Prescrições, co-adopção e leis eleitorais no arranque do Parlamento

CDS espera encontrar oportunidade para propor taxas moderadoras na interrupção voluntária da gravidez. Comissão de inquérito ao BES deverá ser agendada logo nos primeiros plenários.

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Partidos vão começar a aquecer os motores para as próximas eleições legislativas Miguel Manso

Com as esperadas medidas de austeridade como pano de fundo, o arranque do próximo ano parlamentar será ainda marcado por outros temas que fogem ao campo do pós-troika. É o caso das prescrições processuais que o PS quer agendar para plenário já no início desta quarta sessão legislativa, em Setembro. A adopção por casais do mesmo sexo voltará aos debates parlamentares (pela mão do BE) assim como a questão da criminalização do enriquecimento ilícito que o PSD mantém na agenda.

Outras questões de actualidade como a aplicação do novo mapa judiciário levam a bancada comunista preparar uma proposta de alteração para debater o mais depressa possível enquanto no CDS há quem espere poder encontrar uma oportunidade para propor taxas moderadoras na interrupção voluntária da gravidez.

Depois de terem sido acelerados os calendários parlamentares para aprovar cortes de salários na Função Pública e o Orçamento rectificativo, a quarta sessão legislativa da XII legislatura arranca com a investigação parlamentar ao escândalo do Banco Espírito Santo.

Depois da sua aprovação em plenário (as sessões normais começam a 17 de Setembro), a proposta do PCP não terá que esperar muito para sair do papel, já que nessa altura a comissão de inquérito à compra de equipamentos militares deverá estar a terminar os seus trabalhos. Há um acordo informal entre a Presidente da Assembleia da República e os grupos parlamentares para funcionarem apenas duas comissões de inquérito em simultâneo (neste momento existem a do equipamento militar e a de Camarate).

À luz indirecta do caso BES, o PS quer avançar para plenário com o projecto contra as prescrições, que transpõe para o regime geral das contra-ordenações normas do código de processo penal. O projecto surgiu na sequência das notícias sobre as prescrições em processos do antigo presidente do BCP relacionados com a gestão do banco. Este campo parece, aliás, terreno fértil para o legislador.

“No início dos trabalhos haverá todas as razões para se prestar atenção ao regime de infracções dos regulados”, afirmou ao PÚBLICO José Magalhães, deputado do PS. Uma das questões é a de se saber se algumas práticas levadas a cabo por gestores nos bancos, que podem ter impacto de milhões de euros, deveriam ser consideradas crime na lei em vez de serem enquadrados em processos contra-ordenacionais como acontece actualmente.

Para José Magalhães, os deputados deviam aproveitar esta última sessão legislativa para fazer algumas reformas sobre o sistema. É o caso do regime das incompatibilidades de cargos políticos que o socialista gostava de ver mais apertado. Nesse sentido, José Magalhães pretende apresentar um projecto de lei para “melhorar e aumentar as incompatibilidades”, tendo em conta que tanto o secretário-geral do partido, António José Seguro, como o seu adversário nas primárias, António Costa, “têm chamado a atenção para a separação entre política e negócios”.

Outra das reformas em que o PS quer insistir é a das leis eleitorais e dar atenção em particular à cobertura mediática das campanhas. PS e PSD não chegaram a acordo na última sessão legislativa para evitar que a inexistência de debates televisivos e a fraca cobertura das televisões sobre as europeias, uma realidade que para José Magalhães contribuiu “para a elevada taxa de abstenção” das eleições de Maio.

Depois de ter marcado a anterior sessão legislativa como um tema que escapou ao domínio das medidas de austeridade, a adopção por casais do mesmo sexo voltará a estar na agenda. A deputada bloquista Cecília Meireles já anunciou que a bancada vai insistir, pela terceira vez, na proposta que tem sido chumbada, e já tem garantido o apoio de Isabel Moreira (eleita pelo PS).

A co-adopção, que permitia aos homossexuais ficarem com os filhos adoptivos ou biológicos da pessoa com quem estavam casados ou viviam em união de facto, acabou por ser também reprovada na anterior sessão, mas Isabel Moreira já disse não ter desistido de renovar a apresentação de um projecto, apesar de considerar que é uma questão distinta da co-adopção. Resta saber se a JSD insiste na proposta de referendo à adopção e co-adopção, que foi chumbada pelo Tribunal Constitucional.

Outra questão que voltará à agenda parlamentar pela mão do PSD é a criminalização do enriquecimento ilícito, uma proposta que não passou no Constitucional e que a vice-presidente do PSD, Teresa Leal Coelho, já prometeu ressuscitar nesta próxima sessão.

Na maioria parlamentar e na área da saúde ficou adiada a intenção de impor taxas moderadoras na interrupção voluntária da gravidez. “Espero que se encontre uma oportunidade para nesta sessão se avaliar a proposta”, afirmou ao PÚBLICO Teresa Caeiro, do CDS, salientando que a intenção do partido não é reabrir a questão do aborto, mas sim aplicar um princípio de justiça ética.

“Não se trata de discriminar negativamente. Não vejo motivo para que se discrimine positivamente esses casos”, argumentou, salientando que se pretende manter as isenções que já estão previstas na lei, à luz da condição de recursos.

Apesar de outros temas poderem ter alguma luz mediática serão as questões económicas e financeiras a dominar a agenda parlamentar até ao fim do ano. E que poderão ter implicações políticas nos dois partidos da coligação. É que o Orçamento do Estado para 2015 – que será apresentado a 15 de Outubro – é o primeiro do pós-troika e o último antes das próximas eleições legislativas. O que faz antever que os partidos aqueçam os motores para o próximo ciclo eleitoral.

Manifesto sobre sistema político
O manifesto “Por uma democracia de qualidade”, que defende uma reforma do sistema político, vai ser apresentado no próximo dia 27, em Lisboa.

Entre os subscritores estão o empresário e ex-deputado do PS Henrique Neto, o antigo ministro do PSD e actual banqueiro, Mira Amaral, Campos e Cunha, antigo ministro das Finanças do governo Sócrates, e José Ribeiro e Castro, deputado do CDS.

“Há 17 anos que a revisão constitucional tornou possível uma reforma e não se fez nada”, afirmou ao PÚBLICO o antigo líder dos centristas.

O manifesto surge em resultado de uma reflexão entre políticos e figuras independentes que apontam o funcionamento do sistema político e a concentração do poder nos partidos como a raiz dos problemas do país.

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