responsabilidade dos partidos de disciplinar os seus militantes”, afirmou ao PÚBLICO. A questão estará em cima da mesa, quando o trabalho parlamentar recomeçar.
 

   

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