Outra leitura sobre a credibilidade e a transparência do PS

Miguel Laranjeiro prestou um mau serviço ao PS e às causas da transparência e da credibilidade do meu partido de sempre, que, paradoxalmente, pretendeu enaltecer.

Não pode existir qualquer dúvida quanto à transparência do modo de funcionamento do Partido Socialista, o principal esteio do sistema partidário português.

E também não tenho dúvidas de que a transparência é o pilar base da credibilidade, sem a qual o PS jamais será visto como uma real alternativa de governo. A questão da credibilidade do PS, ou da falta dela, é precisamente uma, se não mesmo a principal causa que despoletou a crise que conduziu à actual disputa interna pela sua liderança.

A transparência e a credibilidade não se proclamam. A primeira pratica-se e a segunda conquista-se pela prática política.

Entendo por isso que Miguel Laranjeiro, o Secretário Nacional do PS para a Organização, prestou um mau serviço ao PS e às causas da transparência e da credibilidade do meu partido de sempre, que, paradoxalmente, pretendeu enaltecer no artigo que recentemente publicou no PÚBLICO.

Segundo ele, no PS, quanto a transparência, está tudo bem, e agora ainda melhor do que antes, graças às regras introduzidas por António José Seguro no funcionamento do partido. Mesmo quando surgem notícias como as que relatam factos gravíssimos, como os alegadamente ocorridos na Federação de Braga, onde um aparente "benfeitor" anónimo surgiu a pagar a quotização de um número indeterminado de militantes inactivos, que pode mesmo ascender a mais de dois milhares, não se sabe, alguns dos quais estariam mesmo acamados ou teriam até falecido, com um esforço financeiro considerável, e sem o consentimento ou sequer conhecimento dos beneficiados.

Este é um tema que nunca deveria ter entrado publicamente na campanha eleitoral interna do PS, e muito menos pela mão do membro da actual direcção nacional do partido, principal responsável pela sua organização interna.

A campanha das "Primárias", cuja incoerência em termos de pagamento de quotas, com as eleições para as Federações, me abstenho aqui de comentar, tem de ser um exemplo de democracia interna e de elevação do debate, em que os únicos temas em discussão deveriam ser as propostas para melhorar o funcionamento do PS, a participação dos socialistas na vida do seu partido e o futuro do país.

A ter sido notícia, o triste episódio de Braga, deveria tê-lo sido apenas através de um simples e objectivo comunicado de imprensa da direcção do PS, a anunciar que, após rápida averiguação dos factos, tinha sido identificado quem efectuou os pagamentos, por que motivos o fez, qual o seu montante e origem, assim como a confirmação ou desmentido de que tal montante havia sido efectivamente depositado na conta do PS. E, caso se confirmasse a suspeição de algum ilícito, o anúncio de que tinham sido accionados os procedimentos disciplinares e judicias aplicáveis.

É assim, e só assim, que um partido transparente funciona.

E é assim, e só assim, que um partido se credibiliza perante uma sociedade cada vez mais desconfiada sobre o funcionamento e o financiamento dos partidos.

Lamento por isso profundamente, e não posso, por isso, deixar de reagir, que o artigo de Miguel Laranjeiro, pretenda justificar como actos aparentemente normais, e sem necessidade de esclarecimento e eventual punição, acontecimentos graves que destroem a imagem do PS e que, a permanecerem ocultos, transformam o PS perante a opinião pública num partido opaco e com uma credibilidade cuja recuperação será ainda mais difícil no futuro.

Apelo por isso a Miguel Laranjeiro que volte urgentemente ao tema para esclarecer as dúvidas que persistem, e incomodam todos os socialistas preocupados com a transparência e a credibilidade do PS, e incomodam igualmente muitos portugueses, filiados, ou não, noutros partidos, não menos preocupados com o nosso sistema partidário que, pese embora as suas imperfeições é o melhor garante do funcionamento da democracia de que beneficiamos há quarenta anos, que tanto custou a conquistar, e que, nos tempos de chumbo que vivemos, é mais necessário do que nunca fortalecer.

Militante nº 7212 do PS e apoiante de António Costa

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